Zeca, o outro português no centro do vulcão grego - TVI

Zeca, o outro português no centro do vulcão grego

Capitão do Panathinaikos, comenta ao Maisfutebol os incidentes de domingo, com Vítor Pereira por protagonista, e a suspensão decidida pelo governo

Os incidentes no dérbi grego do último domingo, entre o Panathinaikos e o Olympiakos, levaram o governo grego a tomar medidas drásticas. Ainda assim, talvez não tão drásticas como parecia: depois de um primeiro anúncio, nesta quarta-feira, que apontava para a suspensão de provas por tempo indeterminado, a comunicação final do ministro dos Desportos, Stavros Kontonis, limitou a paragem aos jogos do primeiro escalão deste fim de semana: «Voltaremos a reunir na próxima semana com representantes dos clubes e das autoridades. Se os passos que exigimos, e que hoje nos foram prometidos, tiverem avançado, então os jogos poderão recomeçar na semana a seguir», afirmou o ministro, no que foi interpretado como uma solução de compromisso face aos apelos dos clubes.

Suspensão é por uma semana

A maior exigência prática do governo tem a ver com a aplicação de um sistema eletrónico de bilhetes, a exemplo do que acontece em quase todas as ligas europeias, que permita responsabilizar os clubes e os adeptos, individualmente, por comportamentos como o do passado domingo. «Na reunião deixei bem claro às autoridades do futebol que é preciso dar passos rápidos para a aplicação de lei de combate à violência, que responsabilize os clubes pelos comportamentos dos seus adeptos e os controle com o recurso ao bilhete eletrónico. Sabemos que isso não estará pronto numa semana, mas se virmos que os primeiros passos foram dados até à próxima quarta-feira, e se a polícia concordar, então os jogos poderão efetuar-se», reforçou Kontonis.

Grécia: agressões em reunião da Liga

Na declaração, após o encontro com o primeiro-ministro Tsipras, o ministro não deixou de apontar as responsabilidades das cúpulas dirigentes dos principais clubes: «Não acredito na autorregulação deste setor sem intervenção, porque para além das paixões que movem os adeptos estamos a falar de companhias anónimas que lucram muito com o atual estado de coisas. Por isso lembrei a todos os que estiveram na reunião que esperava que as suas promessas e manifestações de concordância fossem sinceras. Se o forem, é tempo de agir depressa», concluiu.

Zeca: «Devia ter sido encontrada outra solução»

No centro do vulcão do estádio Apostolos Nikolaidis esteve um português, como se sabe: Vítor Pereira, técnico do Olympiakos, foi inspecionar uma baliza no setor da claque do Panathinaikos e as coisas escalaram a partir daí, atingindo proporções incontroláveis. Mas, na mesma altura, outro português, o médio Zeca, estava do outro lado da barricada – e, neste caso, a expressão «barricada» pode ser tomada à letra, tal o clima de guerrilha entre os adeptos mais fanáticos dos dois maiores clubes de Atenas.

«Aquilo parecia o Iraque», diz presidente do Olympiakos

No Panathinaikos desde 2011, Zeca é capitão de equipa desde 2013. A conversa com o Maisfutebol serviu para comentar os incidentes de domingo e a decisão do governo. E também para enquadrar a paixão grega pelos seus clubes num quotidiano em que as questões políticas estão muito presentes. «Todos os jogadores querem ir para o campo, para dar emoções às pessoas. Por isso não me agrada esta paragem, devia ter sido encontrada outra solução. O que se passou, e continua a passar, não abona nada em favor do futebol grego, mas não será uma semana de pausa a acabar com os problemas», começa por dizer.



Nas palavras de Zeca nota-se a preocupação de um discurso equilibrado, que não incendeie mais as coisas. Até porque, explica, não estava no relvado quando o ambiente se descontrolou e não teve ocasião de falar com o técnico português: «Na altura em que o mister Vítor Pereira foi ver a baliza estávamos na cabina. O que me disseram foi que houve troca de palavras e gestos, e os adeptos tomaram isso como provocação. Depois, no fim do jogo, eles tiveram de ir para o balneário e nós ficámos em campo a festejar a vitória. Não nos cruzámos lá dentro», explica.

«Em nenhum outro país europeu este jogo se tinha realizado»

Pela experiência de quatro temporadas ao mais alto nível no futebol grego, Zeca tem dúvidas em apontar o sucedido como o momento mais grave que já presenciou num relvado: «Ainda na semana passada jogámos em Creta, fomos cuspidos, tivemos vários objetos arremessados, e o nosso diretor desportivo levou uma pedrada que lhe abriu a cabeça. Aconteceu quase tudo o que vimos no dérbi, só não houve invasão de campo no fim. São situações infelizmente habituais. E não estou a desculpar o que aconteceu depois, as duas situações são gravíssimas», reconhece.



O histórico dos dérbis é fértil em problemas, daí que qualquer pequeno gesto possa contribuir para criar incidentes. Terá sido o caso, na opinião de Zeca: «Tanto em nossa casa como na deles, os dérbis são sempre quentes. Mas desta vez houve coisas antes do jogo que podiam ter sido evitadas. A ida do presidente do Olympiakos ao relvado, antes do jogo, foi vista como provocação e dados os antecedentes podia ter sido evitada. De qualquer maneira nada justifica o que se passou», admite.

A declaração do ministro dos Desportos dá a entender que a Liga grega será obrigada a medidas mais apertadas no controlo e vigilância dos adeptos, algo que Zeca considera inevitável: «Como capitão tenho uma relação próxima com os adeptos. Ainda não tive oportunidade de falar com eles sobre domingo, mas mesmo se a nossa ligação é boa, tanto eu como eles sabemos que o que aconteceu não pode repetir-se», afirma, acrescentando que o contexto político, numa altura em que o governo enfrenta críticas pelos termos negociados com o Eurogrupo, pode acentuar os riscos nas bancadas: «Nós servimos para lhes dar alegrias e emoções fortes. As pessoas vão aos jogos para esquecerem as dificuldades que enfrentam e com a situação do país exaltam-se mais facilmente», lembra.

Ainda assim, Zeca também tem a noção de que os futebolistas passam ao lado da maior parte dos problemas sociais. Também por isso, diz, a sua experiência grega quase só tem pontos positivos: «Os jogadores vivem mais resguardados, longe dos sítios onde houve manifestações e confrontos. Estou bem, feliz, conquistei o meu espaço na equipa, gosto das pessoas e da cidade. Sinto-me privilegiado por fazer o que gosto, num grande clube, mesmo sabendo que o campeonato grego não é muito seguido em Portugal», conclui.
Continue a ler esta notícia