Dois anos de Papa: «Gostava de sair escondido para comer uma pizza» - TVI

Dois anos de Papa: «Gostava de sair escondido para comer uma pizza»

No dia em que completa dois anos como líder máximo da Igreja Católica, Francisco volta a surpreender numa entrevista a uma televisão mexicana. E até conta uma anedota

No dia em que completa dois anos como líder máximo da Igreja Católica, o Papa Francisco continua a surpreender. Numa entrevista, divulgada esta sexta-feira por uma estação de televisão mexicana, fala do Conclave que o elegeu, de como foi surpreendido pela escolha e como se está a dar no topo da Cúria romana. Francisco declara ter «a sensação» que o pontificado pode ser breve, de quatro ou cinco anos, ou até de dois ou três, mas desmente sentir-se «só e sem apoio». O Sumo Pontífice revela que gostava de poder sair do Vaticano, incógnito, para ir comer uma pizza. E até conta uma anedota.
 

«O meu pontificado vai ser breve»

Numa longa entrevista à Televisa, divulgada na íntegra pela Rádio Vaticano, Jorge Bergoglio, 265º sucessor do apóstolo Pedro, diz acreditar que vai ser Papa por pouco tempo e que o papado pode concluir-se com a sua morte ou com uma demissão.

«Tenho a sensação que o meu pontificado vai ser breve. Quatro ou cinco anos. Não sei. Ou dois ou três. Dois já passaram. É uma sensação um pouco vaga que tenho, a de que o Senhor me escolheu para uma missão breve. Sobre isso, mantenho a possibilidade em aberto», afirma.

Bento XVI, que foi o primeiro Papa em sete séculos a resignar ao cargo, em fevereiro de 2013, «abriu a porta com muito mérito para os papas eméritos. Abriu uma porta institucional», sublinha Francisco.




Francisco, de 78 anos, não diz que pretende demitir-se um dia. Declarações anteriores neste sentido geraram várias críticas e fortes reações junto de alguns teólogos conservadores.

«Não me agrada muito», afirma, sobre a ideia de fixar um limite de idade, aos 80 anos, para a resignação de um Papa. O cargo de Papa «é uma graça especial», realça.


Decretar que o fim é aos 80 anos «iria criar uma sensação de fim, de um pontificado destinado a não se acabar bem», acrescenta Francisco, aparentemente para tranquilizar os mais conservadores.
 


«Não me desgosta ser Papa»


Na mesma entrevista, o Sumo Pontífice fala do Conclave que o elegeu e de como foi surpreendido pela escolha.

«Não me desgosta ser Papa», responde Francisco a uma pergunta direta. «Uma vez concretizada "a coisa" [a nomeação], faz-se».

Ainda assim, Francisco revela que tem saudades de aspetos da vida antes de ser eleito Papa.

«A única coisa que eu queria era sair um dia [do Vaticano], sem ser reconhecido, e ir a uma pizzaria comer uma pizza», confessa.





A entrevista do Papa está cheia de frases que poderão marcar os próximos dias do papado. Como quando Francisco diz que a sua «maior penitência são as viagens», porque a sua «neurose» é ser demasiado caseiro. Ou quando assume que «não teria aguentado» se vivesse nos aposentos do palácio apostólico reservados ao Papa.

Politicamente, a entrevista também pode ter efeito. O Papa assume que sofreu «consequências», por ter falado nos problemas do narcotráfico na Argentina, numa carta a um amigo, que acabou por ser divulgada nos media mundiais.



 

Mas Francisco não deixa de pôr mais lume na fogueira: «Tenho de dizer que, às vezes, sinto-me usado por políticos do país [Argentina]. Políticos que pediam audiências».

O Papa argentino não poupa o seu povo. «Nós argentinos, não somos humildes», diz aproveitando para contar uma anedota: «Sabe como se suicida um argentino? Sobe pelo seu ego e atira-se».

 

«Habemus papam!»


Há exatamente dois anos, o mundo ouviu atento o anúncio do nome de Jorge Mario Bergoglio, um cardeal jesuíta, como o novo Papa. No dia 13 de março de 2013, a Igreja Católica conheceu o novo Bispo de Roma, um argentino que conquistou o coração de multidões e escolheu o nome de Francisco.



 
Em contraste com a reserva do antecessor alemão, Bento XVI, o argentino Jorge Mario Bergoglio destacou-se pelos gestos espontâneos, sejam eles uma oração junto ao muro de separação entre Israel e os territórios palestinianos ou em encontros com doentes e deficientes.

Desse momento até agora, já se passaram dois anos. Os primeiros 365 dias revelaram a marca desse pontificado: simplicidade, humildade e uma exortação à «cultura do encontro», a uma «Igreja em saída», termos que o próprio Papa gosta de usar. O segundo ano só confirma as características de Francisco, um Papa aberto ao encontro com o povo e ao diálogo com todos.
 


Momentos marcantes


Em 24 meses de pontificado, o Papa Francisco visitou o Brasil, a Terra Santa, a Coreia do Sul, a Albânia, a Turquia, o Sri Lanka, as Filipinas e a cidade francesa de Estrasburgo, onde passou pelo Parlamento Europeu e o Conselho da Europa. O chefe da Igreja Católica realizou também sete viagens em Itália, incluindo uma passagem pela ilha de Lampedusa e uma homenagem no centenário no início da I Guerra Mundial.



 
Entre os principais documentos do atual pontificado estão a encíclica «Lumen Fidei» (A luz da Fé), que recolhe também reflexões de Bento XVI, e a exortação apostólica «Evangelii Gaudium» (A alegria do Evangelho). 

O Papa Francisco iniciou ainda um Sínodo sobre a Família, em duas sessões, com consultas alargadas às comunidades católicas: uma sessão extraordinária realizada em outubro de 2014, e outra ordinária, que vai decorrer neste ano de 2015 de 4 a 25 de outubro.



Retomada de relações Cuba-EUA. Em 2014 um acontecimento histórico: Cuba e os EUA decidiram retomar as relações diplomáticas. Em nota, a Santa Sé falou sobre a intervenção do Papa Francisco nesse processo, já que, nos meses anteriores ao anúncio da decisão, o Sumo Pontífice escreveu aos presidentes de ambos os países convidando-os a resolver questões humanitárias de comum interesse para iniciar uma nova fase de relações.




 

Solidariedade concreta.
No dia do seu aniversário, 17 de dezembro, o Papa ofereceu sacos-cama a 400 sem-abrigo de Roma. O gesto foi semelhante ao do ano anterior, quando Francisco quis passar o primeiro aniversário como Papa com quatro sem-abrigo, que foram convidados a tomar o pequeno-almoço com o Sumo Pontífice na Casa de Santa Marta, e com todos os funcionários que vivem na residência.



 

Solução urgente para o Médio Oriente. O drama dos povos sírio e iraquiano é uma das questões que estão no coração do Papa. Em encontro com membros da Comissão Mista Internacional para o diálogo teológico entre a Igreja Católica e as igrejas Ortodoxas Orientais, em janeiro, Francisco sublinhou que a guerra no Iraque e na Síria é uma tragédia que precisa de uma solução negociada urgente.



 

Tolerância zero para pedofilia na Igreja. «Não há lugar no ministério para aqueles que abusam de menores», escreveu o Papa numa carta sobre o Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores. No documento, Francisco pediu a colaboração de bispos e religiosos para combater essa «chaga».


 

Criação de novos cardeais. No segundo ano de pontificado, Francisco criou mais 20 cardeais para a Igreja, entre os quais o português D. Manuel Clemente, em Consistório no dia 14 de fevereiro deste ano. Como orientação para os novos cardeais, o Papa apontou o caminho da caridade com a capacidade de ver Jesus nos marginalizados.



 

Centenário da I Guerra Mundial. Em setembro de 2014, Francisco visitou o maior cemitério da Itália e rezou pelas vítimas das guerras. «A guerra é uma loucura, a guerra destrói; destrói até mesmo o que Deus criou de mais belo», afirmou o Papa.
 
Denúncia de abandono. «O abandono é a “doença” mais grave do idoso, bem como a maior injustiça que pode sofrer: aqueles que nos ajudaram a crescer não devem ser abandonados quando precisam da nossa ajuda, do nosso amor, da nossa ternura, disse o Papa a 5 de março deste ano, numa das habituais audiências no Vaticano.
 
Vítimas de abusos sexuais. Uma das missas do Papa na casa de Santa Marta em 2014 contou com a participação de um grupo de vítimas de abusos sexuais por parte de elementos do clero. Francisco pediu perdão às vítimas e disse que não há lugar na Igreja para membros do clero que pratiquem esses crimes.





Canonização simultânea de João XXIII e João Paulo II. Um acontecimento inédito em dois mil anos de história, repleto de significados e interpretações. Dois papas que deixaram marcas indeléveis e moldaram o que a Igreja Católica é hoje, mas que foram também personalidades muito distintas, representando sensibilidades opostas. Ao proclamá-los santos em simultâneo, a 27 de abril de 2014, Francisco enviou uma mensagem de unidade, essencial para as reformas que tem na agenda, numa iniciativa que não escapou a polémicas.



 

Beatificação de Paulo VI. No dia em que se encerrou a primeira etapa do Sínodo dos Bispos sobre a Família, o Papa celebrou missa com o rito da beatificação de Paulo VI. «Verdadeiramente Paulo VI soube “dar a Deus o que é de Deus”», disse Francisco, a 19 de outubro de 2014.
 
Missa por cristãos assassinados. «Ofereçamos esta missa pelos nossos 21 irmãos coptas degolados pelo único motivo de serem cristãos (…) rezemos por eles, para que o Senhor os acolha como mártires, pelas suas famílias, pelo meu irmão Tawardos, que tanto sofre», disse o Papa na missa de 17 de fevereiro deste ano, celebrada na capela da Casa Santa Marta, em memória dos cristãos coptas decapitados por jihadistas do Estado Islâmico.



 

Paternidade responsável. «Alguns acreditam que, desculpem a palavra, para sermos bons católicos devemos ser como coelhos. Não. Paternidade responsável». A declaração do Papa numa conferência de imprensa quando voltava das Filipinas para Roma, em janeiro deste ano, causou polémica. O Papa respondia a uma pergunta que ligava a contraceção ao mito de que os cristãos devem ter muitos filhos. Francisco chegou a ficar triste com as distorções da sua declaração na imprensa.
 
 
 
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