TIME, 90 anos: o filtro que levou o século XX aos americanos - TVI

TIME, 90 anos: o filtro que levou o século XX aos americanos

Barack Obama eleito personalidade do ano para a Time

Primeira edição da matriarca das «newsmagazine» foi publicada a 3 de março de 1923

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Chamaram-lhe machista. Reacionária. Propagandística. Racista. E ao longo da sua história há exemplos que sustentam qualquer uma das acusações. Mas não é possível fazer a história do jornalismo no século XX sem atribuir um lugar de destaque à TIME, a matriarca das «newsmagazine» que neste domingo comemora 90 anos. E sim, o título da revista vai assim mesmo, em maiúsculas, ou não fossem as quatro letras do cabeçalho uma das inalteráveis imagens de marca, ao longo das suas mais de 4600 edições.

Veja o filme com que a TIME celebrou 90 anos

A palavra da moda, empreendedorismo, casa bem com as origens da revista, fruto das ideias de dois colegas de Yale, Henry Luce e Britton Hadden, que tinham testado as capacidades de gestão no diário daquela universidade. Com 22 anos, definiram o projeto de uma revista semanal que resumisse a atualidade, de forma organizada e procuraram amigos influentes que a financiassem. Dois anos depois, a 3 de março de 1923, estava nas bancas a primeira edição da TIME, que esteve para chamar-se Facts até perto do lançamento

Os estudiosos de jornalismo definem Hadden como o espírito criativo, o editor talentoso que não se levava demasiado a sério e moldou a identidade da revista nos primeiros anos. Mas Hadden morreu cedo, em 1929, deixando a TIME nas mãos do cofundador. Com Luce, «Il Luce», como lhe chamavam alguns colaboradores, pelas costas, a revista pôs de lado a criatividade e o humor, tornando-se cada vez mais solene, influente e ambiciosa.

Filho de um missionário protestante, Luce nasceu numa missão da cidade chinesa de Tengchow. A origem explica uma das suas obsessões, a conversão política e religiosa da China, onde viveu até aos 15 anos. Outra ambição era transformar a TIME, e as revistas que fundou depois (LIFE, Fortune e Sports Illustrated) num instrumento de doutrina para fazer do século XX o «século americano». Luce via os EUA como missionários globais da democracia e do «american way», e as suas revistas iriam estar na primeira linha do combate ao comunismo, que via como grande inimigo.

Ao longo dos seus 90 anos, a revista foi sempre uma tradução do mundo para o olhar americano, cimentando um cânone político e cultural profundamente conservador. Foi com esse filtro que a TIME acompanhou os acontecimentos mais relevantes do século passado: a Grande Depressão, a II Guerra, a Guerra Fria, o Vietname, as mudanças sociais dos anos 60, a explosão tecnológica, o fim da política de blocos e o imenso etc. que definiu o mundo de 1923 para cá.

À fusão com a Warner, em 1989, e com a AOL, em 2000, correspondeu a entrada na era digital, e uma modernização nos conteúdos. O conservadorismo político continuou a suscitar críticas, mas a posição perante a sociedade distendeu-se, como o ilustram algumas capas «fracturantes», a exemplo da que pôs a actriz Ellen de Generes a trazer a homossexualidade para o «mainstream», em 1997. Mas o fim dos blocos, e a emergência de novos desafio ao estatuto dos EUA como grande superpotência fizeram com que a TIME perdesse espaço e referências.

O 90º aniversário encontra a revista em tempos complicados ¿ a exemplo do que acontece com a generalidade das revistas de informação que lhe replicaram a fórmula. A Newsweek, concorrente direta a partir de 1933, nunca conseguiu destronar a inspiração original e deixou de aparecer nas bancadas no fim de 2012, tornando-se exclusivamente digital. A TIME ainda estará longe desse passo, mas não foge às dificuldades: em janeiro deste ano despediu 500 dos seus 8 mil funcionários. A tiragem, que nos tempos áureos chegou aos 5 milhões, caiu para menos de 3,2 com a receita publicitária a acompanhar a queda. Sim, ainda chega a 20 milhões de leitores, semanalmente. Mas o mundo está a mudar depressa, por certo muito mais depressa do que Henry Luce quereria.
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