Derrame de petróleo pode deixar oito milhões de pessoas sem água no Mar Vermelho - TVI

Derrame de petróleo pode deixar oito milhões de pessoas sem água no Mar Vermelho

Derrame de crude

Chegou pelas mãos dos americanos ainda no século passado, e desde 2014 que é um gigante no meio do oceano

Desde 2017 que o FSO Safer está abandonado no Mar Vermelho, na costa do Iémen, a 60 quilómetros do porto de Hodeidah. O impacto de um derrame deste antigo petroleiro pode afetar milhões de pessoas. Com efeito, oito milhões podem ficar sem acesso a água potável, temendo-se ainda uma destruição de todo o stock de pesca do país em apenas três semanas. Este é o mais recente estudo publicado pelo jornal científico Nature Sustainability, que aponta ainda para a possibilidade do fecho dos portos circundantes de Hodeidah e Salif.

Este é um problema que já foi referido várias vezes pelas organizações internacionais, nomeadamente a Organização das Nações Unidas (ONU), mas um impasse continua, com os rebeldes da etnia Houthi a impedirem uma inspeção ao navio, que tem mais de um milhão de barris cheios de crude a bordo de uma embarcação que se deteriora de dia para dia.

A possibilidade de um derrame é cada vez maior. O Safer está visivelmente debilitado, o que significa que um rompimento fará com que o petróleo a bordo seja derramado diretamente no mar. A água já chegou à sala de máquinas em 2020 e o sistema de extinção de incêndio não está operacional", refere o artigo científico.

Para se ter um efeito do quão catastrófico pode ser o impacto deste derrame, o número de petróleo acumulado no FSO Safer é quatro vezes maior que o que estava contido no Exxon Valdez, responsável por aquele que foi considerado o pior derrame da história em termos de danos ambientais, e que ocorreu no Golfo do Alasca, em 1989.

Com o passar dos meses, especialistas vão alertando para uma cada vez maior probabilidade de surgir um derrame, o que preencheria toda a costa iemenita com crude. Mas não é só o Iémen que pode sair afetado. Arábia Saudita, Eritreia ou Djibuti, todos estes países podem vir a sofrer consequências humanas e ambientais.

Para a Greenpeace, um derramamento "não é uma questão de se, mas de quando", com a organização a traçar um cenário da catástrofe que se pode abater na zona e estender ao Médio Oriente e ao nordeste de África.

De momento prosseguem conversas com três partes envolvidas: rebeldes Houthi, o governo do Iémen reconhecido pela ONU e a própria ONU. A bordo do navio continuam sete funcionários, que, sem nada para fazerem estão impedidos de deixar o local.

Com o provável fecho dos portos de Hodeidah e Salif, a crise económica e humanitária pode ganhar outras proporções no Iémen, país que é altamente dependente do petróleo, e que pode deixar de receber 200 mil toneladas de combustível, equivalente a 38% da procura nacional, com o encerramento daquelas instalações.

Além da poluição das canalizações, dois milhões de pessoas podem ver as suas colheitas arruinadas com a chegada de uma mancha negra.

Em números da Nature Sustainability, 6,7 a 8,4 milhões de pessoas podem passar a necessitar de ajuda para se alimentarem. A dimensão das consequências depende de vários fatores, nomeadamente da época do ano em que o derrame possa ocorrer. Quanto à pesca, é esperado que 93,5% a 100% das atividades venham a ser interrompidas nas três semanas seguintes ao derrame.

Se o risco no mar e em terra é quase imediato, há também que calcular os problemas a longo prazo. Os efeitos do derrame na poluição atmosférica podem levar a um aumento das doenças cardiovasculares e respiratórias, o que pode chegar a afetar 19,5 milhões de pessoas no pior cenário, que pressupõe um derramamento rápido durante o verão.

O que parece certo é que este navio, mais tarde ou mais cedo, vai acabar por ceder, seja por rompimento, seja por naufrágio. A ONU continua a tentar inspecionar o navio, mas os rebeldes impedem a organização de o fazer, defendendo antes uma reparação da embarcação, o que custa dinheiro que ninguém parece ter disponível.

Com cerca de 30 milhões de habitantes, o Iémen atravessa uma guerra civil desde 2015, e este pode ser mais um problema para um país onde 80% das pessoas sofre com a crise humanitária.

Como chegou ali o FSO Safer

O FSO Safer está ao largo do Iémen desde 1988, quando ali chegou instalado pela Hunt Oil Company, uma empresa norte-americana que se dedica à exploração petrolífera.

Trata-se de um antigo petroleiro que foi convertido em navio flutuante de armazenamento, com o objetivo de descarregar petróleo. A isso deve o nome FSO (floating oil storage and off-loading).

Com capacidade para 3,1 milhões de barris, recebia petróleo vindo dos campos da região de Marib, no Iémen. Armazenava o produto, para depois o descarregar em navios-tanque para exportação.

Chegou ao local após um acordo de exploração estabelecido entre a empresa norte-americana e o governo do Iémen. Esse mesmo acordo expirou em 2005, e o controlo do navio foi então assumido pela SEPOC, empresa que é acusada de más condições trabalho a bordo, nomeadamente por Ahmed Kulaib, antigo diretor-geral da empresa: "Qualquer faísca resultará numa explosão naquele navio", explicou em entrevista à revista Time.

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