Santos Silva quer mudança da lei para não “mercantilizar” nacionalidade portuguesa - TVI

Santos Silva quer mudança da lei para não “mercantilizar” nacionalidade portuguesa

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  • 17 jun 2020, 14:18
Covid-19 na Assembleia da República

Em causa está a atribuição da nacionalidade portuguesa a descendentes de judeus sefarditas expulsos no século XVI

O ministro dos Negócios Estrangeiros defendeu esta quarta-feira uma alteração à lei de modo a "corrigir a tempo" que se "mercantilize" uma "nacionalidade de conveniência", a portuguesa, para os descendentes dos judeus sefarditas expulsos no século XVI.

O ministro Augusto Santos Silva foi ouvido na comissão de Assuntos Constitucionais sobre as alterações à Lei da Nacionalidade propostas pelo PS e relatou aos deputados factos "preocupantes" que recebe das embaixadas e dos consulados, como anúncios em países, que não especificou, em que a nacionalidade portuguesa é anunciada em campanhas tipo 'blackfriday'.

Estes são factos que Santos Silva afirmou ser sua "obrigação" comunicar à Assembleia da República e que, alertou por diversas vezes, "diminuem a reputação internacional de Portugal".

Uma "reputação internacional" que o país ganhou quando, por unanimidade, em 2015, o parlamento aprovou a lei que permitiu a "reparação histórica" quanto aos descendentes dos judeus sefarditas expulsos em 1492, sem pôr em causa a relação do Estado português relativamente ao mundo árabe.

Ao longo da aplicação da lei, a partir de 2016, descreveu ainda, "foram-se multiplicando os sinais" de que "a generosidade" da lei portuguesa "estava e está a ser aproveitada para se montar um dispositivo que, na prática, significa oferecer o passaporte europeu".

Para o ministro, este é o momento certo de se fazerem as alterações legais necessárias para se evitar que "se generalize a ideia de que há um país" em que é possível "haver uma nacionalidade de conveniência".

Se se generaliza essa ideia é um rombo na credibilidade internacional de Portugal", concluiu.  

O chefe da diplomacia portuguesa sublinhou, também por diversas vezes, que "há um abuso da generosidade da lei, mas não uma ilegalidade" nos pedidos de nacionalidade que também dão acesso a um passaporte europeu, que tem facilidades no acesso sem vistos, por exemplo, aos Estados Unidos.

O parlamento está a debater um projeto do PS de alteração da Lei da Nacionalidade, que na sua primeira versão agravava os critérios com que os sefarditas - descendentes dos judeus expulsos de Portugal por D. Manuel I - podem pedir a nacionalidade portuguesa.

Em 19 de maio, o PS mudou a sua proposta de alteração à lei, deixando de "obrigar" os descendentes de judeus sefarditas a residir dois anos em Portugal para conseguir a nacionalidade, mas mantém "outros critérios de ligação atual e efetiva" ao país.

Nos últimos anos, cresceu o número de pedidos de nacionalidade por parte dos descendentes de judeus sefarditas.

Segundo os números de Augusto Santos Silva, este ano foram recebidos 52.440 pedidos de nacionalidade por parte de descendentes de sefarditas, mais do que os 25.199 registados em 2019.

Um aumento explicado pelo facto de haver um maior conhecimento da lei portuguesa e também pelo efeito de a lei espanhola, também de "reparação histórica", ter tido "uma vigência limitada" no tempo.

São números que mostram que não há "um problema de excesso de pedidos", mas que o ministro usou para justificar que "esta é uma boa altura para corrigir alguns aspetos" da legislação, "a tempo de evitar o processo de desvirtuamento do espírito da lei".

À direita, o CDS-PP, através de Telmo Correia, foi o único a colocar dúvidas às mudanças na lei, com o argumento de que foram feitas alterações à lei pela esquerda parlamentar que “alargaram” a possibilidade de concessão da nacionalidade e que, “agora, o PS lembrou-se” de colocar questões sobre os descendentes sefarditas.

Uma alteração para “assassinar” uma lei aprovada por unanimidade e que, alertou, pode ser interpretada como “um ato antisemita” por parte de Portugal.

O PSD, que já anunciou o voto contra as alterações à lei, apenas colocou perguntas.

À esquerda, o PCP, através de António Filipe, afirmou que vai votar a favor do projeto do PS, a que apontou “um defeito”: a aplicação do regime até final de 2021.

E afirmou recear que a lei vá “provocar uma corrida à nacionalidade portuguesa”.

Pelo Bloco de Esquerda, a deputada Beatriz Gomes Dias alertou que “é preciso investigar e não só agitar medos com base em critérios morais”.

A deputada do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) Inês Sousa Real apontou uma “desproporção de preocupação” quanto à “mercantilização da nacionalidade” entre este processo dos descendentes de sefarditas, por comparação com os “vistos gold”, que depende de investimentos, nomeadamente imobiliários.

Em todo o mundo existem, cerca de 3,5 milhões de descendentes sefarditas de origem portuguesa e espanhola.

Milhares de judeus espanhóis estabeleceram-se em Portugal e uniram-se às comunidades sefarditas depois da expulsão ordenada pelos Reis Católicos em 1492.

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