Histórias da Casa Branca: a América resistirá - TVI

Histórias da Casa Branca: a América resistirá

  • Germano Almeida
  • 30 jan 2017, 08:49
Donald Trump reativa a regra "Mexico City policy"

Donald Trump instiga a divisão, o ódio e o fechamento. A força dos EUA funda-se na sua diversidade. Quando o Presidente repele quem é diferente, está a enfraquecer a América, não a fazer dela “grande outra vez”

Os americanos são, na globalidade, um povo bom e generoso.

Têm na diversidade e numa fantástica capacidade de integrar as minorias um dos seus maiores trunfos -- e sabem disso.

Democratas e também republicanos fundam o seu discurso político nessa ideia poderosíssima.

Os sentimentos primários e vingativos do atual inquilino da Casa Branca (que em nada se enquadram, por exemplo, na tradição de Lincoln e Reagan, referências maiores do Partido Republicano que Trump tornou "barriga de aluguer" para chegar à Casa Branca) serão combatidos pela força e pujança da sociedade civil dos EUA.

Não tenho dúvidas sobre isso.

A partir de certo ponto, pelos políticos em Washington DC (que, de resto, foram insultados e difamados por Donald Trump em pleno discurso de posse, ao serem acusados de se terem apropriado indevidamente do dinheiro do povo nas últimas décadas) também.

Por agora, democratas e muitos republicanos mantêm-se em estado de choque sem saber como lidar com este bizarro e indigno Presidente. 63 milhões de americanos votaram a 8 de novembro passado em Donald Trump -- e isso é preocupante.

Mas desses 63 milhões, depois destes oito dias frenéticos e assustadores, uma parte não se revê nas posições do Presidente. Mais americanos (66 milhões) votaram na candidata Hillary Clinton.

E alguns milhões de mulheres no Midwest e negros na Carolina do Norte que não foram votar estarão, agora, profundamente arrependidos e com um sentimento de culpa pelo que está a acontecer. E, na verdade, têm razões para se sentir assim.

O Canadá, de forma inteligente, oferece-se para acolher os imigrantes que os EUA de Trump pontapeiam.

A China, sábia, posiciona-se economicamente nos países do TPP, tratado que os EUA de Trump rasgaram e mostra responsabilidade ao afirmar que pretende manter o Acordo Climático de Paris, que os EUA de Trump prometem ignorar.

O México, ressentido, acena a uma nova relação comercial com a China, para retaliar a vergonha do muro e minimizar a taxação dos produtos mexicanos que os EUA de Trump ameaçam.

Os primeiros dias de Donald Trump na Casa Branca mostraram um Presidente frenético, a expandir ao limite os seus poderes através de ações executivas unilaterais.

Sempre que Barack Obama assinava uma ordem executiva presidencial, os republicanos no Congresso acusavam-no de "tirânico" e "fast and furious".

Bons tempos.

Comparado com o que Donald Trump decidiu unilateralmente nos primeiros oito dias, era brincadeira. E agora, como vão reagir os membros do GOP em maioria nas duas câmaras do Capitólio?

"protecionismo" e a "agressividade defensiva" do novo Presidente vai, rapidamente, levar a um fechamento que tornará os EUA mais pequenos, não"grandes outra vez".

E talvez proporcione oportunidades inesperadas a vizinhos e rivais.  

A força dos EUA funda-se na diversidade. Quando Donald Trump repele quem é diferente, enfraquece a América, não faz dela “grande outra vez”.

Nos últimos dias assistimos a laivos de autoritarismo presidencial no país da Liberdade. O reforço de poderes dados por Trump a Steve Bannon, o seu ideólogo "alt-right" que além de conselheiro chefe tem agora também acesso direto ao Conselho de Segurança Nacional, é muito preocupante.

"No hate, no fear, Muslims are welcome here"

Há esperança?

Claro que há.

A juíza federal Ann Donnelly, do Eastern District de Nova Iorque, honrou os tão lembrados "checks and balances" e impediu a Administração Trump de aplicar a"immigration ban".

Foi seguida, nas horas sequentes, por dois outros juízes federais da Virgínia e por 16 procuradores-gerais, obrigando a Administração Trump a corrigir algumas das instruções dadas.

Esperemos que seja só o início de uma reação que tem que ser alargada, corajosa e abrangente dos vários poderes da sociedade americana.

No JFK, noutros aeroportos dos Estados Unidos e até à porta da Casa Branca houve enormes manifestações anti-Trump e contra a “Muslim Ban”, gritando "no hate, no fear, Muslims are welcome here" (sem ódio, sem medo, os muçulmanos são bem-vindos aqui).

Oficiais de Imigração dos EUA temem estar a violar leis internacionais, ao seguir a "Muslim Ban". Advogados trabalham "pro bono" nos aeroportos, para assegurar os direitos dos imigrantes impedidos de entrar (mesmo quem tem "green cards" e apenas quer voltar a casa).

Vários democratas e até alguns senadores republicanos (Jeff Flake, do Arizona; Susan Collins, do Maine;  no Congresso condenam a "Muslim Ban" e demarcam-se do Presidente.

É nestes momentos que se prova a dimensão e a força de um povo e de um país. E refiro-me sempre aos EUA, seja em que situação for, como "aquele grande país".

A Casa Branca de Trump, reporta a CNN, está a ponderar a exigência da consulta das redes sociais e dos telefones móveis de visitantes estrangeiros, numa extensão às medidas de reforço das fronteiras a lançar por estes dias.

O nosso país precisa de fronteiras fortes e medidas extremas”, tuitou Donald para se justificar.

A presidência Trump enche de vergonha a imagem dos EUA.

Mas, como bem disse Barack Obama na sua mensagem final, “será apenas uma vírgula”.

Parece-me claro que, em muito pouco tempo, a herança presidencial de Barack Obama será bem mais valorizada. As comparações têm essa vantagem.

A realidade política e social é dinâmica.

Nos EUA, então, ainda mais. A América é muito melhor que Donald Trump. Vai resistir e vai regressar.

Pode demorar. Mas vai.

Continue a ler esta notícia