Jerónimo admite abdicar da liderança do PCP em 2020 - TVI

Jerónimo admite abdicar da liderança do PCP em 2020

  • SS
  • 2 mar 2019, 09:25

O líder comunista, que vai comemorar o seu 72.º aniversário a 13 de abril, completará década e meia como secretário-geral do PCP em novembro. Em entrevista à Lusa, o líder comunista reconheceu um "estilo próprio" ao Presidente da República, que "não tem mal nenhum", e aceita que Marcelo Rebelo de Sousa tem cumprido e feito cumprir a Constituição da República Portuguesa

O secretário-geral do PCP admite não ser recandidato à liderança do partido dentro de menos de dois anos porque "é da lei da vida", mas frisa que não vai "calçar as pantufas" e continuará militante comunista, sendo uma decisão do coletivo partidário.

Em entrevista à Lusa, Jerónimo de Sousa adotou um tom e discurso assentes no particípio passado e algo nostálgicos até quando questionado, insistentemente, sobre o seu futuro no Congresso Nacional ordinário do PCP previsto para o final de 2020.

Até hoje, e já lá vão 14 anos, se há coisa que levo comigo são as grandes manifestações de solidariedade em momentos difíceis que o coletivo partidário tem tido para com o secretário-geral, nos bons e maus momentos. Aceitei esta responsabilidade que os meus camaradas entenderam atribuir-me, procurando estar à altura, o que não é fácil, mas percebi que nestas tarefas cada um de nós tem de perceber e escolher o momento para alterar as suas responsabilidades", disse.

O líder comunista, que vai comemorar o seu 72.º aniversário a 13 de abril, completará década e meia como secretário-geral do PCP em novembro.

"Inevitavelmente - é da lei da vida -, acabarei por ter responsabilidades no partido diferentes, alteradas, embora com um sentimento: não vou calçar as pantufas, vou continuar como militante, como a pessoa que sou, a ajudar o meu partido. Continuarei a ser comunista", acentuou, escusando-se a "fazer previsões", pois trata-se de "uma decisão que passa, em primeiro lugar, pelos" seus "camaradas".

Colocado perante a possibilidade de não continuar na liderança do mais antigo partido político português (98 anos), Jerónimo de Sousa limitou-se a dizer que "sim, é possível, mas também não é impossível uma outra decisão".

O histórico secretário-geral do PCP durante 31 anos (1961-1992), Álvaro Cunhal, foi sucedido pelo antecessor de Jerónimo de Sousa, Carlos Carvalhas, aos 79 anos.

"Eu vim para a política, como jovem sindicalista, com o ardor da juventude, para ser capaz de dar a minha contribuição, o melhor que sabia e podia. Procurando, com os meus camaradas mais velhos, apreender aquela grande lição de que a política é uma coisa nobre desde que seja para servir os interesses dos trabalhadores e do povo e não a nós próprios", continuou.

O atual líder comunista prevê que, "em relação a 2020, a vida o dirá, mas" vinca ter a "consciência" de que esteve "sempre do lado certo".

"Vou sair, em termos materiais, como entrei. Pode-se ver aliás pelo balanço do Tribunal Constitucional [rendimentos de cargos públicos], não são palavras de circunstância. Ter esta consciência de que dei o melhor que sabia e podia, não sendo perfeito, não sendo o suprassumo da batata, mas acreditando nesta causa, neste projeto, dando o meu melhor", disse.

Nunca me candidatarei. É o meu partido que candidata, seja para a Presidência da República, Assembleia da República, Parlamento Europeu, uma autarquia, a decisão é do partido. Posso ter opinião e tenho, mas nunca me ouvirão dizer que 'eu quero ser' secretário-geral ou que 'não quero ser'. Não tenho aqui um horizonte limitado", insistiu.

Jerónimo de Sousa esclareceu que, "naturalmente, o congresso poderá resolver" e que, "numa situação de saúde ou problema deste género, o comité central em qualquer momento está em condições de substituir o secretário-geral".

 

“Não tem mal nenhum” Marcelo ser simpático e "tirar selfies"

Nesta entrevista, o líder comunista reconheceu um "estilo próprio" ao Presidente da República, que "não tem mal nenhum", e aceita que Marcelo Rebelo de Sousa tem cumprido e feito cumprir a Constituição da República Portuguesa.

Jerónimo de Sousa comentou os três anos de mandato que o chefe de Estado está prestes a completar, mas vincou alguns reparos à sua atuação, nomeadamente em relação ao setor do Serviço Nacional de Saúde.

Sim, no essencial não existiu nenhuma situação jurídico-constitucional em que o Presidente da República tivesse tomado uma posição contra o espírito ou a letra da Constituição. Isso não se verificou. Obviamente, tem um estilo próprio", reconheceu.

Apesar de "um ou outro momento" em que o PCP não acompanhou o posicionamento do Presidente da República, o secretário-geral comunista avaliou que não existe um "choque" ou uma "conflitualidade" de Marcelo Rebelo de Sousa face ao Texto Fundamental.

Nisso, cada um é como cada qual, ele tem um estilo muito próprio. Eu não faço juízos de valor. Não tem mal nenhum que ele seja simpático com as pessoas e que goste de tirar as 'selfies' [fotografias com outras pessoas através de telemóveis]. Ninguém pode levar o Presidente da República a mal", continuou.

Já o apelo do chefe de Estado para um consenso entre PS e PSD sobre a Lei de Bases da Saúde merece a reprovação do líder do PCP porque "os grandes grupos económicos privados fazem o seu negócio à custa da doença, não estão para curar, vivem fundamentalmente da doença".

 

Jerónimo concorda em “pedalar mais” mas "não à toa”

O secretário-geral comunista disse ainda concordar com o primeiro-ministro no sentido de Portugal "pedalar mais" para contrariar a desaceleração económica internacional, mas não "à toa", reiterando uma rutura com as imposições externas e a adoção da "política alternativa, patriótica e de esquerda".

Temos que pedalar mais, mas não é à toa. Temos de definir para onde é que podemos pedalar. Se o Governo se mantém prisioneiro destes condicionalismos, constrangimentos, depois não dá resposta e lá vem a crítica ao estado do Serviço Nacional de Saúde, dos transportes, da própria demografia", afirmou, referindo-se aos constrangimentos da União Europeia, como as metas de défice ou os encargos com a dívida, entre outros.

Para o líder do PCP, "é preciso outro caminho, outro rumo" e "dar continuidade a este processo progressista em termos sociais, mas é preciso alterações profundas na conceção dos problemas nacionais".

"Por isso dizemos, com singeleza, que a CDU [coligação com "Os Verdes"] ainda não reúne força para ser, já não digo predominante, mas pelos menos determinante, nesta evolução porque acreditamos que é possível em Portugal uma política diferente. Isto pode ser entendido como discurso de comício, mas não é. Portugal tem possibilidades imensas de resolver os seus problemas", garantiu.

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