Mudança de género: nada "em causa" para o PS, PSD quer relatório médico - TVI

Mudança de género: nada "em causa" para o PS, PSD quer relatório médico

  • LCM/Atualizada às 16:34
  • 10 mai 2018, 14:04

Bloco de Esquerda está contra o que Marcelo e o PSD pretendem. PCP diz-se "disponível" para "encontrar soluções"

O PS considerou esta quinta-feira que o veto presidencial ao diploma sobre autodeterminação e identidade de género não coloca em causa o essencial da iniciativa e adiantou que vai "acomodar" os reparos feitos por Marcelo Rebelo de Sousa.

Carlos César assumiu esta posição no final da reunião semanal do Grupo Parlamentar do PS, depois de confrontado com o veto anunciado na quarta-feira pelo Presidente da República ao decreto que estabelece o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género e permite a mudança da menção do sexo no registo civil a partir dos 16 anos.

Marcelo Rebelo de Sousa enviou uma mensagem à Assembleia da República em que solicita que se pondere a inclusão de relatório médico prévio à decisão sobre a identidade de género antes dos 18 anos de idade. Perante os jornalistas, o líder da bancada socialista desdramatizou as consequências da decisão presidencial, dizendo que as mudanças exigidas em relação ao diploma "são perfeitamente acomodáveis" pela Assembleia da República.

"O veto do senhor Presidente da República, na sua melhor leitura, significa a concordância em relação à iniciativa e ao seu conteúdo em geral. Dispõe apenas, no que toca à decisão que é tomada entre os 16 e os 18 anos, de associá-la à existência de um relatório médico, que nem sequer é um relatório de diagnóstico", sustentou.

Ou seja, de acordo com a interpretação de Carlos César, aquilo que o chefe de Estado coloca à Assembleia da República "é perfeitamente acomodável numa alteração que se possa fazer proximamente".

Esta lei, que estabelece também o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa, foi aprovada no parlamento no dia 13 de abril, com votos a favor de PS, BE, PEV e PAN e da deputada social-democrata Teresa Leal Coelho, a abstenção do PCP e votos contra de PSD e CDS-PP.

O diploma, resultante de uma proposta do Governo e de projetos de BE e PAN, alarga aos menores com idade entre 16 e 18 anos a possibilidade de requerer um "procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome próprio", através dos seus representantes legais, sem necessidade de um relatório médico.

O Presidente da República pediu ao parlamento que pondere incluir um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil até aos 18 anos no diploma que vetou sobre identidade de género.

A razão de ser dessa solicitação não se prende com qualquer qualificação da situação em causa como patologia ou situação mental anómala, que não é, mas com duas considerações muito simples. A primeira é a de que importa deixar a quem escolhe o máximo de liberdade ou autonomia para eventual reponderação da sua opção, em momento subsequente, se for caso disso. O parecer constante de relatório médico pode ajudar a consolidar a aludida escolha, sem a pré-determinar", argumenta o Presidente.

PSD apoia introdução de relatório médico

O PSD saudou o veto presidencial ao diploma que previa a mudança de género no registo civil a partir dos 16 anos sem relatório médico, admitindo que os sociais-democratas apoiem uma futura lei que introduza esta salvaguarda.

“O PSD avisou e os partidos à esquerda, PS incluído, teimosamente não quiseram ouvir as recomendações que o PSD introduziu no debate. Sempre dissemos que jamais aprovaríamos uma lei que não exigisse um relatório médico para demonstrar a chamada disforia de género”, afirmou o vice-presidente da bancada social-democrata Carlos Peixoto, em declarações aos jornalistas no parlamento.

Por essa razão, o PSD saudou o veto do Presidente da República conhecido na quarta-feira e no qual pediu ao parlamento que pondere incluir um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil até aos 18 anos.

O senhor Presidente da República fez aquilo que devia ser feito, vetou, e nós saudamos e felicitamos o veto do senhor Presidente da República que nos parece óbvio, avisado e absolutamente inevitável”, defendeu.

O deputado do PSD disse esperar que, com a devolução do diploma ao parlamento, “os partidos de esquerda tenham a sensatez, o equilíbrio e a ponderação de equacionar estas questões, nomeadamente a exigência de um relatório médico”.

Questionado se o PSD, que votou contra o diploma, mudará o sentido de voto caso seja introduzida esta salvaguarda clínica, Carlos Peixoto respondeu afirmativamente.

Se os partidos da esquerda aceitarem que a disforia seja um ato clínico demonstrável por um profissional da área, o PSD estará disponível a votar, como sempre disse, esta matéria”, afirmou, considerando que a questão pode colocar-se até antes dos 16 anos, devendo ser sempre exigível que haja um juízo clínico.

Bloco contra o relatório médico

O BE manifestou a intenção de encontrar "a melhor solução" para ultrapassar o veto presidencial à lei que permitia a mudança de género aos 16 anos no registo civil mas reiterou a sua oposição ao relatório médico.

Em declarações aos jornalistas no parlamento, a deputada do BE Sandra Cunha começou por salientar que o veto não é "à lei e autodeterminação de género e centra-se efetivamente naquilo que é um critério específico, que é o acesso das pessoas entre os 16 e os 18 anos à lei".

No texto que sustenta o veto, divulgado na quarta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa pede ao parlamento que pondere incluir um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil até aos 18 anos.

"O Bloco considera que introduzir um relatório médico nessa fase, para um ato meramente civil, é não compreender aquilo que a lei pretende e não compreender que é um ato meramente civil, que não envolve cirurgias ou tratamentos irreversíveis", criticou a deputada, considerando não fazer sentido a sugestão do Presidente.

De acordo com Sandra Cunha, "o BE está disponível para, no parlamento, se encontrar a melhor solução para se aprovar a lei e para que esta lei vingue em toda a sua plenitude".

Iremos ver com os outros grupos parlamentares que apoiam esta proposta a melhor solução para termos um desfecho positivo para todos, maiores e menores de 18 anos", garantiu.

Questionada pelos jornalistas sobre se há abertura, da parte dos outros partidos que viabilizaram a lei, para a confirmar e devolver ao Presidente da República, a deputada começou por explicar que bloquistas ainda não falaram "diretamente com os outros partidos".

Poderá haver qualquer outro tipo de solução que vá ao encontro ou responda às preocupações do Presidente da República, mas não vos posso avançar qual é porque é algo que ainda temos que conversar, especialmente com as pessoas trans, os jovens e as famílias e tentar encontrar a melhor solução possível", adiantou.

Aqueles que são proponentes também e que tiveram proposta e iniciativa, já houve declarações de que existe essa abertura para confirmar a lei. De que forma é que ela será feita é o que ainda temos de ver e temos que conversar para encontrar a melhor solução", respondeu apenas.

PAN defende que parlamento tem de garantir autodeterminação das pessoas trans

O PAN defendeu hoje que o veto presidencial da lei que permitia a mudança de sexo no registo civil aos 16 anos "reforça a importância de a Assembleia da República trabalhar para garantir a autodeterminação das pessoas trans, independentemente da sua idade".

Esta questão da validação do Presidente da República no que toca à autodeterminação para maiores de 18 anos é por si só um avanço do ponto de vista do partido e um dado positivo a salientar", refere o partido Pessoas Animais e Natureza.

O PAN considera haver "condições para continuar a separar a esfera clínica da legal também no caso das pessoas trans menores de 18 anos, como foi determinado por meses de trabalho e audições parlamentares, nas quais pessoas trans, especialistas, ativistas e Organizações Não Governamentais nacionais e internacionais da área dos Direitos Humanos alertaram para a importância destas alterações".

O Partido irá analisar detalhadamente os fundamentos deste veto e trabalhar internamente e com os restantes partidos para garantir a reconfirmação da proposta da Assembleia da República", refere o texto, destacando "a importância de a posição do Presidente da República ser também favorável à proteção das características sexuais das crianças e jovens intersexo".

Certo é que os jovens e as jovens trans sabem quem são e não podem continuar a estar dependentes de relatórios médicos e de todas as barreiras que daí advêm para uma simples alteração do nome e sexo legal no registo civil. Não desistiremos de trabalhar até ao fim para garantir os seus Direitos Humanos e Fundamentais”, refere ainda o comunicado, citando declarações de André Silva, deputado único do PAN.

PCP "disponível"

Já a deputada comunista Rita Rato declarou que o PCP está "disponível" para "encontrar soluções" quanto à legislação vetada pelo Presidente da República sobre a autodeterminação do género no registo civil a partir dos 16 anos de idade.

O Presidente da República decidiu usar um poder seu e vetar a proposta de lei de autodeterminação de género. Agora, caberá ao parlamento discutir os fundamentos e encontrar soluções. O PCP, obviamente, estará disponível para esse trabalho", afirmou, na Assembleia da República.

Marcelo Rebelo de Sousa enviou uma mensagem à Assembleia da República em que solicita que se pondere a inclusão de relatório médico prévio à decisão sobre a identidade de género antes dos 18 anos de idade.

O PCP acompanhou um princípio geral que entendemos que é profundamente positivo, de despatologização destas matérias. A isso está obrigatoriamente associado o afastamento do relatório clínico quando se trata de uma matéria do registo civil. Tudo o que é um processo clínico terá, necessariamente, de ter um acompanhamento médico. Uma alteração no registo civil não tem de ter um relatório médico. É a separação das duas esferas", ressalvou Rita Rato.

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