Eutanásia: "Referendar os direitos de todos é pôr os direitos nas mãos de alguns” - TVI

Eutanásia: "Referendar os direitos de todos é pôr os direitos nas mãos de alguns”

O Parlamento discutiu, esta quinta-feira, um referendo para a despenalização da eutanásia, que chegou à Assembleia da República em junho, através de uma iniciativa popular da Federação Pela Vida. Os argumentos daqueles que são contra apontam, essencialmente, em duas direções: é ao Parlamento que cabe o dever, mas sobretudo a legitimidade, de lesgislar sobre direitos fundamentais; e a pergunta formulada no referendo é tendenciosa, fomenta o horror e foi elaborada de forma a obter a resposta 'certa'

O Parlamento discute, esta quinta-feira, um referendo para a despenalização da eutanásia, que chegou a Assembleia da República em junho, através de uma iniciativa popular da Federação Pela Vida. Iniciativa essa que, à partida, tem um "não" maioritário que a deve fazer "chumbar" nas votações de sexta-feira. 

Os argumentos daqueles que são contra apontam, essencialmente, em duas direções: é ao Parlamento que cabe o dever, mas sobretudo a legitimidade, de lesgislar sobre direitos fundamentais; e a pergunta formulada no referendo é tendenciosa, fomenta o horror e foi elaborada de forma a obter a resposta 'certa'. Foram ainda feitas duras críticas aos peticionistas.

PSD: “A vida não é preta e branca. A vida não é sim ou não”

Ao grupo parlamentar do PSD foi dada liberdade de voto, precisamente por não existir um consenso nesta matéria. Mónica Quintela, pertence ao grupo dos que não estão de acordo com o referendo, por considerar que “os direitos, liberdades e garantias não são referendáveis" e que o Parlamento "é a sede própria para legislar sobre direitos fundamentais”.

Referiu que cada pessoa deve ter a liberdade de escolher se quer continuar ou não a sofrer, alegando que "os direitos humanos são inatos, invioláveis e inalienáveis. Estão intrinsecamente ligados ao seu titular e conferem dignidade à pessoa humana”.

É fácil opinar sobre as circunstâncias da vida dos outros e o que devem ou não fazer. Mas o conforto das nossas consciências não pode ter como contraponto o desespero que a imposição da nossa vontade causa ao outro” . 

Reforçou, com um ciatção de Francisco Sá Carneiro, de que a "verdadeira democracia" tem a obrigação de respeitar as convicções dos cidadãos e, por isso mesmo, os deputados eleitos pelos portugueses conferem à Assembleia da República essa "total legitimidade para o fazer"

Mónica Quintela criticou a forma como a pergunta do referendo está formulada, por induzir as pessoas em erro. Lembrou que foram aprovados cinco projetos na generalidade em fevereiro e que essa decisão não gerou qualquer polémica na sociedade.

A vida não é preta e branca. A vida não é sim ou não”, concluiu. 

PS: “Os peticionários são de uma enorme franqueza"

A dar a cara pelo Partido Socialista, Isabel Moreira começou por saudar, ironicamente, os peticionistas, por avançarem com uma iniciativa à qual são, naturalmente, contra. Acusa, assim, a Federação Pela Vida de se mover por um único objetivo: paralisar o Parlamento. 

Os peticionários são de uma enorme franqueza. Na legislatura passada, quando debatemos a despenalização da eutanásia, não só não propuseram o referendo, como o recusaram. Apresentam-se, assim, com a legitimidade de uma tática para paralisar o Parlamento”, afirmou. 

Defende que a decisão final é sempre do doente e que estes não devem ser "referendados"

Lembra que a Assembleia da República é a casa do povo e não um “corredor” fechado e que cada deputado foi eleito para representar a vontade dos portugueses.

Quanto à pergunta que consta do documento, Isabel Moreira adjetivou-a como "um horror".

Emotiva, lembrou o exemplo de Luís Marques, de 62 anos, paraplégico há 55, que foi morrer à Suíça, por a “sua autodeterminação” ser "crime em Portugal".

A escolha de Luís, as escolhas das pessoas que conhecemos e que não divulgamos, a escolha inalienável sobre a minha morte em circunstâncias pessoalíssimas pode depender de uma consulta popular? Em nome de quem escolheu, em nome de quem quer escolher, dizemos não, não vos referendamos”, disse.

PAN: “A morte medicamente assistida não é um homicídio”

Bebiana Cunha, deputada PAN, começou por explicar que o partido Pessoas-Animais-Natureza é a favor de um referendo, mas não com as motivações deste que chegou à Assembleia da República em junho. 

Este pedido de referendo, parece-nos, está a ser usado como último reduto de quem quer, a todo o custo, travar uma matéria tão fundamental e basilar como o alargamento da autonomia e da autodeterminação das pessoas”.

 

A forma como esta questão está colocada desde logo é muito questionável. Encontra-se imbuída e intencionalmente indutora de julgamento moral e tem um propósito político muito claro e que muito nos preocupa. Procura retirar da discussão aquilo que é de facto essencial", acrescentou. 

A deputada referiu que o foco deste referendo foge ao essencial e que a pergunta formulada é "desconhecedora da complexidade desta matéria".

A morte medicamente assistida não é um homicídio”.

BE: “Referendar os direitos de todos é pôr os direitos nas mãos de alguns”

Na mesma linha de Isabel Moreira, José Manuel Pureza usou do sarcasmo para 'elogiar' a franqueza e sinceridade dos peticionistas que, na sua ótica, se movem contra uma maioria parlamentar e não pelo respeito pelo povo. 

Os promotores da iniciativa de referendo são, por princípio, contra o referendo que propõem. Repudiam-no. Mas num arroubo de sinceridade, dizem que o referendo é um recurso, um expediente, algo a que recorrem como o único objetivo de barrar o caminho ao Parlamento e travar uma lei que despenalize a morte assistida. Louvo-lhes, portanto, a franqueza.”

 

O bloquista disse ainda que o debate sobre esta iniciativa popular tem de ser feito de duas formas: assumir esta iniciativa pelo seu valor fácil ou discutir "os propósitos efetivos dos seus promotores"

Criticou o facto de ser não ser o respeito pelo povo que move esta associação, mas sim um propósito “puramente instrumental” contra a maioria parlamentar que representa o povo e que, em fevereiro, aprovou cinco projetos parlamentares. 

Só uma lei do Parlamento pode regular com rigor e prudência, com determinação e sageza, uma situação tão delicada quanto a da morte assistida”. 

Quanto à pergunta, acusou-a de ser "pouco séria", como uma "habilidosa via de sentido único, para obter a resposta pretendida”.

Referendar os direitos de todos é pôr os direitos nas mãos de alguns”, concluiu. 

PEV: “Não existe o dever ou a obrigação de viver”

"Os Verdes" também são um dos partidos contra o referendo. José Luís Ferreira admitiu ter muitas dúvidas e reservas sobre a real motivação dos promotores desta iniciativa popular.

Aquilo que se pretende não é tanto o referendo em si, mas sim a inviabilização do processo legislativo que está a correr”, criticando o sentido de oportunidade do surgimento desta iniciativa, uma vez que só avançou depois do processo legislativo já estar em andamento.

 

 

O real objetivo deste referendo é tão só perturbar ou até impedir o andamento do processo legislativo que está a correr nesta Assembleia”.

O PEV entende que a Assembleia da República tem todas as condições tanto do ponto de vista do "enquadramento institucional, como da sua legitimidade" para ter em mãos um "processo legislativo tão complexo e tão sensível como é a despenalização da morte medicamente assistida”

Alega que "não existe o dever ou a obrigação de viver” e, por todas as razões anunciadas, "Os Verdes votam contra a realização de um referendo"

PCP: “Nenhum de nós receia morrer porque todos sabemos que morreremos um dia" 

António Filipe começou por lembrar que o PCP votou contra os projetos de lei aprovados na generalidade sobre esta matéria e que, numa espécia de concordância, o partido vai votar contra o referendo.

O grupo parlamentar do PCP não acompanha a iniciativa do grupo de cidadãos para a realização de um referendo sobre a eutanásia”.

 

Defende que o Parlamento tem toda a legitimidade para decidir a despenalização da eutanásia e que "nenhum de nós receia morrer porque todos sabemos que morreremos um dia, mas todos receamos o sofrimento que pode proceder a morte"

A Assembleia da República tem em curso o debate da despenalização da morte medicamente assistida, que, para se tornar uma lei, necessita de ser votada na especialidade e em votação final global e, depois, promulgada pelo Presidente da República.

À direita, o CDS e o Chega são contra a lei e, à esquerda, o PCP também. No PSD e PS há divisões.

Os diplomas preveem, nomeadamente, que só possam pedir a morte medicamente assistida, através de um médico, pessoas maiores de 18 anos, sem problemas ou doenças mentais, em situação de sofrimento e com doença incurável.

Esta iniciativa do referendo só teria impacto neste segundo processo caso fosse aprovado; não sendo, este segue o seu caminho normal. 

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