O suicídio e o preconceito do treinador português - TVI

O suicídio e o preconceito do treinador português

Chuteiras Pretas

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«CHUTEIRAS PRETAS» é um espaço de Opinião do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Um olhar assumidamente ingénuo sobre o fenómeno do futebol. Às segundas-feiras, de quinze em quinze dias. Pode seguir o autor no Twitter. Calce as «CHUTEIRAS PRETAS».

A ideologia chegou com maus modos e quem dela discordar, ui ui, leva logo com a sentença da brigada dos bons costumes táticos: «bola para a frente? Tsssss, tssssss, que heresia, que pobreza, que incompetência, ó céus!».

O preconceito metastizou-se pelos blocos de notas dos treinadores, sarrabiscou a eficácia em detrimento do politicamente correto e - à boleia dos saturantes discursos dos bitaiteiros de horário nobre em canais esterilizados - criou um corredor higiénico (andava mortinho por escrever isto) para a separação de pensamentos.

1. De um lado os discípulos da sacrossanta construção em passe curto a partir do guarda-redes, no matter what.
2. Do outro, onde me incluo, os que percebem que toda a regra deve ter exceção e que uma doutrina levada ao extremo do mais radical fundamentalismo deixa de ter a capacidade de servir uma equipa.

Gosto muito do futebol apoiado, da tentativa de jogar de pé para pé, da tabela em apoio frontal e da capacidade de gerir o jogo com bola. É esteticamente inatacável e pode ser tremendamente eficaz, se feito nos momentos certos e nos jogos adequados.

Detesto é ver uma equipa a suicidar-se em nome do preconceito (ou preconceitos) do seu treinador. Nas últimas semanas, e já nas duas/três épocas anteriores, a quantidade de golos imbecis sofridos por culpa de uma perda de bola em zona proibida é o retrato ridículo desta nova ordem do futebol «moderno».

De forma resumida, é assim: o guarda-redes toca curto para um defesa e, apesar da pressão alta do adversário a fechar linhas de passe e a ameaçar o roubo, a equipa em posse recusa olhar para o corredor de salvação: bola na frente, em busca de profundidade ou da conquista de uma segunda bola.  

Há equipas tão cegas na ortodoxia desta invenção, tão cegas dizia, que preferem perder a bola (e sofrer um golo idiota) a afastar o perigo para longe de uma forma não aceitável aos olhos do seu técnico.

Isto, para mim, não faz nenhum sentido. «Morri agarrado às minhas ideias»? Poupem-me.

O único objetivo do futebol é meter a bola na baliza oposta. Se houver qualidade para fazê-lo em posse - cuidada e eficiente -, ótimo, perfeito. Adoro esse futebol. Se não houver, como tantas vezes não há, é intolerável o haraquíri por opção. O suicídio de honra como forma… de vida.

PS1: um passe na frente, longo, pode e deve ser bem feito, em busca de espaço nas costas da defesa contrária ou de um homem capaz de segurar ou ganhar no ar. A partir daí, num segundo momento, a equipa ganha conforto para ter bola e tentar criar desequilíbrios. Em zonas do campo mais sensatas.  

PS2: esta Opinião nasce depois de jogos e jogos em que assisto a erros de profissionais que sempre me pareceram imperdoáveis até em amadores. O exemplo mais mediático chegou do Dragão (FC Porto-Famalicão), mas basta ver outros resumos de jogos da nossa Liga para encontrar duas mãos cheias de instantes de perdas de bola ridículas na primeira fase de construção. Refiro-me, em concreto, aos treinadores portugueses apenas por conhecer melhor a nossa realidade. 

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