Há quatro anos, uma tomada de posse de (outras) "tormentas" - TVI

Há quatro anos, uma tomada de posse de (outras) "tormentas"

Tomada de posse do Governo (Tiago Petinga/Lusa)

Em 2011, Presidente da República falava nos "custos catastróficos" do incumprimento. Passos Coelho prometia que Portugal não ia falhar, ao mesmo tempo que antecipava os mares conturbados que o país teria de atravessar. Agora a embarcação à deriva é mais política do que financeira

O XX Governo Constitucional toma posse esta sexta-feira de manhã, com o mesmo primeiro-ministro e o mesmo Presidente da República de há quatro anos. O que disseram Passos Coelho e Cavaco Silva nos seus discursos de 2011? O pedido de resgate tinha sido feito há pouco tempo. Discursos focados na tragédia herdada e nas incertezas subsequentes, ao mesmo tempo que o chefe de Governo assumia o compromisso de não falhar. Desta vez, as tormentas são outras, não tanto as financeiras, mas as políticas. 

Em junho de 2011, pouco depois de tomar formalmente posse, no Palácio da Ajuda, Passos Coelho antevia uma fase complicada: "Vivemos tempos difíceis e mais tormentas nos aguardam", declarava.

O primeiro-ministro dizia querer "afugentar o medo paralisante" mas também não esconder "a dimensão e a urgência dos desafios" colocados. Prometeu reduzir o endividamento do país e acabar com o que apelidou de "embriaguez da dívida" portuguesa, que quatro anos depois continuou a aumentar (estava em 128,7% do PIB no segundo trimestre de 2015), sendo mesmo a terceira mais alta da União Europeia. 

Em 2011, Passos Coelho apregoava que Portugal "jamais" poderia "regressar à ilusão de que a dívida em espiral alimenta crescimento".

"O país sabe por experiência própria que a embriaguez da dívida se limita a encenar um falso e curto bem-estar até ao dia em que chega a fatura e o colapso".


No final dessa intervenção de posse do XIX Governo, assegurou: "Portugal não pode falhar e eu sei que Portugal não falhará". O país conseguiu, de facto, sair do programa de ajuda externa sem recorrer a um programa intercalar ou sujeitar-se a novo resgate.

Há quatro anos, o Presidente da República, por sua vez,  tinha advertido no seu discurso que "não há motivos para deixar de fazer o que deve ser feito, a começar pelo cumprimento dos compromissos que assumimos perante as instituições internacionais".

"Os custos de um falhanço seriam absolutamente catastróficos e durariam por muitos e muitos anos, hipotecando drasticamente o futuro das gerações mais jovens", declarava o chefe de Estado. O Executivo não conseguiu travar a fuga de jovens do país e Portugal voltou a ser, de novo, um país de emigração como aquela que se viveu nos anos 60/70, admitiu ainda esta semana o Governo. 
 

As maiorias e os consensos


Há quatro anos, Cavaco Silva notava que para enfrentar a situação do país o novo Governo dispunha "da força de um resultado eleitoral inequívoco, de uma maioria no Parlamento e da cooperação do Presidente da República", mas alertava que Portugal não estava em condições de viver "crises políticas sucessivas". Ironicamente, o país está hoje a viver uma. 

Na altura, sublinhou que competia ao novo executivo assegurar que a coligação governativa tivesse "solidez, consistência e durabilidade". O Executivo durou efetivamente toda a legislatura, apesar do episódio da "demissão irrevogável"
de Paulo Portas que acabou por não o ser. 

Também em 2011, e apesar da maioria o Parlamento à direita, o Presidente considerava que a "gravidade da situação" e a "dimensão dos sacrifícios" impunha a procura de "compromissos alargados a outras forças políticas", numa altura em que, antevia, seriam pedidos "possivelmente os maiores sacrifícios desde que foi instaurada a democracia". O Governo acabou por protagonizar um "enorme aumento de impostos"
, como foi classificado pelo então ministro das Finanças Vítor Gaspar. 

Embora pedisse esse entendimento interpartidário, atualmente Cavaco Silva considera a alternativa de esquerda que está a ser negociada "claramente inconsistente"
, tendo posto de parte PCP e BE como forças credíveis por não defenderem os compromissos internacionais (euro, UE, NATO). Quando indigitou Passos Coelho como primeiro-ministro, na semana passada, também expressou o seu desagrado por PSD e PS não se terem entendido: "É incompreensível". 

Voltou a usar o termo "catastrófico" como em 2011, mas desta vez não para falar do incumprimento financeiro e sim para se referir ao perigo que seria uma política que tivesse como objetivo a saída de Portugal do euro e da UE. 

As dificuldades do país, no entanto, costumam dominar os discursos de tomada de posse dos executivos. No  governo minoritário de 2009, no seu primeiro discurso como primeiro-ministro socialista José Sócrates elegeu precisamente o combate à crise como a "primeira prioridade" e a recuperação da economia como o seu "objetivo central".

Tinha acabado de perder a maioria absoluta conquistada quatro anos antes, tal como aconteceu nestas eleições com Passos Coelho. Mas nunca a crispação política subiu tanto de tom como nos tempos que correm, com uma clara divisão entre esquerda e direita. E com o expectável derrube do Governo que agora toma posse daqui a uma semana e pouco. Quatro anos volvidos, Portugal, o país banhado pelo Atlântico, continua como um barco à deriva, mas desta vez o anzol apanhou mais a Política do que as Finanças. 
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