Boss AC: «Vivemos em crise há muito tempo»

Depois de em 2009 ter deixado tudo «Preto no Branco», Boss AC está agora de volta aos discos com «AC Para os Amigos».

«Os meus amigos não me chamam Boss, chamam-me AC. E sempre que alguém se dirige a mim como Boss, eu tenho o cuidado de dizer: "Não é Boss, é AC. AC para os amigos"», contou o rapper em entrevista ao IOL Música.

«Para além disso, gosto de pensar que faço música para os amigos: as pessoas que estão do outro lado, as pessoas que me acompanham, que vão aos concertos, que compram os discos, que gostam da minha música... Gosto de pensar nelas como amigos, porque, de certa forma, temos isto em comum: a música que nos une.»

Amigos são também os vários convidados do rapper, entre eles Rui Veloso, em «Deixou-me», e Gabriel O Pensador, no tema «Um Brinde à Amizade».

«O Rui conhece-me desde pequeno, muito antes de eu sequer pensar em entrar na música. E, para além disso, eu gravei no estúdio dele. Ele ouviu a música e disse: "Isto é muito giro, tem um ritmo diferente, faz lembrar um bocado os ritmos tradicionais portugueses do norte, a chula, o vira, e ao mesmo tempo faz lembrar o batuque cabo-verdiano"», recordou Boss AC acerca de um tema que esteve até para ficar de fora do disco.

Já a colaboração com Gabriel O Pensador, há muito prometida e desejada entre os dois rappers, acabou por acontecer fortuitamente após um jantar em Lisboa em casa de um amigo em comum.

«Ele viajava no dia seguinte e disse-me: "Não queres ir para estúdio?". Passámos a noite toda em estúdio e o resultado está aí.»

Num disco de amigos feito para amigos, Boss AC deixa também alguns recados para os que gostam menos dele, como acontece na última faixa do CD, «Laia».

«A música não é dedicada a ninguém em especial, é para quem lhe servir a carapuça. (...) Mas inimigo é uma palavra muito forte, eu não creio que tenha inimigos», afirmou o rapper.

Como single de apresentação do disco, o rapper escolheu «Sexta-Feira (Emprego Bom Já)», tema que retrata os problemas do dia-a-dia de muitos portugueses em tempo de crise económica.

«Eu acho que [as medidas de austeridade] vêm muito tarde. É um bocado aquela história de "depois do assalto, trancas na porta". Porque se é verdade que estamos em crise, também é verdade que a crise não vem de hoje. Nós vivemos em crise há muito tempo», disse.

«Toda a gente tem uma solução milagrosa para a crise, qualquer um é um político em potência (...), mas a verdade é que muitas vezes nós não fazemos o nosso papel de cidadãos com voz activa. Uma coisa tão simples como votar: "É domingo, está sol, vou mas é para a praia". E depois quando isto bate na rocha: "Ah é culpa do governo". A culpa é do governo, sem dúvida, mas não temos a nossa parte [de culpa] também?»

Para Boss AC, a solução para as dificuldades que o país atravessa passa assim por uma intervenção mais activa da população e nunca, como já foi sugerido pelo governo português, pela emigração.

«Eu ouvi essas declarações e fiquei pasmado de pensar que é o próprio governo a incentivar a emigração. Em vez de estarmos preocupados em resolvermos os nossos problemas, a mensagem é: "Não estás bem? Muda-te". Não faz sentido nenhum», defendeu Boss AC.