Um engenheiro de software da Google publicou, na última sexta-feira, um memorando, a nível interno, onde defende que não existe igualdade de género na empresa, porque as mulheres são biologicamente diferentes dos homens e, por isso, são menos vocacionadas para liderar. Na segunda-feira, o engenheiro foi despedido pela Alphabet, a dona do Google, e foi acusado de “perpetuar estereótipos de género”.
No documento de 10 páginas, James Damore argumenta que as diferenças entre as capacidades de homens e mulheres variam biologicamente “e isso explica o porquê de não vermos uma igual representação de homens e mulheres em tecnologia e liderança”.
Temos de parar de pensar que o desequilíbrio da representação de género é uma questão de sexismo”, escreveu o engenheiro, no documento divulgado pelo site Motherboard.
Para James Damore, as mulheres “geralmente preferem empregos nas áreas sociais e artísticas”, enquanto os “homens gostam mais de código”.
Perguntamo-nos porque não vemos mulheres em posições de liderança, mas nunca nos perguntamos porque vemos tantos homens. Estas funções normalmente exigem um horário de trabalho longo, preenchido e stressante, que podem não valer a pena se se quiser uma vida equilibrada e preenchida”, defendeu o engenheiro.
O autor argumenta que as mulheres preocupam-se mais com uma vida equilibrada e que os homens são mais preocupados com o estatuto profissional.
O engenheiro acusou o Google de discriminar os funcionários com uma visão política mais conservadora.
Documento não é o que o Google "defende, promove e encoraja"
Danielle Brown, responsável pelo departamento de Igualdade e Diversidade da empresa, respondeu ao memorando partilhado por James Damore, através de um e-mail que circulou pela equipa, e afirmou que o texto não corresponde ao que a empresa “defende, promove e encoraja”.
A diversidade e inclusão são uma parte fundamental dos nossos valores e da cultura que queremos promover. Somos inequívocos na nossa crença de que a diversidade e inclusão são essenciais para o nosso sucesso empresarial”, escreveu Danielle Brown, citada pelo Motherboard.
A responsável acusou James Damore de desrespeitar os princípios de igualdade presentes no Código de Conduta da empresa.
Parte da criação de um ambiente aberto e inclusivo implica criar um espaço onde as pessoas se sentem confortáveis em partilhar as suas ideias alternativas e as suas opiniões. Mas esse discurso deve acompanhar os princípios de igualdade que constam no nosso Código de Conduta, na nossa política e nas leis anti-discriminação”, afirmou a responsável.
O texto não agradou a alguns funcionários da Google, que fizeram questão de se demarcar publicamente do documento, através do Twitter.
I experienced this at Google, and was frustrated that they did nothing about rhetoric that was harming employees. https://t.co/EtO4ehnILL
— Kelly Ellis (@justkelly_ok) 5 de agosto de 2017
That garbage fire of a document is trash and you are wonderful coworkers who I am extremely lucky to work with.
— Andrew Bonventre (@andybons) 4 de agosto de 2017
And yet it isn't, and they're popping out of the woodwork in droves.
— Liz Fong-Jones (@lizthegrey) 4 de agosto de 2017
Contudo, há também quem esteja do lado de James Damore, como, por exemplo, Julian Assange, fundador do site de denúncias Wikileaks. Assange acusou o Google de censura e condenou a decisão da empresa de despedir o engenheiro, chegando mesmo a oferecer-lhe emprego.
1/ Censorship is for losers. @WikiLeaks is offering a job to fired Google engineer James Damore. https://t.co/tmrflE72p3
— Julian Assange 🔹 (@JulianAssange) 8 de agosto de 2017
Segundo a BBC, Sundar Pichai, presidente executivo da Google, assinou, na segunda-feira, um comunicado interno, onde declara que o documento de Damore ultrapassou os limites “com estereótipos que prejudicam o ambiente de trabalho e a empresa”.
Sugerir que um grupo de colegas tem características que o torna biologicamente menos apto para um trabalho é ofensivo e não é correto. É contrário aos nossos valores elementares e ao nosso código de conduta, em que se espera que um Googler (funcionário do Google) faça o máximo para criar uma cultura de trabalho livre de assédio, intimidação, preconceito e discriminação ilegal”, escreveu Sundar Pichai, no comunicado divulgado pelo site Techcruch.
James Damores confirmou à Reuters que foi despedido por “perpetuar estereótipos de género”. O engenheiro disse ainda que está a explorar “os mecanismos legais possíveis” para recorrer da decisão e que já apresentou uma acusação ao Conselho Nacional de Relações Laborais dos Estados Unidos.