O repórter mexicano que não quer ser o nº 84 da lista negra - TVI

O repórter mexicano que não quer ser o nº 84 da lista negra

Dia dos mortos

Denúncia de ligações entre crime organizado e poder político na base de assassinatos encomendados

Um jornalista mexicano, da revista de investigação «Proceso», vive há mais de um mês em sobressalto permanente, depois de ter recebido ameaças de morte que se estenderam à sua família.

Jorge Carrasco, o visado, tem todas as razões para acreditar nos riscos que corre: a sua investigação em curso diz respeito à morte de outra jornalista da «Proceso», correspondente no estado de Veracruz.

Regina Martinez foi assassinada há um ano, quando investigava ligações entre funcionários do governo com o crime organizado. A jornalista, com 30 anos de profissão, foi encontrada morta por estrangulamento, em sua casa. O último artigo que escreveu apontava falhas na investigação das autoridades estatais ao assassinato de um ativista social, Rogelio Martínez, alguns dias antes. Com a morte de Regina, passou a nove o número de jornalistas vítimas de mortes violentas, só no estado de Veracruz, desde 2011.

O México é, segundo a organização Repórteres sem Fronteiras, o país mais perigoso para jornalistas em todo o continente americano, e o segundo em todo o mundo, apenas atrás do Paquistão.

Do ano 2000 a 2012, a violência sobre os profissionais da comunicação social cifra-se em 83 assassinatos e mais de vinte desaparecimentos, quase sempre em consequência de ações do narcotráfico que têm a conivência ativa, ou por omissão, de grande parte das autoridades estaduais.

Jorge Carrasco receia tornar-se o 84º, e por isso já mudou várias vezes e residência nas últimas semanas. Os receios aumentaram com o assalto a uma das casas onde se alojava, durante o qual nada foi roubado. Apesar da proteção das autoridades, o jornalista admite, em declarações ao diário «El Pais», que as ameaças estão a surtir o efeito pretendido: «É uma alteração radical da vida particular, e isto tem um lado mais nocivo:(...) tiraram-me a liberdade de expressão», reconhece, admitindo que nas condições atuais «só um suicida» poderia continuar a investigar a morte da sua colega.

A morte de Regina foi consequência de um prolongado braço-de-ferro mantido pela revista com o ex-governador de Veracruz, Fidel Herrera, cujas ligações ao narcotráfico foram expostas em diversos artigos. Tendo exigido a participação no processo, em nome da revista, Carrasco assumiu o seu espanto pela forma como os trabalhos foram conduzidos, com interrogatórios a vários jornalistas e apreensão de diversas notas, entre elas páginas recolhidas na residência de Regina que não foram apensas ao processo.

As conclusões do inquérito apontaram para um crime sem motivações políticas, praticado por dois delinquentes habituais, um dos quais já detido. Uma interpretação que Carrasco não subscreve: «Não ligaram nada ao nosso pedido para que se investigasse a partir da luta política que decorre em Veracruz», afirmou ao diário espanhol. Para a direção da revista, a vida política no Estado decorre da guerra entre os dois cartéis mais poderosos da região, o dos Zetas e o Jalisco Nova Geração.

As ameaças a Carrasco começaram a 14 de abril, quando a revista publicou uma reportagem onde o jornalista apontava inconsistências da investigação e indicava nomes que esta poderia proteger. Denunciando o caso às autoridades federais, a revista responsabilizou diretamente o atual governador, Javier Duarte, por qualquer agressão que tivesse Carrasco ou a sua família como alvos.
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