José Sócrates: “Houve castigo mas sem crime, é extraordinário” - TVI

José Sócrates: “Houve castigo mas sem crime, é extraordinário”

Em entrevista exclusiva à TVI, o ex-PM sublinha que um ano depois da detenção ainda não há acusação deduzida. “É uma loucura”

“É uma loucura passar um ano e não haver acusação”, sublinha José Sócrates, lembrando que um ano depois da detenção e prisão, ainda não foi deduzida qualquer acusação. “Não se apresentam provas e factos, porque não as têm e não as tinham e não as vão ter. É impossível provar aquilo que nunca aconteceu”, critica o ex-primeiro-ministro, em entrevista exclusiva à TVI.

No Jornal das 8 o ex-governante considera que a prisão preventiva foi “injusta” e o Ministério Público tinha o “dever” de apresentar acusação para Sócrates se poder defender.

“Tive um curso acelerado de ação e processo penal. Sei que não sou o único, mas não podemos por de lado o impacto político e social. Isto prejudicou o PS. O Ministério Público devia ter cumprido escrupulosamente o que vem na lei”.

Sócrates lança dura críticas ao Ministério Público, que acusa de “brutal difamação” e de fazer “campanha de denegrimento pessoal”.

"A única razão que foi invocada para me prenderem, ao fim de três meses, foi a perturbação do inquérito.Houve castigo mas sem crime, é absolutamente extraordinário. Isto tem uma repercussão política e social que não seria possível nos outros países da Europa: nem em Espanha, Inglaterra, Irlanda ou Brasil"
 

O ex-governante confessa que não fazia ideia de que ia ser detido. Soube no dia anterior à detenção que houve buscas a casa de amigos e familiares, nomeadamente da sua ex-mulher e do filho, numa “operação de terror junto dos meus amigos e família” que, assegura, “pretendia assustar e intimidar”.

“A minha primeira vontade foi levantar-me para lhes fazer frente. Estavam a aterrorizar a minha família. E dizer-lhes façam o favor de dizer o que têm contra mim para eu me defender”, atirou.

Sócrates vai mais longe e acusa as autoridades de “cinismo”, já que o seu advogado telefonou na véspera da detenção a mostrar a sua disponibilidade para ser interrogado, e terá enviado um email a reiterar.

“Tudo isto foi encenado: dizem que receberam o email quatro dias depois. Não tenho provas, mas a minha suspeita é que esconderam o mail para me deter”


Seis meses depois da prisão preventiva, colocou-se a hipótese da prisão domiciliária com pulseira eletrónica, que Sócrates recusou. O argumento: 

"Não quero que neste processo odioso conste nada com a minha concordância. Cooperar com a justiça não é calarmo-nos, é defendermo-nos".



O ex-primeiro-ministro chegou mesmo a citar o chefe de investigação, Paulo Silva, quando este disse que a violação do segredo de justiça comprometia "definitivamente os trabalhos e que passou todos os limites" e que devia ser descoberto o autor ou autores da "reiterada" divulgação dos factos. E que esse(s) autor(es) só poderiam ser três: o próprio chefe de investigação, o procurador ou o juiz”. Sócrates conclui que "afinal quem está a perturbar o inquérito é um deles". Mais um adjetivo para classificar a situação: "selvática".


Por várias vezes, José Sócrates afirmou que entende existir algo de "pessoal" contra ele neste processo. A sua suspeita é que que investiga pensa assim:

"A consequência política do processo já ocorreu: o PS perdeu as eleições. Já nem precisam de apresentar prova, porque a prisão já constitui prova. Ah, se esteve preso alguma coisa fez"


O ex-primeiro-ministro retira três conclusões do processo. A primeira é que "o Estado conduziu ou permitiu que fosse conduzida uma campanha de denegrimento pessoal e difamação pessoal, contrária a todas as regras do direito, que prevê a presunção da inocência". A segunda é que desde o dia 15 de abril não foram respeitados os direitos da defesa. A terceira é que ao fim de um ano não foi apresentada a acusação. "Daí eu dizer que vai nisto alguma coisa de pessoal", reforçou. 
 

“O Ministério Público deve ou calar-se ou deduzir a acusação. Calar-se significa a inocência”

 


“Violação de segredo de justiça transformou-se em negócio”


José Sócrates argumenta que a providência cautelar contra o grupo Cofina é contra um “negócio” que está a afetar as instituições, já que em questão não está o “interesse público”, mas “o de vender mais jornais ou ter mais audiências”.
“Não têm o direito, estão a cometer um crime. A argumentação que me parece vir do grupo é: estou a perder dinheiro porque não me permitem cometer crimes. Não pode ter jornalistas como assistentes para dar a colegas para publicar”.

Este processo, segundo o ex-governante, serviu para alimentar a suspeição sobre o último governo PS. “Só me soltaram depois das eleições”, remata.

Recorde-se que  José Sócrates foi detido a 21 de novembro de 2014, no aeroporto de Lisboa, indiciado pelos crimes de fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais e corrupção passiva para ato ilícito, tendo ficado preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de Évora. 

A medida de coação foi alterada para prisão domiciliária, com vigilância policial, a 4 de setembro. 

A segunda parte desta entrevista exclusiva à TVI será transmitida esta terça-feira, também no Jornal das 8.

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