Baltazar Garzón denuncia "condições humanitárias lamentáveis" da prisão de Assange - TVI

Baltazar Garzón denuncia "condições humanitárias lamentáveis" da prisão de Assange

  • HMC
  • 10 out 2019, 20:08
Baltazar Garzon em tribunal [Reuters]

Ex-juiz da Audiência Nacional espanhola e coordenador da defesa do fundador do Wikileaks revelou que Julian Assange só tem uma hora por dia para comunicar com outras pessoas

Baltazar Garzón, ex-juiz da Audiência Nacional espanhola e coordenador da defesa do fundador do Wikileaks, denunciou esta quinta-feira as "condições humanitárias lamentáveis" em que está detido em Londres Julian Assange, alvo de um processo de extradição para os Estados Unidos.

Falando aos jornalistas à margem da conferência internacional em Lisboa sobre "Ameaças ao Estado de Direito Democrático no século XXI", Baltazar Garzón revelou que Julian Assange " só tem uma hora por dia para comunicar" com outras pessoas.

O antigo magistrado da Audiência Nacional referiu que foi intentada uma ação judicial em Espanha depois de ter tido conhecimento de que a própria empresa de segurança da embaixada do Equador - onde Assange esteve exilado durante anos - utilizou os mecanismos de vigilância para espiar "não só os advogados de defesa e as visitas" do fundador do Wikileaks, mas também o próprio Assange, através de câmaras e microfones ocultos.

Baltazar Garzón adiantou que começa a ser demonstrado pela investigação em curso que houve uma "clara interferência" dos Estados Unidos nesses atos ilícitos, o que é, considera, "extremamente grave, porque afeta diretamente o direito de defesa de Assange e também o processo de extradição (para os EUA) pois contaminaria todas as provas utilizadas contra ele".

O ex-juiz da Audiência Nacional, que interveio na conferência para falar sobre os "Novos Desafios para a Jurisdição Universal", disse aos jornalistas que um dos principais perigos e ameaças da atualidade é a "politização da Justiça" e o "uso do Direito como arma política", observando que se deve "diferenciar estes dois âmbitos" e dar mais atenção aos "direitos das vítimas".

Além do narcotráfico, branqueamento de capitais e crimes contra a humanidade, Baltazar Garzón declarou estar muito preocupado com os crimes ambientais que nos dias de hoje "surgem cada vez mais associados e vinculados às atividades financeiras".

Neste e noutros domínios, entende que é importante refletir sobre a "resposta que a Justiça pode dar" no espaço público e também sobre as "falhas e limitações" evidenciadas pelo poder judicial.

Há desafios muito grandes no mundo atual e creio que é necessária uma alteração do paradigma da Justiça e pormo-nos do lado das vítimas", enfatizou Baltazar Garzón, para quem a justiça está "muito paralisada" e "anquilosada", não tendo a "vivacidade" que é necessária para enfrentar a mudança que "estamos a viver".

Relativamente a Portugal, o antigo juiz e advogado de Assange disse "não conhecer todos e cada um dos casos" mediáticos da criminalidade económico-financeira, mas ter a perceção de que o sistema judicial e alguns magistrados estão a fazer esforços para combater a corrupção, mas que esse objetivo não pode ser só do poder judicial e também do poder político, devendo ser também um compromisso de toda a sociedade.

A este propósito, considerou importante a "transparência e o controlo público" dos processos e que a sociedade desempenhe o seu papel no combate á corrupção e outros crimes graves.

Enquanto magistrado da Audiência Nacional, Baltazar Garzón participou no julgamento de alguns dos casos mais célebres em Espanha, relacionados com crimes contra a humanidade, terrorismo, terrorismo de Estado, tráfico de droga, corrupção e crime económico.

Entre outros casos, Baltazar Garzón, de 63 anos, ficou conhecido internacionalmente por emitir um mandado de prisão contra o ditador do Chile Augusto Pinochet (já falecido) pela morte e tortura de cidadãos espanhóis. Fundamentou a decisão no relatório da Comissão Chilena da Verdade (1990-1991).

A magistrada do Ministério Público Maria José Morgado, o desembargador Ricardo Cardoso (do coletivo que julgou o caso Melancia/fax de Macau) e o professor de Direito Penal Rui Pereira foram outros dos intervenientes nesta conferência organizada pela RSA Advogados, em parceria com a Universidade Autónoma de Lisboa.

Na sua intervenção, Maria José Morgado lembrou que foi afastada, em 2002, da direção do departamento da Polícia Judiciária que investiga a criminalidade económica e financeira porque tinha um programa de combate à corrupção que era do "desagrado" do poder político de então (Governo PSD/CDS/PP).

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