Ferreira Leite diz que "medidas são boas", mas não acredita em défice zero - TVI

Ferreira Leite diz que "medidas são boas", mas não acredita em défice zero

  • Manuela Ferreira Leite
  • 11 out 2018, 22:52

O comentário de Manuela Ferreira Leite na 21.ª hora sobre as medidas anunciadas para o Orçamento de 2019

Manuela Ferreira Leite comentou na 21.ª hora as medidas anunciadas para o Orçamento de 2019  e embora concorde com elas, diz que o Governo tem de explicar como vai chegar ao défice 0 sem qualquer contrapartida.

"O défice zero é a grande bandeira do orçamento. Zero pode não ser bom se isso significar um aumento de carga fiscal tremendo, que teria consequências no crescimento económico ou se tivesse enorme redução de despesas, mas aparentemente não é isso."

A comentadora referia-se especificamente aos manuais gratuitos, à redução do preço da energia e do aumento das pensões: "As medidas apresentadas são boas? São. Alguém não goste delas? Impossível. Quem é que discorda dos manuais gratuitos, pensões aumentadas, quem discorde com o baixar do preço da energia? Ninguém. Não acredito é que o défice de 0,2 ou 0 tivesse subjacente já estas medidas." 

Depois, falou dos manuais e das pensões individualmente.

Começo por discordar da gratuitidade, que se diga que os manuais são gratuitos. Até para a educação das crianças e famílias é mau, porque os manuais custam dinheiro e vão ser pagos por outras pessoas e isso não nos importamos. O peso das famílias é que é menor. A ideia da gratuitidade para a criança não é bom, porque trata o livro como algo que não custa nada. Os livros custam muito dinheiro."

 

Aumento de pensões, quem é que não concorda? Todos concordámos, mas devia ser acompanhado de motivos de sustentabilidade da segurança social. A segurança social está capaz de aguentar? Deus queira que sim. Com a redução do desemprego, mais descontos para a segurança social, há uma margem susceptível de ser utilizada. Não se está a gerir para se houver uma crise maior e o desemprego aumente, não tenhamos que cortar nas pensões. Isto é que não é dito e descredibiliza." 

Manuela Ferreira Leite insistiu no que não foi apresentado para chegar ao défice zero.

Falta-me qualquer coisa para acreditar que isto é verdade. Isto parece ser tudo susceptível de ser feito e ao mesmo tempo temos défice zero? Não aumentam os impostos, aumenta-se a despesa e o défice é zero? Será que algumas medidas tomadas não vão ser concretizadas, como as horas de trabalhos ou os precários? Não há duvida que com défice zero não há tantos empréstimos e não se pagam tantos juros, daí resulta uma poupança na fatura dos juros que pode dar margem para outro tipo de medidas, mas a redução do IVA na energia, aumento das pensões, manuais gratuitos são volumes de despesa e quebra de receita significativos. Tudo isto é certo, mas não se pode anunciar sem se justificar."

Para explicar a mensagem, a comentadora recordou palavras recentes de Vítor Gaspar.

Esta semana, o professor Vítor Gaspar veio dizer que o quadro regulamentar da UE é extremamente complexo e que ficava satisfeito com dois tipos de medida: controlar o rácio do PIB com a dívida e o crescimento da despesa. Não falou do défice porque o défice é o elemento que pode contrariar o crescimento se implicar aumento de impostos. Se o défice está construído e é alcançado tanto pode ser saudável como mórbido, por ter consequências tais para as pessoas."

 

Se o défice zero é alcançado com medidas que têm que ver com o mau estar das populações, não sei o que as pessoas prefeririam. Não sei se as pessoas preferem manuais gratuitos até aos 12 anos ou se prefeririam transportes melhores na cidade e sistema de saúde que dessem mais tranquilidade. As populações mais carenciadas são as que mais podem sofrer com défice zero se ele for alcançado como tem sido. Ficamos com a sensação que estamos a ser enganados. Como é que vamos ter défice zero? Quais são as medidas de contraponto? Estas medidas ninguém vai dizer que são más.

E deixou uma crítica à forma que o Governo encontrou para dizer que o desemprego baixou.

Os fundos europeus para a formação são distribuídos para as empresas para formação aos funcionários como para o setor público para formação também. Quando um desempregado, que tem o subsídio de desemprego, vai para uma ação de formação passa a receber do fundo europeu, mas deixa de receber o subsídio de desemprego. Não devia deixar de contar como desempregado. Há casos anedóticos de formações, que trabalhou toda a vida numa área e agora está a fazer curso de jardinagem. Isto é uma forma da taxa de desemprego baixar, usando fundos estruturais que não são para esse objetivo. Seriam mais úteis se fossem dados às empresas e cada uma delas sabe exatamente onde precisa de funcionários capazes e daria formações precisas, mas isso não tinha efeito na taxa de desemprego. Fica a minha dúvida se parte significativa da redução do desemprego não tem que ver com ações de formação, cuja formação não se destina a entrada no mercado de trabalho. Podemos estar na fronteira entre o que é legítimo e o que é legítimo, mas enganador nos efeitos." 

No seu comentário, Manuela Ferreira Leite teve ainda tempo para falar da nomeação de Carlos Pereira, pelo Governo, para integrar a administração da entidade reguladora da energia (ERSE).

"É absolutamente incompreensível. Se há instituição importante é a ERSE porque regula o mercado de energia, que tem estado na boca do mundo sobre os preços, a forma de cálculo das taxas, rendas excessivas, isso tudo. Há até um inquérito parlamentar em curso. Como neste mercado estão empresas muito importantes, mas dezenas de operadores, é necessário que a administração seja independente, que não seja forçada por interesse político. Não estou incomodada por haver uma pessoa do PS ou de outro, será sempre de algum porque terá convicções. Mas lançar a desconfiança a uma entidade destas, que precisava imaculada, com alguém da máquina do partido? Ele era presidente do PS Madeira. Sei que é formado em economia, especialização em agricultura e turismo. Não tem nada que ver com energia."

 Para finalizar, Manuela Ferreira Leite referiu que os Governos foram sempre fomentando a internacionalização do ensino, sobretudo o Ensino Superior, mas não se preocupou com as consequências, como a habitação, que agora atinge rendas excessivas.

Não se lembraram de resolver um problema básico que era a sua instalação [dos estudantes]? Agora quem tem quartos aluga pelo preço que quer, quem não pode pagar fica em maus lençóis. Isto pode acontecer também com a saída de Porto e Lisboa, por causa dos incentivos, e pode lançar-se o rastilho para outras zonas do país. Quem toma medidas, não se lembra das consequências."

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