«Fui 'bad boy', mas há Atletas de Cristo bem piores do que eu» - TVI

«Fui 'bad boy', mas há Atletas de Cristo bem piores do que eu»

EDMUNDO

Rui Miguel Tovar entrevista Edmundo, o Animal; fala-se de Rui Costa e de Florença, da fama de bad boy, da seleção do Brasil e da cerveja dada a um macaco. «Foi guaraná, pô!»

Rui Miguel Tovar está no Maisfutebol com a rubrica LOAD " " ENTER. Para ler todas as semanas e saborear conversas por vezes improváveis com as principais figuras do futebol. Já sabe, basta escrever LOAD " " ENTER para entrar neste mundo maravilhoso de Rui Miguel Tovar.

As legislativas têm o que se lhe diga. O PAN cresce. Vai daí, abre-se o ficheiro dos jogadores da selecção nacional e contam-se os internacionais AA com nome de animais. É um fartote. Por ordem alfabética, Cabrita, Canário, Coelho (o do Boavista), Coelho (o do Portimonense), Galo, Humberto Coelho, Pavão, Peixe e Perdigão. Posto isto, dá vontade de entrevistar alguém com conhecimento de causa. Um craque a sério, com os recordes de golos no Brasileirão (seis no Vasco-União São João) e o de número de jogos seguidos a marcar na J-League (sete, ao serviço do Tokyo Verdy). Um craque sem igual, com títulos na selecção brasileira e golos em finais importantes (3-1 à Bolívia na Copa América-97). É a oportunidade perfeita para resgatar a curta entrevista telefónica a Edmundo, o Animal, ainda no tempo da BAND.

Bom dia, Edmundo, daqui Rui Miguel Tovar, de Portugal.

Tudo jóia, Rui? Tenho uma costela portuguesa. Joguei no Vasco da Gama, acabei lá a carreira, e conheci o Rui Costa, na Fiorentina.

E que tal o Rui?

Ah, é uma pessoa sensacional e um óptimo jogador. Dei-me muito bem com ele. Imagina, o ataque era eu, ele e o Batistuta. Acabámos em terceiro lugar [a 14 pontos do Milan e a 13 da Lazio]

E o Edmundo deu-se bem na Fiorentina?

Tive os meus momentos. Bons e maus. A verdade é que o meu corpo estava em Florença, só que a minha cabeça nunca deixou o Brasil. Sabe, tinha acabado de ser campeão brasileiro pelo Vasco [1997], num dos momentos mais bonitos da minha carreira.

Quais foram os ensinamentos de Rui Costa em Florença?

Ele foi super gente boa. Mostrou-me a cidade, ensinou-me algumas palavras em italiano, disse-me onde comer bem e onde me vestir bem. Foi um guia turístico. Anos mais tarde, ele fez isso com o Kaká, em Milão. O Rui é fantástico.

Edmundo a desfilar no Carnaval do Rio

Incluía o Rui Costa no seu onze ideal?

Cara, agora você me pegou. Adoro-o, grande visão de jogo, mas joguei com o Rivaldo no esquadrão do Palmeiras [bicampeão brasileiro em 1993 e 1994]. Por isso, peço desculpa a todos vocês, portugueses, mas não tem melhor que Rivaldo, não!

Tem noção da sua carreira?

Hoje tenho noção do que fui. E a verdade é que podia ter tido uma carreira mais light, mais saudável. Com menos cartões vermelhos e muito menos confusão. Hoje, se me chamam feio, fico só meio puto da vida. Mas se fui bad boy, é porque não sou cínico. É a minha forma de ser. Há aí muitos jogadores da minha geração que se escondem atrás da Bíblia. Há atletas de Cristo bem piores que eu.

Porquê essa revolta toda, das confusões em campo e dos vermelhos?

Vim de uma família muito pobre. Quando cheguei ao futebol, era assim meio contra o sistema. Quando achei que tinha voz, que podia falar, bati de frente com alguns formadores de opinião.

Para você, o futebol é o quê?

Futebol ainda é um jogo de malandragem. Antigamente é que era muito bacana. Só jogava quem era bom e esperto. O malandro, né?

E agora, como é você?

Sou um animal doméstico [risos]. Estou mais tranquilo do que antes. Jogo pelada na praia, vou a um churrasco ou outro, frequento cinema, teatro. ‘Tá bom demais.

E como reage ao preço da fama?

Às vezes, é bom ser invisível, mas tem as suas compensações, claro. Um dia, por exemplo, encontrei o Fernando Henrique Cardoso [ex-presidente do Brasil] num restaurante. Eu a morrer de vergonha e ele veio à minha mesa para me cumprimentar. Só o futebol pode proporcionar esses momentos.

Ainda por cima, jogou na selecção brasileira. Como foi?

Ah, a selecção. Grandes recordações. Ganhei a Copa América e ainda participei numa Copa [Mundial-98, em que o Brasil perde a final com a França no dia em que Edmundo é escalado como titular e, depois, é retirado à última hora por recuperação de Ronaldo Fenómeno da convulsão]. Mas aquilo [da selecção] transforma qualquer um. A mudança é radical. Cara, só para ver uma coisa: estreei-me pelo Vasco no dia 26 Janeiro 1993. Em Março, já estava na selecção com Leonardo, Raí, Renato [Gaúcho], Júnior. Fomos aos EUA para um torneio. Chegámos lá, tirámos uma fotografia e ganhámos 10 mil dólares cada um. Eu nunca tinha visto uma nota de 100 dólares.

Última pergunta: passam 15 anos da multa do Vasco por ter dado cerveja a um macaco na festa do seu...

Foi guaraná.

A Globo estava lá, filmou tudo e o Vasco multou-o em dois mil reais [750 euros]

É verdade, mas já disse que foi guaraná, pô! É um assunto do passado, que já passou. Não interessa mais. O meu filho desse aniversário já é adulto, eu entretanto já ganhei um tanto de títulos e o macaco tem nome: Pedrinho. Rsrsrsrs. Foi uma brincadeira que extrapolou os limites. Nada disso devia ter acontecido, mas aconteceu. E já passou. Ponto.

Agora é que é, última pergunta: falhou algum objectivo no futebol?

Hoje abriria mão de todos os meus títulos para ficar num clube só e ser aquilo que Zico é para o Flamengo.

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