Francisco Conceição apontado ao clássico: por que saiu do Sporting? - TVI

Francisco Conceição apontado ao clássico: por que saiu do Sporting?

Francisco Conceição

É o nome do momento no Dragão e um nome com forte ligação aos leões. Maisfutebol viaja até janeiro de 2012 e ao momento em que tudo começa a sério (em Lisboa) para o esquerdino do FC Porto. «O Sporting acreditava muito nele»

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Há retratos que resumem carreiras. Pensamos no nome e a imagem sai. Instintiva. Zidane? Lá está o pontapé em vólei na final da Champions. Ronaldo 'Fenómeno'? Arrancada e golo contra o Compostela. D10S Maradona? O 'Golo do Século' na cara de ingleses. Van Basten? O pontapé de ângulo impossível à URSS de Dasaev. A eternidade escreve-se assim.

Francisco Conceição. Não há engano. Francisco Conceição. A responsabilidade de surgir imediatamente a seguir a um parágrafo só para imortais é injusta. Não é esse o objetivo. O objetivo é partir dos retratos que compõem a curta carreira sénior do esquerdino do FC Porto – o penálti ganho contra o Boavista, o golo festejado num abraço ao pai e anulado pelo VAR, o penálti sofrido nos Barreiros – e daí desenhar uma imagem mais completa. Devidamente enquadrada.

E nada melhor do que o fazer a três dias do FC Porto-Sporting. Porquê? Poucos saberão, mas Francisco jogou de leão ao peito durante seis temporadas. De 2011 a 2017, das escolinhas (benjamins) aos iniciados, colega de Nuno Mendes, Tiago Tomás, Eduardo Quaresma e Joelson, leõezinhos integrados no plantel de Rúben Amorim.

Todos falam dele. Como se dele dependesse o futuro imediato do FC Porto. Não depende. Mas todos querem saber mais dele. Como começou no futebol, o que conseguiu de leão ao peito, por que saiu do Sporting e foi para os dragões?

Venha daí saber mais sobre o menino que promete agitar o clássico do próximo sábado.

Francisco (ao meio) e Eduardo Quaresma (à esquerda) nos infantis do Sporting

«O Sporting acreditava muito no Francisco Conceição»

Janeiro de 2012, ano novo e vida nova para a família Conceição. Daúto Faquirá é demitido do Olhanense e o presidente Isidoro Sousa decide apostar em Sérgio Conceição. É o regresso do antigo internacional português ao nosso futebol, após um ano integrado na equipa técnica do Standard Liège. Sérgio volta, a família vem atrás e fica instalada na zona de Lisboa.

O filho Sérgio começa a jogar no CIF. Moisés e Rodrigo inscrevem-se no Belenenses, o pequeno Francisco acompanha estes dois irmãos. Treina algumas semanas no Restelo, mas o talento já é demasiado evidente e o Sporting convida-o a juntar-se aos benjamins.

Faz meia época na estreia e na época seguinte, 2012/2013, é treinado por João Plantier. O treinador mantém uma ligação forte ao antigo pupilo, como conta ao Maisfutebol.

«Conheci-o ainda antes de ter dez anos. Fora do campo era tranquilo, observador, mas lá dentro já era muito irreverente. Falei com ele há poucos dias e disse-lhe que continuava a ser o menino que nos deu em 2013 o título de campeão distrital da AF Lisboa.»

Francisco foi decisivo no título distrital dos benjamins do Sporting em 2013

João Plantier refere-se a um momento que pode ser considerado uma réplica menos famosa do memorável abraço de Francisco ao pai, após o tal golo que não foi golo no dérbi da Invicta.

Nesse jogo de 2013, ainda em futebol de sete, o Francisco saiu do jogo uns minutos e estava a descansar no banco. O jogo estava empatado e o nosso enfermeiro foi ter com ele e disse-lhe isto: ‘Chico, vais voltar a entrar e vais ser tu a resolver isto’. Assim foi. Entrou, fez o golo e veio dar um abraço emocionado ao enfermeiro. O abraço ao pai fez-me lembrar isso», recorda João Plantier, atual coordenador da NF Academy.

O antigo treinador diz, de resto, que o ADN de Francisco continua exatamente igual. Mesmo num contexto de alta pressão: a exigência de ser campeão nacional, a exigência de ser filho do treinador. O extremo não treme e João Plantier garante não estar surpreendido.

«Mentalmente sempre foi muito forte. Não tem e nunca teve medo de ter a bola e assumir o risco. E não é fácil manter esta coragem durante toda a formação, porque alguns treinadores limitam-na. Felizmente, o Francisco entende bem o jogo e não tem receio de arriscar ou de entregar a alguém que está melhor colocado quando é preciso. É um desequilibrador nato, muda facilmente de trajetória e é extremamente agressivo a defender e a atacar.»

Nesses seis anos de verde e branco, e apesar de «alguns altos e baixos naturais», Francisco impõe «naturalmente» o talento. «O Sporting acreditava muito no Francisco», assegura João Plantier. «Ele destacou-se em todos os escalões e não tenho dúvida nenhuma de que a estrutura sabia bem o potencial que tinha em mãos. Não acompanhei o processo de saída, mas a parte familiar terá sido decisiva. E o Sporting respeitou essa decisão do Francisco.»

«O Francisco estava muito contente com a saída para o FC Porto»

Verão de 2017. Sérgio Conceição é nomeado treinador do FC Porto e Francisco abandona o Sporting. Uma decisão influencia a outra, revela Luís Dias, antigo coordenador da formação dos leões, ao Maisfutebol.

O pai foi para o FC Porto e ele quis ficar perto da família. Então pediu para sair, para poder juntar-se ao pai no FC Porto. O Francisco era o filho mais novo e foi sempre muito ligado à família, sobretudo à mãe, por isso queria estar perto de casa. Além disso ele depois teve um irmão mais novo e quis também estar perto do bebé e vê-lo crescer.»

João Cortez é, por esses dias, um dos dois amigos mais próximos de Francisco Conceição nos iniciados do Sporting – o outro era Miguel Ventura, colega de quarto, agora jogador da Académica de Coimbra.

Francisco de leão ao peito

Por coincidência, João e Francisco abandonam o Sporting ao mesmo tempo. «O Francisco foi fundamental para mim. Eu sou de Santa Cruz, vivia na casa de uma tia minha perto de Alcochete, mas passava grande parte do tempo livre com ele», diz ao nosso jornal. «Andávamos na mesma escola, jogávamos na mesma equipa, criámos uma grande amizade. Tive muita pena da saída dele. Eu saí na mesma altura para o Sacavenense e o Francisco foi para o FC Porto. Lembro-me de que estava muito contente, era o que ele mais queria.»

A família. A família, acima de tudo. Francisco cria uma ligação forte com o Sporting, mas só no último ano de ligação ao clube (2016/17) sai de casa para viver em Alcochete. Durante grande parte da ligação, o jogador acompanha o percurso desportivo do pai: depois de Olhão, Coimbra, Braga e Guimarães.

«Estava sempre com a família durante a semana e vinha apenas jogar ao Sporting ao fim de semana», confirma Luís Dias, ex-coordenador leonino, revelando mais um episódio capaz de resumir bem este vínculo inquebrável entre os Conceição.

«Lembro-me do Torneio da Pontinha. Nessa altura foi quando nasceu o irmão mais novo. Durante o torneio recebeu a notícia que a mãe estava em trabalho de parto e foi muito giro partilhar a alegria dele, estava eufórico, ia deixar de ser o bebé lá de casa.»

E há mais. «A mãe estava presente sempre que possível e a avó chegava a vir de Coimbra para o ver jogar no Estádio Universitário em Lisboa. Isto diz muito do cariz da família, sempre foram muito ligados. O Francisco estava em Olhão com os pais, vinha a Lisboa ao fim de semana jogar e a avó vinha de Coimbra para o ver. Encontravam-se todos a meio do caminho e estavam juntos naquele bocado de tempo.»

«Estávamos a jogar e o Francisco perguntava o resultado da equipa do pai»

Sérgio Conceição, garantem João Plantier e Luís Dias, é sempre um dos pais «mais discretos na bancada», apesar de ser também um dos mais assíduos. Raramente falha um jogo do filho.

«O pai esteve sempre muito presente. Quando não tinha jogo do Olhanense, o Sérgio ia ver o jogo e foi sempre uma pessoa extremamente correta», sublinha Plantier. «Não fazia comentários, nada. No final dos jogos falávamos com os pais dos miúdos que não viviam em Lisboa, e que ainda tinham uma viagem pela frente, e o Sérgio Conceição foi sempre bastante reservado e muito simpático.»

«Percebia-se que a ligação entre pai e filho era muito forte», continua o antigo treinador de Francisco. «Lembro-me, aliás, de estar nos jogos e de ouvi-lo a perguntar muitas vezes quanto estava o Olhanense, nos dias em que jogávamos ao mesmo tempo. ‘Vá, Francisco, não penses agora nisso, foca-te no teu jogo’. Ele tinha uma preocupação enorme com o pai e o sucesso do pai.»

Francisco era o número 10 nos iniciados do Sporting

Sérgio Conceição arranja sempre um bocadinho da sua agenda para espreitar o filho. Luís Dias relata outros dois episódios elucidativos.

«O Francisco era sub-12 e, por altura do Carnaval, fizemos um torneio aqui em Lisboa. O Sérgio Conceição teve folga e a família veio toda ver o Francisco ao Bairro da Boavista, perto do Casa Pia. Recordo-me também do Sérgio, ainda enquanto treinador do Sp. Braga, estar em estágio num hotel perto do Estádio Universitário e sair para dar um passeio com os adjuntos, mas no fundo o que ele foi fazer foi ver o filho jogar.»

O amor de pai e o amor de filho não permitem desilusões. Sérgio nunca quer desiludir Francisco e o contrário também se aplica. Principalmente se o palco tiver o nome do progenitor: Estádio Sérgio Conceição, em Taveiro, arredores de Coimbra.

«Estivemos lá num torneio e o Francisco estava doente», confidencia João Plantier. «O Sérgio até estava lá a ver os nossos jogos. Eu disse ao Francisco que podia ir para casa, que não havia problema nenhum, mas o Francisco recusou. ‘Quero ficar e ajudar, mister’. Não jogou como sabia, porque estava limitado, e senti-o triste por isso. Mas a verdade é que esteve connosco até ao fim. Mesmo doente. Essa resiliência é uma marca forte nele.»

«Perdemos e o Francisco foi para o quarto completamente passado»

Já se falou da entrada no Sporting, dos motivos da saída para o FC Porto, da profunda conexão entre pai e filho, mas falta falar de Francisco. Não do jogador ou, pelo menos, não só do jogador. Como é o adolescente quase adulto Francisco, há algum traço do pai na personalidade do esquerdino?

«É igualzinho ao pai. Muito emocional e com muito bom coração», responde, de pronto e com uma gargalhada à mistura, o amigo João Cortez, atual futebolista do Lourinhanense. «É uma pessoa excelente. Muito focado, viciado em ganhar, é competitivo. Tem uma personalidade forte. Recordo-me de um jogo que perdemos, em que ele ficou fulo. Fomos para o quarto dele a seguir e o Francisco estava completamente passado, enervado com tudo.»

«É um miúdo com uma garra e uma paixão enorme pelo jogo», confirma Luís Dias. «Apesar de ser jovem, já falava de futebol como um adulto. Não só por causa da vivência do pai, mas também por causa dos irmãos. Ele encarava a competição, apesar de ser infantil ou iniciado, de uma forma adulta, tinha uma cultura futebolística de um sénior. E depois tem um talento invulgar. Sempre teve.»

João Cortez, estudante de Desporto na faculdade de Rio Maior, fala «com saudade» do amigo «brincalhão, bem disposto» fora do futebol e «totalmente diferente» com a bola nos pés. «Só lhe peço para ser a pessoa que sempre foi e espero ainda voltar a ser companheiro de equipa dele», sublinha o ex-médio do Sporting e «sportinguista nada fanático». «No sábado espero que o Francisco jogue, que marque um golo e que perca no final.»

Para sempre ficam as memórias de um esquerdino «demolidor» na relva e de um camarada «com grande sentido de humor». «Andávamos sempre com o Miguel [Ventura], um rapaz açoriano, muito engraçado. Não faltava brincadeira. Lembro-me de uma: um de nós contava uma piada e os outros dois tinham de encher a boca com água, para ver quem aguentava mais tempo sem se rir.»

A água a rebentar dentro da boca, as gargalhadas nos quartos da academia de Alcochete, as brincadeiras saudáveis com João Cortez e Miguel Ventura. Retratos de um baixinho que começa a saber o que é ser grande. Não é Zidane, não é Van Basten, tão pouco Ronaldo Fenómeno ou D10S, mas já é bem capaz de deixar uma impressão digital no FC Porto-Sporting.

Para confirmar no sábado, às 20h30, a partir do Estádio do Dragão e AQUI no Maisfutebol.

FOTOS gentilmente cedidas por Luís Dias, João Plantier e João Cortez

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