PS acusa Núncio de “ocultação deliberada” das estatísticas - TVI

PS acusa Núncio de “ocultação deliberada” das estatísticas

Offshore: as explicações de Paulo Núncio, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais

Deputado Eurico Brilhante Dias associa a não publicação das transferências para offshore ao RERT III, o regime que permite regularizar património fora de Portugal, que foi publicado em 2012. Sugere, também, o envolvimento de Vítor Gaspar na decisão

"Como pode a partir das suas dúvidas fazer uma ocultação deliberada das estatísticas?". À pergunta em tom duro de acusação do PS, o antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do anterior Governo PSD/CDS-PP, Paulo Núncio, recusou o adjetivo, embora tenha assumido que optou por não publicar as transferências para offshore por ter tido "dúvidas".

Não fiz ocultação deliberada. Entendi que poderiam num determinado sentido beneficiar os infratores. Já assumi a responsabilidade política pela não divulgação de estatísticas e assumi-a de uma forma clara e frontal".

Confrontado pelo deputado socialista Eurico Brilhante Dias, Núncio confirmou que pediu a reformulação dos dados em 2011 e que essa reformulação foi apresentada pela Autoridade Tributária ainda nesse ano. A resposta do seu gabinete só foi dada em 2015, ou seja, quatro anos depois, com o governante a relativizar o horizonte temporal. 

De facto a resposta ocorreu mais tarde mas ocorreu mais tarde porque foi tomada a decisão de não divulgar as estatísticas. Isso não significa, para que não haja dúvidas, que haja qualquer tipo de relação entre a não publicação de estatísticas com a ação da inspeção tributária no controlo das transferências para paraísos fiscais".

Também as respostas às perguntas do PCP, na altura, tardaram em chegar. O PS lembrou que foi o chefe de gabinete de Vítor Gaspar que respondeu a uma questão dos comunistas sobre esta matéria, sugerindo, assim, o envolvimento do ministro das Finanças daquela altura nesta matéria.

Há uma centralização no gabinete do respetivo ministro, mas as respostas são dadas pelos gabinetes dos respetivos secretários de Estado. A resposta foi dada pelo meu gabinete e o gabinete do ministro na altura apenas interferiu para transmitir a pergunta aos serviços do Parlamento. A questão subjacente foi decidida pelo meu gabinete"

Se a resposta foi validade, Eurico Brilhante Dias conclui que era "obrigação" do gabinete do ministro conhecer conteúdo da resposta. Núncio quis rematar o assunto: “Centralizava e enviava e não posso concluir mais”.

O PS ainda associou a decisão de não publicar ao RERT III, aprovado no Orçamento do Estado para 2012. O RERT é, recorde-se, um regime que permite regularizar património localizado fora de Portugal, nomeadamente vindo de paraísos fiscais. Algo que o ex-governante recusou.

"Dois pesos, duas medidas"

O que conclui o PS? Que Paulo Núncio já deu três versões sobre esta polémica. "Estamos há uma semana neste caso. Primeiro era a Autoridade Tributária, depois a responsabilidade era sua, agora diz que a ocultação foi deliberada".

"O assunto é um assunto grave, governo castigou os portugueses com aumentos de impostos e cortes de salários. O senhor não acompanhou fluxos fundamentais. O Governo de que fez parte não fez o seu trabalho", atirou Eurico Brilhante Dias. Perante estas acusações, Paulo Núncio tentou virar o tabuleiro para apontar o dedo ao PS.

É curioso que seja o PS a levantar esta questão dos dois pesos e duas medidas. Trata-se de um discurso absolutamente demagógico, principalmente vindo de um partido que retirou três paraísos fiscais da lista de offshore. Significa que o PS deliberadamente tirou estes paraísos fiscais do controlo da AT, com transferências de 1.800 milhões para esses paraísos fiscais".

Para além de Paulo Núncio, também o atual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Rocha Andrade, será ouvido hoje no Parlamento, sendo que Paulo Núncio será entrevistado, logo à noite, no Jornal das 8 da TVI.

Certezas (ou meias certezas)

O BE constatou que esta é a primeira vez que Núncio refere as suas "dúvidas", desde que a polémica começou. "Se as dúvidas eram tão fundadas por que não se lembrou delas quando foi questionado?", perguntou Mariana Mortágua. O  ex-governante respondeu que, na altura, entendeu que defendeu o interesse público.

A bloquista confrontou-o também com as suas primeiras declarações sobre este caso, em que o centrista afirmou que a divulgação das estatísticas era independente da sua autorização. "Sabia ou não que a AT tinha obrigação de divulgar estatísticas sobre transferências para offshore?", perguntou Mariana Mortágua.

"Entendo que a decisão que me foi apresentada não mereceu um despacho afirmativo da minha parte e considero legítimo que a AT não tenha publicado estatísticas". A obrigação do Fisco era, lembrou, apresentar informação ao seu gabinete e que, por isso, considera legítima a posição da AT perante o despacho. Seja como for, relembrou que "não existe obrigação legal" de tornar essa informação pública.

Só depois de ter visto o processo é que concluí que a AT não estava obrigada a divulgar a informação e que a AT não tinha a responsabilidade de divulgação. A responsabilidade era minha".

Questionado, novamente, sobre se algum membro do Governo sabia das suas dúvidas e da sua decisão de não publicar, a resposta foi vaga. "Não sei". Antes, tinha admito apenas conversas com Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque "sobre as questões em geral do combate à evasão fiscal".

A deputada do Bloco de Esquerda só conseguiu concluir que "a grande ironia desta discussão é como é que nunca teve curiosidade para conhecer um número". "O que é impressionante é que o único facto que trouxe aqui é que não tinha conhecimento das transferências e que só tem conhecimento porque elas foram publicadas. É provavelmente a grande ironia que temos aqui hoje. Não conhecia e hoje acha muito relevante".

Acompanhe aqui as audições 

 

Continue a ler esta notícia