Henri Kichka nasceu em Bruxelas, em 1926, numa família judaica de origem polaca, depois de os pais terem fugido da Europa oriental para construir uma nova vida, longe da opressão.
É um facto que o belga nasceu na resistência, mas a história deste homem estava longe de ser pacífica, mesmo numa idade tão jovem.
Quando Hitler invadiu a Bélgica, no início dos anos quarenta, Henri e a família ficaram sem um lugar para se esconder, acabando deportados em 1942.
A mãe, as irmãs e a tia foram mandadas, logo, para Auschwitz, onde morreram nas câmaras de gás, assim que chegaram.
Henri e o pai foram enviados, primeiro, para outros campos de trabalho forçado, separados, e, em 1945, acabaram em Auschwitz, o campo de extermínio criado por Hitler na Polónia, durante a Segunda Guerra Mundial. Porém, até lá chegarem, viram a maior parte dos prisioneiros morrer pelo caminho.
Tendo em conta o retrato da tragédia humanitária, Henri acabou por ter aquilo a que se pode chamar sorte: foi um dos poucos sobreviventes a Auschwitz, complexo composto por vários campos de trabalho forçado, onde morreram mais de 1 milhão de pessoas.
Sessenta anos depois, portanto no início do milénio, Henri continuou a resistir, e enfrentou o stress pós-traumático para escrever um livro de memórias chamado "Une adolescence perdue dans la nuit des camps", em português "Uma adolescência perdida na noite dos campos". Queria, muito, que o seu testemunho ficasse como um relato inspirador para a posteridade.
E assim aconteceu. Infelizmente, no dia 25 de abril deste ano, o último sábado, anos 94 anos, já num lar de idosos, não resistiu ao último desafio que a vida lhe colocou: a infeção pelo novo coronavírus.
Em homenagem ao pai, Michel Kichka, o filho, escreveu um texto emotivo no Facebook, que termina assim: "Um coronavírus microscópico teve sucesso em algo que todo o exército nazi falhou. O meu pai sobreviveu à marcha da morte, mas hoje a sua marcha da vida terminou".
Em todo o mundo, a pandemia causada pela Covid-19 já afetou diretamente praticamente 3 milhões de pessoas, número total de casos dos quais resultaram, até agora, 207 mil mortes.