O ano de Marcelo e Costa: muito mais que afetos - TVI

O ano de Marcelo e Costa: muito mais que afetos

Não faltaram polémicas, mas também não faltou apoio. O primeiro-ministro e o seu Governo resistiram a tudo e estão a recuperar a confiança, como mostram as últimas sondagens. O Presidente esteve do seu lado

Um primeiro-ministro legitimado por uma maioria parlamentar de esquerda, um Presidente da República eleito por uma maioria popular pouco depois, uma governação pós-troika em que quase ninguém acreditava, mas que tem sabido colher os frutos da época, com a ajuda da Presidência. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa não precisam de ser os melhores amigos, mas são os melhores amigos que a estabilidade política poderia desejar.

Num ano marcado por algumas polémicas, como a Caixa Geral de Depósitos, as viagens pagas pela Galp, o IMI, mas também por temas acesos como as 35 horas, os contratos de associação ou o Orçamento do Estado para 2017, o Presidente deitou sempre a mão ao primeiro-ministro, tal como um professor que acredita no seu aluno, ainda que muito tempo tenha decorrido desde os tempos da Faculdade de Direito de Lisboa, quando a sala de aula foi o campo de batalha de Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa.

Conhecem-se de outras vidas, cruzaram caminhos na política, e mantêm uma proximidade que nenhum dos dois esconde. Uma proximidade em que a amizade e o respeito mútuo não colidem, ou não têm colidido, com o relacionamento institucional.

Quando tomou posse como Presidente da República, a 9 de março, Marcelo prometeu que Belém seria garante de estabilidade para São Bento. Costa já tinha prometido lealdade. Os dois estão juntos desde então.

Não conseguindo combater o clima de crispação política entre uma direita inconformada e uma esquerda determinada, Marcelo pediu políticos à altura. “Casos a mais cansam”, disse no seu discurso do regressado feriado do 5 de Outubro.

António Costa não se livrou dos casos, mas saiu deles sem grande aparato, muito graças a uma esquerda que se manteve fiel e de uma oposição descredibilizada por uma governação para além da troika, mas também porque Marcelo Rebelo de Sousa colocou sempre água na fervura.

O cenário de eleições antecipadas foi sempre descartado, a recuperação da economia portuguesa foi sempre uma convicção, as piores previsões, internas e externas, foram sempre combatidas com otimismo, por um e por outro, como aconteceu recentemente com os dados do Instituto Nacional de Estatística sobre as exportações, que apresentaram uma ligeira queda, mas sobre os quais Marcelo disse ter um 'feeling' de que iriam subir nos relatórios de novembro.

Mãos livres

Bom, o cenário de eleições antecipadas acabou por ter de ser descartado depois de, em maio passado, Marcelo ter-se visto na necessidade de clarificar as suas palavras quando disse que não criaria qualquer instabilidade política até às autárquicas (outubro de 2017). O Presidente acabou por explicar, depois de críticas à esquerda, que não acreditava que o Governo de António Costa estivesse a prazo.

Atendendo à (ainda) difícil conjuntura interna e externa de Portugal e à possibilidade de agitar mercados com uma palavra fora de tom, Marcelo tem optado por um discurso conciliador, positivo, descomprometido e sem comprometer Costa e o seu executivo junto dos portugueses ou das instâncias internacionais. E sempre com uma garantia: em Belém não há porta-vozes do Presidente ou fontes, só há Marcelo e só Marcelo fala.

Foi sobre a Caixa Geral de Depósitos que, porventura, terão saído mais avisos, numa altura em que o país discutia o estatuto de gestor público e a recusa de uma administração, com António Domingues à cabeça, em apresentar as suas declarações de rendimentos. Mesmo sob exigências à direita para comissões de inquérito ou perante a queda da administração, pelo meio Marcelo aprovou o fim dos tetos salariais e por fim aplaudiu a escolha de Paulo Macedo para liderar o banco público, depois de a oposição ter feito o mesmo. O futuro da Caixa foi sempre mais importante para o Presidente que o seu passado e, por isso, Marcelo seguiu em frente, permitindo que também o Governo o fizesse, com uma única ressalva, de que o executivo usasse o fim dos limites aos vencimentos dos gestores da Caixa da forma desejável, no sentido de recuperar o banco com êxito.

Só a 21 de dezembro, Marcelo promulgou e se pronunciou positivamente sobre o Orçamento do Estado para 2017, o segundo de António Costa, aprovado na especialidade a 29 de novembro. "O Presidente da República deve silenciar-se para estar de mãos livres", justificou numa das primeiras vezes em que foi questionado sobre o documento.

E, uma vez mais, não havia razão para duvidar do primeiro-ministro. O OE2017 foi feito com a ideia de "aumentar a esperança dos portugueses no futuro", motivo suficiente para, em síntese, justificar a sua promulgação.

As "mãos livres" até ao momento vetaram três diplomas, sendo apenas um do Governo de António Costa, sobre o levantamento do sigilo bancário e que, no fundo, o Governo já aguardava. Os outros dois vetos foram para diplomas da Assembleia da República, o primeiro que alterava os estatutos da Sociedade de Transportes Coletivos do Porto (STCP) e da Metro de Porto e o outro sobre a possibilidade de recurso às barrigas de aluguer.

Também cedo Marcelo percebeu a importância de apaziguar o discurso em torno dos colégios privados e o fim dos contratos de associação, pedido paciência aos intervenientes. Foi em maio, mas em setembro, aquando do arranque escolar, a polémica esgotou-se.

Excluindo a divergência de opinião sobre as vacas voadoras do Governo, nas quais o Presidente não acredita e o primeiro-ministro entende fazerem todo o sentido no pós-troika com a gerigonça, Marcelo e Costa estão próximos, tão próximos quanto um guarda-chuva permite. Foi em junho, em Paris, que os dois mostraram ao mundo como funciona, segundo o Presidente, "a colaboração de poderes".

“Mas vejam bem, quem tem o guarda-chuva é o senhor primeiro-ministro de esquerda, quem é apoiado é o Presidente que veio da direita. É a solidariedade", disse Marcelo, dirigindo-se aos emigrantes e lusodescendentes.

No fundo, feelings, pressentimentos de que tudo vai correr bem.

Continue a ler esta notícia