Ministra da Saúde timorense elimina referência a preservativos em cartazes por oposição ao "sexo livre" - TVI

Ministra da Saúde timorense elimina referência a preservativos em cartazes por oposição ao "sexo livre"

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  • 30 nov 2020, 09:06
Preservativos

Odete Belo disse, num fórum com estudantes em Díli, que “os jovens têm que se deitar cedo e não andar para aí a ter sexo livremente”

A ministra da Saúde timorense ordenou retirar a recomendação de uso de preservativo em cartazes distribuídos pelo país para marcar o Dia Mundial de Luta contra a SIDA, por oposição “moral” ao que considera ser “sexo livre”.

Fontes do Ministério da Saúde confirmaram à Lusa que Odete Belo deu instruções para que fossem eliminadas dos cartazes as palavras “usa preservativo”, após ter feito essa recomendação em declarações públicas em Díli.

As mesmas fontes explicaram à Lusa que Odete Belo declarou num fórum com estudantes na capital timorense a sua oposição, que era “contra”, e que “as pessoas iam apagar dos cartazes o preservativo”.

Odete Belo, que a Lusa tentou contactar várias vezes sem sucesso, disse que “os jovens têm que se deitar cedo e não andar para aí a ter sexo livremente”.

Vídeos e fotos enviados à Lusa mostram pessoas a pintar com tinta preta as palavras “usa preservativo” em alguns cartazes.

A posição, que vai contra as recomendações gerais internacionais e contra as posições defendidas por organizações nacionais e internacionais que trabalham neste setor, ilustra a postura dos anteriores responsáveis da Comissão Nacional de Luta contra a SIDA, que adotaram uma postura ultra conservadora sobre o assunto.

Apesar de algumas melhorias nos últimos anos, as questões sexuais são ainda um assunto quase tabu em Timor-Leste, onde as tradições e a religião travam muitas das ações de prevenção, como saúde sexual ou até a distribuição de métodos de proteção, como preservativos.

A própria Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA (CNCS), liderada até recentemente por um pastor protestante, é acusada de políticas desadequadas, não promovendo o uso de preservativos por toda a população, visando apenas populações consideradas de risco ou doentes já seropositivos.

Quizomba "estraga o futuro dos jovens" que a praticam

 

Daniel Marçal, responsável da comissão, afirmou publicamente que a dança angolana quizomba, uma das mais populares no país asiático, "estraga o futuro dos jovens" que a praticam.

Uma deputada do CNRT, Bendita Moniz Magno, chegou no passado a afirmar que a rede social Facebook está a contribuir para o aumento da sida em Timor-Leste porque permite mais contactos entre os jovens.

Mais do que posturas conservadoras, críticos apontam o facto da CNCS ter deixado de fazer a recomendação do uso de preservativos, optando por medidas de promoção do "autocontrolo".

Esta postura é criticada por funcionários do setor da saúde e representantes de algumas organizações da sociedade civil que apontam para o aumento de doenças de transmissão sexual, incluindo hepatites, e para a falta de programas adequados de prevenção.

Questionado sobre a alteração da política, Daniel Marçal explicou que se trata de "uma mudança de método", que pretende "mudar mentalidades e hábitos" e não "estimular o pecado do sexo livre".

Posturas conservadoras levam a que muitos jovens não tenham sequer a mínima informação sobre saúde sexual e que muitas mulheres tenham de procurar de forma escondida acesso a métodos de contraceção.

A crescente mobilidade económica da população implica que o acesso a trabalhadores sexuais, tanto em Timor-Leste como no estrangeiro, fez aumentar os riscos de DST.

Jovens, muitas vezes, admitem não ter conhecimentos sobre reprodução – sabem que estão grávidas numa fase avançada da gravidez -, com o poder masculino dominante na sociedade a ‘obrigar’ muitas vezes a mulher a ter relações sem qualquer proteção.

Um estudo recente mostra que Timor-Leste está a ver nascer uma “epidemia” de doenças sexualmente transmissíveis, especialmente HIV e sífilis, mas há ainda “uma janela de oportunidade” para, com políticas adequadas, mitigar e controlar a sua progressão.

Os decisores e planeadores têm que garantir programas inovadores fortes, estratégicos para aumentar a prevenção, além do atual programa de testar e tratar”, refere-se no estudo ao qual a Lusa teve acesso.

 

Isto requer também políticas progressivas – como preservativos – para todos e não apenas para populações alvo", aponta-se.

Desenvolvido em colaboração entre o Ministério da Saúde timorense e a Organização Mundial de Saúde (OMS), o estudo baseia-se num inquérito e análise conduzida entre novembro de 2018 e março de 2019, com o maior número de locais de vigilância sentinela de sempre.

Os dados mostram um “forte aumento” na prevalência tanto de HIV como de sífilis, devido a um aumento no comportamento de risco das populações alvo analisadas.

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