Fabiano: o «alemão» que tem um torneio com o seu nome e é fã de Cafu - TVI

Fabiano: o «alemão» que tem um torneio com o seu nome e é fã de Cafu

Fabiano (Foto: Vítor Maia)

Entrevista ao lateral do Boavista, III parte

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Natural de um pequeno município brasileiro onde 96% da população fala alemão, Fabiano chegou no início desta época ao Bessa como um desconhecido e pegou de estaca. No entanto, o «Alemão», como é conhecido, representou históricos emblemas brasileiros, como Cruzeiro, Internacional e Palmeiras.

O lateral-direito, de 27 anos, cresceu em São João do Oeste e iniciou o percurso como profissional na Chapecoense. Após cinco anos em Chapecó e dois anos no Cruzeiro, Fabiano mudou-se para o Verdão e apontou o golo que deu o título de campeão brasileiro precisamente frente à Chapecoense. Volvidos dois dias, grande parte dos membros do clube de Santa Catarina sofreram um trágico acidente de aéreo.

Esta entrevista dividida em três partes é uma viagem pelo passado, mas também pelo presente. Desde os conselhos do ex-axadrezado Paulo Turra e do antigo selecionador nacional Luiz Felipe Scolari – que anunciou a sua transferência para Portugal antes do tempo – ao primeiro mês e meio no Boavista.


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Maisfutebol: Foquemo-nos agora no seu lado mais pessoal. Por que lhe chamam «Alemão»?

Fabiano: «Alemão» por a minha cidade, São João do Oeste, ter sido povoada por descendentes de alemães. Até hoje, 96 por cento da cidade fala alemão. Na região onde moro, no estado de Santa Catarina, há várias cidades pequenas – até 10 mil habitantes – em que a percentagem de germanófonos é elevada. No litoral também há cidades como Pomerode ou Blumenau, onde por esta altura há a Oktoberfest… que são maiores e têm também muita gente que fala alemão e tradições daquele país.

Mas falam em alemão quando vão, por exemplo, ao supermercado?

Sim. Na minha cidade, quem não souber alemão terá muitas dificuldades em trabalhar num mercado ou num posto de gasolina. Por norma, chego e peço o que quero em alemão. Com os amigos e conhecidos a primeira língua é alemão. Só quando vem alguém de fora, é que se fala em português.

E na escola?

Na minha época, era proibido de falar, porque 70 por cento dos professores não eram de lá e havia esse tipo de restrição. Por isso, eu ainda hoje não sei escrever em alemão, só falar. Agora, é diferente. As crianças têm duas aulas semanais de alemão.

Já descobriu de raiz familiar de onde vem essa sua ascendência?

Os meus pais e avós já nasceram no Brasil. Estou a tentar tirar a dupla nacionalidade, mas não tenho os papéis que comprovem que familiares emigraram para o Brasil e de que região da Alemanha eram.

Já agora, uma provocação. Quando foi o 7-1 da Alemanha ao Brasil, no Mundial 2014, o Fabiano ficou abalado ou também um pouco dividido?

Não. Fiquei triste, como todos os brasileiros. Na minha cidade, enfeitaram a praça principal com as cores da Alemanha e do Brasil. Gente vestida de alemão, etc… Mas todos a torcerem pelo Brasil. No entanto, depois, na final do Mundial, contra a Argentina, todos torcemos pela Alemanha.

Essa ascendência alemã também influencia o seu gosto gastronómico? Que comida prefere: bockwurst ou feijoada?

A minha preferência é feijão, arroz e carne. Foi do que senti saudade assim que cheguei a Portugal, embora já tenha encontrado um ou outro bom restaurante brasileiro por cá. Por outro lado, como doce gosto bastante de cuca, uma espécie de pão de origem alemã saído do forno já quentinho que pode ter vários recheios. É uma tradição na minha terra.

Quando não joga ou treina o que gosta de fazer?

Gosto de sair, de conhecer novos lugares. Sei que Portugal tem vários sítios bonitos e tudo é relativamente perto. Vou aproveitar bem as minhas folgas.

Voltando ao futebol: que treinador mais o marcou?

Cito o Gilmar Del Pozzo, que acabou agora de ser campeão pelo Náutico da Série C – terceira divisão do Brasil. Foi dois anos e meio meu treinador na Chapecoense e subiu-nos duas vezes, da Série C até à Série A. Recordo-o porque depois de eu ter sido eleito o melhor central do campeonato estadual de Santa Catarina, em 2012, foi ele que me adaptou a lateral-direito.

Como aconteceu isso?

Quando ele chegou, jogávamos com três centrais e ele disse que gostava de jogar com uma linha de quatro, como na Europa. Conversou comigo e disse: «Tu vais fazer a lateral para mim…» E eu fiquei: «E agora? Mas não sei cruzar uma bola, não sou forte a partir para cima no um para um, até por ter 1,90m…» Ele tranquilizou-me e disse: «Vou exigir o mesmo que estavas a fazer até aqui: marca, tira a bola e sai a jogar. Quero que faças isso pelo lado e não por dentro. Não vai mudar mais nada. Estou a dar-te essa confiança.» Subimos duas vezes de divisão e continuei como lateral até hoje. Em 2014, acabei por ser escolhido um dos melhores laterais do campeonato brasileiro.

Qual a sua referência como lateral?

Sempre gostei do Cafu, muito pela história dele, por ter começado tarde e ter conquistado tudo à custa da sua persistência e confiança em si próprio.

Neste momento, decorre na sua cidade a II Copa Fabiano Leismann, que só termina em dezembro. Como surgiu essa ideia de ter um torneio com o seu nome?

Não estava na minha mente, mas fui convidado pelo responsável pela escolinha de futebol de São João do Oeste a dar o meu nome por ser o jogador mais conhecido da cidade. Esse ano, temos mais de 500 crianças dos sub-8 aos sub-14 de cinco municípios. Envolvi-me com o projeto, para podermos melhorar, termos mais apoio… Não pensei nem duas vezes até para poder retribuir todo o carinho que essas crianças têm por mim. Quando eu volto à minha cidade todos eles me reconhecem e veem-me como exemplo.

Qual o seu sonho no futebol? O que realizaria a sua carreira como futebolista?

Em pequeno gostava de jogar, mas não pensava sequer em ser profissional de futebol. A partir do momento em que isso se tornou possível, comecei a colocar-me outros objetivos: jogar num grande clube do Brasil, jogar na Europa, o que concretizei agora graças ao Boavista, jogar na seleção brasileira…

E se a Alemanha o convocasse primeiro, depois de obter a dupla nacionalidade?

[Risos] Ah, isso é uma pergunta difícil, porque são duas grandes seleções.

Pronto, uma mais fácil então: em que campeonato europeu sonha em jogar?

A Bundesliga é um dos meus sonhos, independentemente do clube. Mas o essencial é viver o dia de hoje. Se começar a pensar muito lá para a frente, perco o meu foco no momento. E o meu foco agora é o Boavista. Estou muito feliz em estar aqui, fui muito bem-recebido pela direção, atletas equipa técnica, estou ambientado e quero dar o meu melhor para poder retribuir tudo o que tenho recebido nesses primeiros tempos em Portugal.

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