Pela mão de Klopp: o treinador português do Borussia Dortmund - TVI

Pela mão de Klopp: o treinador português do Borussia Dortmund

Miguel Moreira (Borussia Dortmund)

Miguel Moreira é treinador adjunto dos sub-19 do adversário do FC Porto. Aconselhou a contratação de Ruben Neves depois de o ver jogar na seleção sub-17

*Com Pedro Jorge da Cunha

«Só por curiosidade, como chegaram até mim?» A pergunta, feita entre risos, é o remate na conversa com Miguel Moreira, treinador adjunto dos sub-19 do Borussia Dortmund. E não é, de todo, uma pergunta descabida. Afinal, quantos portugueses sabiam que há um compatriota na estrutura do adversário do FC Porto na Liga Europa?

É por isso que, bem antes dessa questão já na fase de despedida, a conversa com Miguel Moreira tem um ponto de partida obrigatório. Afinal, estamos a falar com quem?

«Tenho 32 anos e já nasci em Dortmund. Os meus pais emigraram nos anos 70, eram de Pardieiros, concelho de Carregal do Sal, perto de Viseu. Nasci cá e morei aqui a minha vida toda», confessa. Mesmo tendo nacionalidade portuguesa, nunca morou em solo lusitano. Pela forma de falar ninguém diria. O português é perfeito.

Isso também tem explicação. Miguel Moreira teve aulas de português desde a escola primária. Conta, de resto, que era prática comum entre emigrantes lusos no passado, mesmo que acarretasse sacrifício pessoal.

«Antigamente a comunidade portuguesa de Dortmund era muito maior e havia uma vontade muito grande em que o português tivesse implementação. Para ter uma ideia, tinha uma escola muito mais perto de minha casa mas fui para outra para ter aulas de português. Havia quem fizesse uma hora e meia de comboio todos os dias para ir para uma escola onde pudesse aprender português. Hoje já ninguém faz isso e o português até está a desaparecer das escolas», lamenta nesta conversa com o Maisfutebol.

Dortmund está a perder portugueses e a língua também deixa de aparecer tanto. Miguel Moreira confessa a sua parte da ‘culpa’: «Casei com uma alemã, tenho uma filha de três meses. Já pouco se fala português. Só com os amigos.»

A conversa em torno das raízes e da língua é o ponto de partida. Venha, então, o futebol. Que surgiu desde cedo na vida de Miguel Moreira mesmo que numa expressão diferente da que hoje ocupa.

«Joguei futebol desde os 6 anos até aos 30, em clubes amadores. No máximo cheguei à 5ª Divisão alemã. Nunca deu para mais (risos). Quando era mais novo, com 12 anos, ainda estive perto de chegar ao Borussia Dortmund, mas acabou por não acontecer. Fui chamado à seleção de Dortmund mas depois as coisas não avançaram», recorda.

Seguiu outro rumo profissional, tirando um curso de fisioterapia, profissão que ainda hoje exerce. O futebol foi sempre um caminho que traçou em paralelo. Até que um dia Jurgen Klopp ajudou a mudar-lhe a vida.

«Indiretamente, entrei no Dortmund pela mão do Klopp»

Miguel Moreira jogava no ASC 09 Dortmund. O treinador dessa equipa era jovem e também jogava. «Era o Hannes Wolf. Fazia dupla atacante comigo», conta.

O bom trabalho fez com que a equipa fosse nomeada para melhor equipa da cidade. «Na Gala onde iriam ser atribuídos os prémios estava também o Jurgen Klopp, que estava no primeiro ano do Dortmund», conta.

«Não sei porquê mas ele achou graça ao Hannes e acabou por convidá-lo para treinar nas camadas jovens do Dortmund. Ele foi, eu fiquei, mas continuamos amigos. Só que depois o adjunto dele mudou-se para outra equipa e ele convidou-me para o substituir. Estou lá há três anos. Indiretamente, entrei no Dortmund pela mão do Klopp», acrescenta entre risos.

Miguel Moreira (esquerda) e Hannes Wolf (Foto do jornal Ruhrnachrichten.de cedida por Miguel Moreia)

Esta é a terceira temporada na estrutura do clube e a primeira nos sub-19. Esteve dois anos nos sub-17 com intenso sucesso: campeão nacional em ambos. O objetivo é chegar ao título também neste escalão.

E a relação com Klopp, como era?

«Falei várias vezes com ele, claro, mas não posso dizer que tenho grandes histórias. Estive dois anos com ele no Dortmund, tivemos acesso aos treinos dos profissionais. É uma pessoa sempre bem disposta, como deixa transparecer. E gosta de ensinar: o meu colega foi com ele para estágio já no Borussia e naquela altura ele era um miúdo, nem 30 anos tinha. Aprendeu muito com ele e podemos dizer que parte dos nossos treinos de hoje vêm da escola do Klopp.»

Neste primeiro ano sem Klopp conheceu, então Thomas Tuchel, o atual treinador do Dortmund. «É muito diferente. Os dois são muito focados no trabalho e no treino. O estilo depois não tem nada a ver», destaca.

E explica: «Até na forma de as equipas jogarem. Com o Klopp, o Borussia era sempre a equipa que mais corria nos jogos. Se o adversário fazia 100km eles faziam 110km. Era mais físico. O Tuchel é adepto do Guardiola, isso é público. É outro tipo de futebol. O Klopp ganhou dois campeonatos a apostar mais em ataque rápido e contra-ataque. Pegou em jovens que ninguém conhecia e fez deles vedetas. Colocou o Borussia a jogar a um nível muito alto, o que obrigou o Bayern Munique a gastar muito dinheiro para recuperar a supremacia.»

A «equipa do patrão» e a simpatia pelo «vermelho e branco»

Vamos então ao FC Porto-Dortmund, o mote de toda esta conversa. Miguel Moreira explica que não viu tanto quando gostaria do embate da primeira mão, porque tinha também jogo nesse dia, mas acha que o 2-0 é «um resultado confortável» para os alemães.

«Mas não está decidido. Aqui o FC Porto criou poucas oportunidades, mas lá vai ser diferente. Se o Borussia marcar no Dragão acho que passa, o FC Porto teria de marcar quatro. Mas se o FC Porto marcar cedo, por exemplo, fica tudo em aberto», salienta.

Acha que Sokratis vai fazer falta ao Dortmund porque Subotic vem de lesão e ainda não tem o ritmo ideal. O FC Porto pode aproveitar, embora também tenha as suas próprias dores de cabeça.

E de que lado estará Miguel? Confessa-nos, entre risos, que tem «uma certa simpatia por um clube que veste de vermelho e branco» em Portugal. Mas salienta de imediato: «Apoio sempre as equipas portuguesas. E, infelizmente, o FC Porto é a única equipa portuguesa que tem conseguido ter sucesso a nível internacional.»

«Em 2004 fui a Gelsenkirchen, não vi o jogo porque não tinha bilhete, mas estive lá junto ao estádio a festejar com os outros portugueses.Deste vez vou estar bastante dividido claro. É a cidade onde nasci e também a equipa do meu patrão (risos). Tenho de admitir que preferia que o Dortmund passasse, mas se passar o FC Porto não fico chateado», assegura.

O dia em que descobriu Ruben Neves no Algarve

Sobre a equipa do FC Porto, Miguel Moreira tem uma opinião que começa a ser generalizada por toda a Europa, de facto: «De ano para ano muda muito a equipa. Tudo o que é bom é logo vendido.»

Assume ser fã do futebol de Brahimi, mas depois faz um sublinhado especial: «Adoro o Ruben Neves».

Ruben Neves: em dez minutos convenceu Hannes Wolf

«Estive no Algarve num torneio internacional sub-17 como olheiro do Dortmund para um Portugal-Alemanha. Mal terminou o jogo peguei no telefone e liguei a avisar para aquele jogador. Disse logo que nunca vi ninguém daquela idade jogar com aquela maturidade. E também estava o Renato Sanches nesse jogo…», recorda.

Falou, então, com Hannes Wolff que quis ver pelos próprios olhos. «Foi a Malta ao Europeu Sub-17 para ver o Ruben Neves. Disse-me, depois, que só precisou de dez minutos para perceber que estava ali um talento», conta Miguel Moreira.

O interesse, contudo, não passou disso mesmo: «É muito complicado fazer uma transferência naquela idade. E depois não sei como fazem em Portugal mas os jogadores custam logo muitos milhões desde muito cedo…»

Mesmo sem Ruben Neves, as camadas jovens do Dortmund têm conseguido sucesso e vêm aí mais talentos. Miguel Moreira aponta dois nomes: «Um é o Christian Pulicic, que é médio, norte-americano, e acredito que possa até jogar no Dragão, mesmo que não seja titular. Outro é o Felix Passlack, também de 17 anos, que na nossa equipa é extremo direito mas pode jogar como lateral. Acho que vão ser os próximos jogadores a surgir. Não é fácil passar a profissional no Dortmund. Aqui, quem quer jogar na primeira equipa tem de ter logo nível de Champions. É mais fácil noutro clube.»

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