Nem de propósito: o paradoxo de Alvalade - TVI

Nem de propósito: o paradoxo de Alvalade

Marco Silva e Bruno de Carvalho (LUSA/ Manuel de Almeida)

Não é um teorema matemático, mas é uma batata quente para Bruno de Carvalho: agora que o Sporting está em festa, como despedir Marco Silva?

Relacionados
 
Reflexões de um futebol quase a chegar ao verão:
 

1. E agora, Bruno de Carvalho?
 
Pois, que berbicacho tem agora o presidente do Sporting em mãos.
 
Mandar embora um treinador com mais três anos de contrato já não devia ser muito normal.
 
Fazê-lo precisamente na altura em que o clube de Alvalade está em festa, depois da conquista (com raça, mérito e coração enorme) da primeira prova nacional nos últimos sete anos,  (a Taça de Portugal), teria contornos a variar entre o absurdo e o disparatado.
 
É que Marco Silva, depois da final do Jamor, passou a ser o novo herói do Sporting. E com toda a justiça, diga-se.
 
Quem se der ao trabalho de analisar as reações nas horas seguintes ao triunfo do Sporting na final do Jamor identifica de imediato o tal paradoxo de Alvalade: quando o momento podia ser de festa total e de lançamento da ideia de que a temporada 14/15 tinha sido, afinal, de grande sucesso, eis que o clima de «Guerra Fria» entre presidente e treinador marcou os espíritos e as conversas de grande parte dos adeptos sportinguistas.
 
E agora, como descalçará o presidente do Sporting esta bota?
 
Não vai ser fácil.
 
Por um lado, já toda a gente percebeu que a relação entre Bruno de Carvalho e Marco Silva chegou a uma espécie de «ponto de não retorno».
 
Por outro, neste momento, diria que o presidente do Sporting não tem condições desportivas para despedir Marco Silva.
 
 
2. Relação contraditória com os treinadores
 
Bruno de Carvalho foi tão bom a escolher treinadores (acertou em cheio em Leonardo Jardim e em Marco Silva) como desastroso na forma como lidou com eles (sobretudo com Marco, mas já o tinha sido com Leonardo).
 
Em função da repetição de erros (uns de comunicação, outros de liderança), o atual presidente do Sporting começa a ser um caso perdido. Mesmo quando o seu clube ganha.
 
Sim, Bruno de Carvalho tem méritos na gestão.
 
E, sim, Bruno de Carvalho em pouco tempo conseguiu o que escapava ao Sporting há vários anos: ganhar uma competição nacional. Tem, por isso, uma boa parte do crédito a reclamar.
 
Mas a forma como não sabe lidar com o seu próprio poder, exposta de modo claro e visível na relação impossível com Marco Silva, é eloquente.

Bruno de Carvalho, no momento em que devia estar a colher os louros da primeira grande conquista desportiva, tem tido dias complicados. Por culpa própria. 
 
 
3. O Benfica e Jorge Jesus
 
Jorge Jesus deve partir para sétima época no Benfica?

Desportivamente, o interesse do clube na continuidade do treinador é total: com Jorge Jesus, o Benfica voltou aos títulos, voltou às vitórias e voltou a ser dominante no plano interno.

Há quem aponte a má campanha europeia desta época como um dos motivos para apostar menos na renovação. Discordo: as duas finais da Liga Europa em 2013 e 2014 seriam crédito suficiente para que Jorge Jesus tenha devolvido ao Benfica a dimensão europeia: mesmo que não consiga repetir campanha idêntica.

Uma necessária viragem para a formação levaria a treinador com outro perfil, como o de Rui Vitória? Não necessariamente. Um dos méritos de Jesus tem sido a capacidade de conseguir adaptar-se ao que tem.

Em seis épocas, mesmo quando não ganhou, conseguiu sempre formar na Luz um Benfica competitivo e interessante. 

Vieira e Jesus já andam a discutir a renovação, mas estarão ainda longe da solução.

A menos que surja uma hipótese muito tentadora do estrangeiro, o desfecho natural deste impasse será mesmo... a continuidade.


4. A FIFA, Blatter e o que Figo já estava a denunciar
 
O escândalo na FIFA, que levou a esta súbita resignação de Joseph Blatter, é daqueles casos em que, durante anos, toda a gente sabia e ninguém fez nada.

Há muito que, nos corredores do futebol, se ouviam histórias de subornos, trocas de favores e possível corrupção nos grandes negócios da entidade que manda no futebol mundial.

As atribuições dos Mundiais, os votos a Blatter nas sucessivas eleições, as explorações de áreas que movimentam muitos milhões de dólares foram gerando dúvidas e suspeições. Mas a verdade é que, durante anos a fio, o poder de Blatter parecia absoluto.

Nos últimos anos, a oposição da UEFA, com Michel Platini a cabeça, foi subindo de tom. E neste processo eleitoral, ela fez-se ouvir de forma clara pelo candidato português, Luís Figo. 

As detenções e acusações que rebentaram dois dias antes das eleições, atingindo dirigentes da FIFA e elementos muito próximos de Blatter, não terão sido propriamente uma grande surpresa para quem acompanha minimamente a atividade da FIFA. Mas o que terá surpreendido foi a dimensão da investigação da justiça norte-americana. 

Grande parte das críticas feitas por Figo na campanha mostraram-se fundadas, como o próprio ex-candidato português lembrou ontem.

Deveria ele ter ido às urnas? Creio que não.

Como se viu pela votação do príncipe jordano, juntar-se a um ato eleitoral que considerava viciado à partida seria caucioná-lo.

Os dias que antecederam a eleição para o seu quinto mandato marcaram o... início do fim para Blatter.

Presidente da FIFA, literalmente, desde o século passado (1998, há 17 anos), durou apenas quatro dias até perceber que tinha que renunciar. Cai -- e com estrondo.

E o pior pode estar para vir (com, de resto, Blatter deixara entender no momento da eleição): o que mais iremos saber sobre lavagem de dinheiro, troca de favores, subornos e alegada corrupção, sobretudo nos processos de negociação e decisão das atribuições dos mundiais da Rússia-18 e Qatar-22.

O escândalo FIFA pode, assim, estar apenas a começar. Será tornado público o «relatório Michael Garcia», sobre possível corrupção na atribuição dos mundiais 2018 e 2022 e que está na posse do comité de ética da FIFA desde setembro passado?


5. O Maisfutebol faz esta semana 15 anos

Tive um professor de Tecnologia dos Media, em 1996 (sim, já fui mais novo), que dizia nas aulas que «um ano na net equivale a cinco no mundo analógico».
 
Na altura, mesmo alunos de Ciências da Comunicação não tinham uma noção exata do que era isso da internet. Com o tempo (e experiência acumulada nesses dois mundos, o papel e o digital), fui vendo que essa relação não será exagerada.
 
Ora, seguindo essa contabilidade, é fácil perceber que  15 anos é, para um projeto como o Maisfutebol, muito mais que uma «fase de adolescência». Também não é velhice, que isto da net exige renovação permanente.
 
Em junho de 2000, há 15 anos, trabalhar no Maisfutebol era um desafio que muitos rotulavam de «loucura». Hoje, já ninguém nos chama loucos. O desafio, esse, talvez seja ainda maior,
  

«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?
 
Continue a ler esta notícia

Relacionados