Fuga para a vitória - TVI

Fuga para a vitória

Julio Velazquez

«A Técnica da Força»

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Faltam 4 jornadas para o final da época e ainda há clubes a trocar de treinador. No caso, compreende-se a solução do Vitória FC: está aflito e não quer (nem pode) descer de divisão.

Ainda que seja possível entender os fundamentos desta decisão algo inusitada, aproveito a deixa para convidar a uma reflexão sobre este fluxo escandaloso de despedimentos. Um caso claro da falta de capacidade de dirigentes, atrevo-me a dizer.

E não estou a falar concretamente de nenhum clube, mas simultaneamente sei que se aplica a quase todos os emblemas da I Liga. Passo a explicar.

Fala-se muito em projectos, é sonante, fica bem, mas o que se percebe é que os “projectos” não vão além do ultra-curto-prazo.

O caso de Lito Vidigal é extremo, tem apenas quatro jogos pela frente e, claro, a «sobrevivência» é a única missão.

Sublinho, gosto de Lito Vidigal, é o treinador certo para a tarefa: muitos acusam-no de resultadista, mas prefiro vê-lo como organizado e competente. Tem um método que dá pontos, e isso também deve ser elogiado (não só de posse de bola inócua se faz o futebol). Até é possível que, caso concretize o objectivo, Vidigal permaneça no clube.

Mas uso este cenário para relembrar um sintoma incompreensível e infelizmente tão transversal: que gestão dos clubes é esta, que ano após ano acaba com trocas e mais trocas de líder nas fases decisivas, à espera de um abanão quase milagroso que salve a equipa, mas com a ausência total de um projecto, uma visão, uma solução de estabilidade?

Quando não vai lá com planeamento, plantéis estruturados e treinadores adequados, viram-se talvez para a fé. Lá está, uma espécie de fuga para a vitória.

A dança de treinadores já é um cenário tão habitual quanto repetitivo, como é repetitiva a ideia de base que se repete quando as direcções fazem estalar o chicote. Claro, é mais fácil trocar um treinador do que meia dúzia de jogadores. Claro, o treinador não ganha e vive de resultados. É óvio que isto são evidências lapalicianas, mas escondem em si a triste incapacidade de tantos dirigentes do futebol nacional… 

Porque quando verificamos que há clubes que trocam de treinador todas as épocas, alguns mais de duas vezes por época, então podemos estar perante um de vários cenários.

Ou estes dirigentes nunca sabem escolher treinadores, assinam com o primeiro que lhes parece razoável sem qualquer tipo de análise aprofundada, e portanto concluo que são incompetentes; ou não sabem escolher ou adequar jogadores ao pretendido pelo treinador, ao ponto de andar todos os anos a ter que trocar de treinador para ver se é desta resulta, e nesse caso são incompetentes; ou só contratam jogadores que não se adaptam ou que não rendem com qualquer treinador, e portanto não sabem avaliar jogadores (e, acrescento, são incompetentes para o cargo que ocupam); ou então têm um azar supremo, está tudo bem estudado e planeado, mas por algum motivo oculto as coisas não resultam, e realmente dispensar o treinador é a única solução - neste caso, realmente, talvez só com acesso a ajudas divinas para resolver tal situação azarada. 

Os números ajudam a ilustrar. Vou tomar como referência as últimas três épocas.

O Vitória de Setúbal teve cinco treinadores diferentes - seis se contarmos com o regresso de Lito Vidigal, uma repetição. O Moreirense teve seis. O Sporting teve sete. O Desportivo das Aves teve cinco. O Boavista teve cinco. O B SAD teve quatro. O Braga teve quatro (e terá mais um interino até ao final da época - cinco). O Marítimo vai em cinco. Só para dar alguns exemplos. Raras são as equipas que tiveram menos de quatro treinadores em três anos.

Como explicar tantos problemas de forma tão generalizada?

Se às vezes é inépcia, por vezes posso admitir que seja também por impossibilidade.

Numa liga em que o dinheiro (e o poder) está concentrado em tão poucos, não espanta que alguns não mais consigam do que ambicionar uma época sem sustos. Ou até com sustos, algum sofrimento, mas missão cumprida no final.

Basta olhar para esta temporada, e perceber que além dos candidatos ao título e 3/4 clubes com discurso mais europeu, as restantes equipas assumem que o único objectivo é não descer de divisão.

Estamos a falar de um conjunto de 10 a 12 equipas (em 18, sublinhe-se!) que, pelo menos no que transmitem para o exterior, jogam apenas de olhos postos na distância para a linha de água.

É demasiado pobre. Alguns clubes, repito, porque não podem mais. Outros até podem ou deviam poder, mas se calhar não dá para mais.

 

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