Marcelo pede aos "indignados" com as nomeações de familiares que mudem a lei - TVI

Marcelo pede aos "indignados" com as nomeações de familiares que mudem a lei

  • CM
  • 5 abr 2019, 19:49

"O que não é possível é indignarem-se com situações que existem e não se indignarem ao ponto de considerarem que não é de pensar duas vezes e se definirem regras e acolher princípios sobre essas situações”, criticou, admitindo que “já ficaria muito satisfeito” se a questão fosse debatida neste período eleitoral

O Presidente da República admitiu hoje que como, “porventura, a ética não chega”, será necessário mudar a lei para limitar as nomeações de familiares de titulares de cargos políticos e de familiares dos seus colaboradores.

Aquilo a que estamos a chegar à conclusão é que, porventura, a ética não chega, é preciso mudar a lei também no que respeita à nomeação dos colaboradores de titulares de cargos políticos”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, à margem de uma visita à loja do alfarrabista mais antigo de Portugal, João Rodrigues Pires, em Lisboa.

Na quinta-feira à noite, o chefe de Estado já tinha defendido uma alteração legislativa para limitar nomeações familiares de titulares de cargos políticos, argumentando que a lei em vigor tem quase 20 anos e “não é tão exigente quanto hoje é a opinião pública portuguesa”.

Hoje, o Presidente da República clarificou que a legislação que está em causa é o Código do Procedimento Administrativo que, atualmente, prevê para a administração pública, em geral, “proibições absolutas” no que diz a nomeações de familiares muito próximos, nomeadamente pais, filhos, cônjuges ou irmãos, e, depois, “limitações mais ténues” no caso de tios e sobrinhos.

Para Marcelo Rebelo de Sousa, o que deve ser discutido agora é “se esses limites que existem para a administração pública em geral não deviam funcionar também para os colaboradores de titulares de órgãos políticos”, ou seja, assessores, adjuntos, chefes de gabinete, quer no plano parlamentar quer no plano governamental.

Além disso, continuou, se se deve alargar a outros membros da família e até que limite deve ir esse tipo de proibição ou restrição.

As situações de que se falou agora foi de primos”, recordou, referindo-se ao caso noticiado esta semana de que o secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, tinha nomeado um primo para adjunto do seu gabinete.

Por outro lado, se deve existir algum controle quando se trata da nomeação de familiares de outros responsáveis políticos.

A propósito deste controle, Marcelo Rebelo de Sousa falou do caso de França, onde, desde 2017, quando um responsável político nomeia um familiar de outros titulares de órgãos políticos, “isso é comunicado a uma alta autoridade para a transparência”.

Questionado se o problema não é mais ético do que legal, o Presidente da República lembrou que, quando o Código do Procedimento Administrativo foi elaborado, “também havia uma questão ética, mas ninguém ligava muito à questão ética”.

Na altura [a ética] não chegava, na administração pública era possível legalmente nomear irmãos, nomear filhos, nomear pais, nomear tios, nomear sobrinhos e houve regras que foram definidas porque se entendeu que a ética não chegava, era preciso a lei”, salientou.

Marcelo Rebelo de Sousa escusou-se, contudo, a responder diretamente se existe falta de ética, alegando que a polémica dos últimos dias “significa que o país mudou no seu juízo de ética social”.

O país admitia coisas há 20 anos, há 30 anos, dez anos, que hoje não admite”, disse, salientando que hoje não é considerado normal ter secretárias ou adjuntos familiares.

Por isso, insistiu, “essa mudança de sentimento ético e jurídico na sociedade portuguesa deve ser acompanhado de uma mudança de lei”.

O Presidente da República reconheceu, contudo, que em final de legislatura há muito pouco tempo para ponderar “matérias destas consideradas sensíveis”.

Mas, o que não é possível é indignarem-se com situações que existem e não se indignarem ao ponto de considerarem que não é de pensar duas vezes e se definirem regras e acolher princípios sobre essas situações”, criticou, admitindo que “já ficaria muito satisfeito” se a questão fosse debatida neste período eleitoral.

Na quinta-feira, durante o debate quinzenal na Assembleia da República, o primeiro-ministro, António Costa, defendeu que deve ser debatido e definido um “critério claro e uniforme” quanto às limitações dos direitos dos familiares de titulares de cargos políticos, que valha para o atual e para futuros governos, sugerindo que tal pode ser feito na Comissão parlamentar da Transparência.

Já hoje, o PS saudou o repto do primeiro-ministro para que o Parlamento legisle sobre critérios de nomeações de familiares, com os restantes partidos a remeterem esta matéria para o Governo e para os domínios da ética e bom senso.

PSD, CDS-PP, BE e PCP disseram, contudo, que se existirem iniciativas legislativas do Governo ou do PS, estarão disponíveis para o debate e para um eventual aperfeiçoamento legislativo.

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