«Foi um impulso que me deu» - TVI

«Foi um impulso que me deu»

Julgamento da raptora de Penafiel (JOAO ABREU MIRANDA/LUSA)

Penafiel: Alice confessou o sequestro da bebé, mas negou que tivesse saído de casa com a intenção de roubar uma criança. Simulou uma gravidez e teve receio de defraudar a família. «Via-os tão contentes e não tive coragem de os desapontar». Foi ao Hospital «à procura de um milagre». Só reparou na bebé «porque ela chorou». Sabia que estava a cometer um crime

«O que está aí é verdade». Foi com esta frase que Alice Ferreira, 38 anos, confessou o sequestro de uma bebé com dois dias de vida, no Hospital do Padre Américo, em Penafiel, a 17 de Fevereiro de 2006. A frase foi proferida logo que o juiz presidente leu a acusação.

Visivelmente confusa com os trâmites do julgamento, a arguida ainda hesitou quando o magistrado lhe perguntou se queria falar. Foi preciso o juiz sugerir à advogada que conferenciasse com a arguida para que esta anunciasse que pretendia falar.

Não soube explicar por que se dirigiu ao Hospital naquela tarde. «Foi um impulso que me deu», afiançou, para mais à frente acrescentar: Normalmente é o cérebro que comanda a perna, mas neste caso foram as pernas a comandar o cérebro»

«Estava desesperada, confusa. Não sabia o que fazer». E prosseguiu: «Tinha esperança de encontrar uma solução». «Uma solução para quê?», questionou-a o juiz, ao que Alice ripostou: «Tinha mentido a toda a gente em relação à gravidez», sublinhou. «Via-os tão contentes e não tive coragem de os desapontar», desculpou-se.

«No fundo ia à procura de um milagre»

Mais adiante, quando estava a ser interrogada pelo Ministério Público, Alice acabaria por admitir que «no fundo ia à procura de um milagre», entenda-se, de uma criança, «de alguém que não quisesse o filho». Mas, em alternativa, também ia à procura de «um acidente», o que «no meu caso era um milagre», assegura, para atestar o desespero em que vivia.

Apostada em afastar a premeditação do crime [«Quando saí de casa a ideia era desaparecer»], chegou a referir em tribunal que apenas soube com certeza que não estava grávida poucos dias antes de raptar a bebé. E justificou que os testes de gravidez eram inconclusivos. Questionada sobre as razões por que nunca foi acompanhada por um médico durante esse tempo, respondeu que temia receber a informação de que não estava grávida. E apesar de o companheiro ter afirmado já, no inquérito, que a arguida lhe chegou a mostrar ecografias, Alice desmente.



«Só me apercebi porque ela chorou»

A acusação refere que Alice Ferreira levou Andreia Elisabete do Hospital do Padre Américo, em Penafiel, no dia 17 de Fevereiro de 2006, quando aquela tinha dois dias de vida.

Para tal dirigiu-se ao balcão, espreitou a lista dos doentes internados, indicou um nome aleatoriamente, subiu de elevador à obstetrícia, viu um bebé sozinho numa cama, colocou-o dentro de um saco acolchoado que transportava consigo, desceu de elevador, dirigiu-se ao carro onde colocou o bebé dentro num saco de viagem preparado para o efeito. De seguida, dirigiu-se ao hospital para entregar o cartão da visita e recolher o cartão de contribuinte.



Passou a noite dentro do carro com a bebé e, no dia seguinte, apresentou-se em casa com a suposta filha. Não registou a menor, nem cumpriu o plano de vacinação. Manteve a criança consigo durante mais de um ano.

Alice não soube explicar por que subiu ao piso da obstetrícia, acompanhada de um saco acolchoado próprio para bebé e garante: «Só me apercebi da bebé porque ela chorou».

Admitiu saber que praticou um crime, mas «na altura, nem pensei se estava a fazer bem ou mal». Alice garante olhar para o passado como «um pesadelo». «Sei que fui eu que fiz aquilo, mas vejo tudo como um pesadelo».

Refere ainda que a família lhe ligou nessa noite e ao ouvir o choro de um bebé, a arguida foi obrigada a dizer que a filha já tinha nascido. O próprio marido, em depoimento refere que nunca desconfiou de nada: «Pensava que a partir dos 40 anos começava a dar filhos».

O juiz ainda quis saber por que não cumpriu o plano de vacinação da menor, ao que Alice confessou: «Não levava a menina à vacina porque achava que alguém ia descobrir. Não tinha documentos».

Aliás, o medo dominou os 13 meses em que manteve a bebé consigo. «Cada vez que tocavam à porta, achava que era a polícia para me prender».

O julgamento será retomado no dia 18 de Setembro, às 9:15.
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