Antijogo e autocarros - TVI

Antijogo e autocarros

Vitória Setúbal-Boavista

«A Técnica da Força»

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A Técnica da Força é um espaço de opinião quinzenal de Francisco David Ferreira, jornalista da TVI. 

Todos os anos se discute o eventual exagerado antijogo em alguns jogos do campeonato. Normalmente, a discussão anda de braço dado com as acusações sobre a falta de qualidade de alguns jogos do campeonato. Seja, discuta-se.


O tópico antijogo surge normalmente quando uma equipa forte perde pontos com uma equipa fraca. Lanço duas ideias gerais. Por um lado, tendo a pensar que há muitos jogos do campeonato que não têm o tempo de compensação mais adequado ao que aconteceu durante o jogo. Confesso não ter dados concretos para suportar esta ideia, e portanto sublinho que é apenas uma observação minha, mas a esmagadora maioria dos jogos terão à volta dos três ou quatro minutos de compensação, sendo raro ultrapassar os cinco. 

Ora, como sublinhou o meu camarada Sérgio Pires esta semana, Portugal tem o quarto pior registo de tempo útil de jogo no conjunto de 35 campeonatos. Permitam-me então pensar que os árbitros não estarão a compensar devidamente as paragens durante o encontro. Parece, de certa forma, que os tempos são quase dados por “default”: muitas paragens, quatro ou cinco minutos, poucas paragens três minutos. 

Muito se discute sobre este assunto. Ano após ano. Alguns sugerem paragens no relógio, mas eu discordo - seria uma mudança radical, desajustada e também de difícil implementação. Simplifique-se: os árbitros devem simplesmente estar (mais) atentos a este dado. Talvez uma maior articulação com o 4º árbitro, que poderia monitorizar mais atentamente os tempos de paragem para assistir jogadores, para consulta do VAR, substituições, marcação de livres, etc, comunicando à restante equipa perto do intervalo e do final do encontro. Se o jogo está parado oito minutos para assistir jogadores, então é da mais elementar justiça haver oito minutos de compensação. Será que acontece?

Queria abordar o outro assunto que vem à baila nestas alturas: o «autocarro». Também costuma surgir quando equipas fortes tropeçam contra equipas teoricamente mais débeis. 

É dominante a seguinte corrente de opinião: futebol verdadeiramente bonito é o apoiado, passe curto, construção a partir de trás. O único aceitável. Remeto agora também para o texto do meu camarada Pedro Jorge da Cunha, que afirma (e eu concordo) que há um certo preconceito e desconfiança se treinadores apresentam uma ideia de jogo que não assente numa espécie de tiki-taka. 

Defender bem, como várias equipas da Liga conseguem fazer com orçamentos diminutos (Tondela e Boavista à cabeça), é fantástico. Defender é futebol também. Recordo-me sempre do criticado Egil Olsen, que levou a selecção da Noruega aos maiores feitos da história com um futebol defensivo e ultra-directo nos anos 90.

E porquê recordar Egil Olsen? Porque este norueguês desenvolveu este modelo com base na ciência e na filosofia. Futebol directo (também conhecido como o pontapé para a frente)? Olsen explicava que assim apanhava o adversário desorganizado, e chegou à conclusão que, estatisticamente, essa era uma enorme vantagem. Construir calmamente permitia que a outra equipa se organizasse defensivamente. Além disso, colocar a bola rapidamente na frente afastava-a da sua própria baliza, e uma equipa só faz golos quando está no último terço…

Argumentos válidos (concorde-se ou não), que servem para mostrar que mesmo as estratégias aparentemente mais rudimentares podem ser fruto de centenas de horas de análises e discussão. Isto para não recordar a Grécia de 2004...

Não sei se em Portugal se joga feio. Eu até acho que não. Mas, há uns dias, um amigo meu, adepto de um dos três grandes, sublinhou: a diferença de qualidade é tão grande, que as equipas mais fracas precisam de utilizar todos os meios para tentar conseguir algum ponto na luta pela sobrevivência. 11 homens dentro da área ou paragens constantes. Mas, digo eu: essa diferença abismal entre equipas talvez seja o verdadeiro problema do nosso campeonato.

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