A radicalização é o conceito do momento na política americana.
Na véspera das mais importantes eleições intercalares das últimas décadas, a sensação com que se fica é que os democratas nunca estiveram tão à esquerda e os republicanos nunca se encostaram tanto à direita.
A eleição presidencial de Donald Trump, há dois anos, acabou de vez com a voz dos moderados no Partido Republicano. Mas também acelerou a “esquerdização” dos democratas.
Para estas “midterm” estão a vigorar dois tipos de candidatos: nos democratas, grande parte dos escolhidos são membros da ala que apoiou Sanders contra Hillary nas primárias de 2016; entre os republicanos, os candidatos que seguem a agenda Trump e apoiam claramente o Presidente levaram a melhor sobre quem ainda restava numa ala mais centrista e moderada do GOP.
É claro que esta dupla tendência terá consequências.
No campo de batalha da campanha, os democratas recorreram a Barack Obama mas praticamente ignoraram Hillary Clinton.
Se, como tudo indica, tomarem o controlo da House, a vítima mais imediata deverá ser Nancy Pelosi – acusada pela ala esquerdista dos democratas de não ser suficientemente agressiva para com a Administração Trump.
No lado republicano, a estratégia do partido que neste momento domina as duas câmaras do Congresso e também a Casa Branca tem-se confundido com as intervenções diárias do Presidente.
O GOP – que tinha como principais referências figuras como Lincoln, Eisenhower ou Reagan – está agora completamente rendido a Trump. É, cada vez mais, apenas e só o partido de Donald.
Basta ver como a perspetiva do governador John Kasich, republicano do Ohio, sobre “não haver invasão nenhuma dos imigrantes da caravana” foi minoritária no seu partido.
Isso, aparentemente, será uma oportunidade para os democratas. A mobilização contra Trump tem tudo para ser um dos fatores dominantes desta eleição. Mas também não será de descurar a mobilização pró-Trump: o Presidente continua a ter uma base fiel, que corresponderá a perto de 40% do total do eleitorado que costuma votar.
Tudo dependerá, por isso, da afluência às urnas.
Democratas demasiado à esquerda
Historicamente, as intercalares têm ainda mais abstenção que as presidenciais.
A percentagem de votação na terça será, logo, um primeiro indicador sobre o que poderá acontecer – será que a mobilização vai funcionar em força para os dois lados?
Será a diminuição da abstenção uma… vantagem colateral da radicalização da política americana?
Nos duelos mais significativos, há que olhar com especial atenção para o Texas, onde a diferença entre o incumbente e favorito Ted Cruz, republicano, e o “challenger” e estrela ascendente do Partido Democrata, Beto O’Rourke, tem vindo a reduzir.
John Brennan, diretor da CIA durante a Presidência Obama, não hesitou em apoiar publicamente O’Rourke.
Se para os republicanos a radicalização deu, em 2016, a presidência a Trump, não é líquido que os democratas possam colher frutos pela mesma moeda, apenas dois anos depois.
Ed Rendell, ex-governador democrata da Pensilvânia, que na última década foi fluindo na ala centrista Obama/Hillary, escreveu no The Hill: “Cuidado, democratas: estamos a virar demasiado à esquerda!”