Como o Brasil passou da depressão à euforia e tem o Mundial à porta - TVI

Como o Brasil passou da depressão à euforia e tem o Mundial à porta

Brasil-Bolívia (Reuters)

O responsável tem nome e «nasceu» de um erro do último campeão planetário pela canarinha

O Brasil está diferente. Está mais Brasil, dir-se-ia. Alegre como Carnaval depois do luto provocado pelos 7-1 da Alemanha no Mineirão, durante o Mundial 2014, e prolongado pela eliminação na Copa América, frente ao Peru. A canarinha lidera a qualificação sul-americana para a Copa da Rússia, entrou numa sequência de vitórias e no país apontam o dedo ao responsável: Adenor Leonardo Bachi. Ou Tite.

«A chegada dele mudou, sim, a Seleção. (...) E o Tite me surpreendeu muito como treinador. É um dos treinadores mais bem preparados e um dos melhores com quem já trabalhei. Isso posso dizer apesar do pouco tempo que tenho com ele.», Neymar, in Globo

A alcunha do selecionador brasileiro é culpa de erro de um campeão mundial e vice-europeu: Luiz Felipe Scolari. O último técnico campeão do mundo pelo Brasil conheceu o novo pretendente em território gaúcho.

Felipão era professor e o colégio em que dava aulas jogou contra o Emílio Meyer onde jogava Adenor, com a camisola 10... e um Tite com a 8. Scolari gostou muito do 10, mas pensou que o nome dele fosse Tite. Depois, convenceu-o a ir para o Caxias do Sul e Adenor ficou Tite para sempre.

É esse o nome principal quando se fala na série de oito vitórias consecutivas do Brasil, sete delas na qualificação para o Mundial 2018. Desde que este novo formato entrou em ação, ninguém conseguiu fazer igual.

Nem a Argentina de Marcelo Bielsa, que na corrida para 2002 bateu o recorde de pontos da zona sul-americana: marca que o escrete pode ultrapassar, diga-se.

Quando Tite entrou, o apuramento parecia coisa de milagre. Agora, pode virar certeza já na próxima madrugada. O futebol da seleção mudou com o novo técnico, elogiado por todos, incluindo a sempre difícil imprensa brasileira. Este é, também, um dos segredos do sucesso brasileiro.

O adjunto explicou bem o que ia ser feito e como

Ao lado de Tite surge sempre Cléber Xavier. Antes do primeiro encontro de ambos com a canarinha, o adjunto do selecionador deu uma entrevista à ESPN, na qual explicou o que ia ser feito, e como, para desenvolver o futebol da seleção.

O título da publicação era «Corinthians de 2015 é um modelo de jogo para a seleção».

Não foi à toa que Cléber Xavier escolheu aquele Timão e preteriu, por exemplo, o Corinthians de 2012, vencedor da Libertadores e do Mundial de Clubes.

É porque Tite também mudou. A pausa que fez em 2014 trouxe-o a campos europeus. A estudar Barcelona, Bayern, Arsenal e Real Madrid. O Timão de 2015 era já a nova versão, não era mais a «empatite» com que eram conhecidas as estratégias e resultados do técnico, virado sobretudo para a consistência defensiva.

O Corinthians foi campeão brasileiro com 12 pontos sobre o Atlético Mineiro, teve o melhor ataque (71 golos) e a melhor defesa do Brasileirão em 2015.

A planta para o atual Brasil foi a mesma:

«De início a ideia é trabalhar dentro do modelo de jogo parecido com o que desenvolvemos no Corinthians em 2015. Usar o 4-1-4-1 mesmo. Ter a flutuação de um dos meias de lado para dentro, ter a posse da bola, triangulações, buscar infiltrações e usar bastante amplitude nas beiradas do campo. Na perda da bola buscar sempre o "perde e pressiona" rápido no setor. Se arrebenta e a bola sai da pressão, retorna e sustenta a marcação, principalmente na primeira linha de 4. A ideia de ter duas linhas de 4 com dois por dentro (4-4-2) e o 4-2-3-1 também são outras opções que podem aparecer no decorrer do trabalho.»

Cléber Xavier não se ficou apenas pela tática. Revelou ainda o que seria feito a nível do treino, apesar do pouco tempo que as seleções têm para estar concentradas. Por isso, há troca informação à distância com os convocados.

«Eles estão recebendo um material de vídeo com nossas ideias, com exemplos, situações vividas pela seleção, pelos próprios jogadores em seus clubes ou algo que a gente fez no Corinthians, para mostrar como as coisas eram feitas. (…) Também preparamos material de treinos, mostrando como serão os exercícios, para que eles mesmos também analisem. Por exemplo, antes do primeiro treino eles já saberão o que nós queremos, qual é o objetivo daquele treino, as movimentações...no segundo dia eles já recebem algo em cima do que foi feito no dia anterior. (…) Esses vídeos, que são bem didáticos na forma que vamos explicar os treinos, também devem acelerar esse processo, muito pelo nível de atletas que eles são.»

Se Dunga era a lua, Tite é o sol

Quando ficou sem treinar em 2014, a imprensa brasileira escreveu que Tite estava a preparar a sucessão de Scolari na seleção. A CBF, porém, optou por Dunga. Uma experiência repetida e criticada pelos principais opinion makers na imprensa brasileira.

Os maus resultados aliados à personalidade do capitão do Mundial de 1994 levaram ao eternizar de uma depressão futebolística, que vinha desde os tais 7-1 da Alemanha. Quando Dunga saiu, Tite reuniu-se nessa mesma noite com a direção da CBF e foi anunciado a 20 de junho. A lua deu lugar ao sol e o Brasil foi, outra vez, bem mais alegre fora de campo também. 

Tite é uma personagem mais alegre, mais condizente com os que os jogadores e o público esperam, conforme deu a entender Neymar.

«Tite mudou não o ambiente que tínhamos dentro antes, pois a Seleção sempre teve um bom ambiente. Mas acho que ele levou esse bom ambiente para fora, passou a ser externamente. Todo mundo está se sentindo mais leve.»

O ambiente após a conquista da medalha de ouro nos Jogos Olímpicos do Rio do Janeiro foi aproveitado por Tite, que continuou a «boa onda», e deu o sabor de glória ao craque do Barcelona, que, curiosamente, deixou de ser capitão do escrete.

Tite quis retirar-lhe pressão, distribuir responsabilidade e, com isso, ganhar também o grupo. A maturidade do maior astro do país também se sente no futebol canarinho e ainda no jogo com o Uruguai, o último, Neymar tratou apenas da bola e dos colegas. Deixou os adversários só com futebol, sem reações disparatadas.

Nas opções, o selecionador brasileiro não descartou ninguém, nem os que jogam no país, nem os que estão mais longe, incluindo quem foi jogar para a China. Paulinho fez um hat-trick com o Uruguai e é um dos titulares de um treinador com o qual trabalhou no Timão.

A defesa sofreu apenas dois golos: no Mundial 2014 o eixo era de David Luiz e Thiago Silva, agora é de Marquinhos e Miranda. No ataque, a grande novidade era a enorme promessa Gabriel Jesus que entretanto se lesionou.

Com oito jogos consecutivos a vencer, o Brasil pode qualificar-se já frente ao Paraguai, dependente dos resultados de Chile e Equador.

Com o bilhete para a Rússia, a canarinha pode depois concentrar-se em evoluir sem pressão e começar a ter outros testes de força: venceu Argentina e Uruguai nas eliminatórias para o Mundial, mas há dois anos, desde março de 2015, que não defronta uma equipa europeia.

Tite já fez passar a ideia que quer esse desafio, conforme deu conta a Globoesportes nesta segunda-feira. Um desafio a juntar a outro: a euforia crescente. Até Cafu já veio dizer que em 2018 «a taça do Mundial regressa a casa».

Foi em cenário idêntico que a Argentina de Bielsa, recordista na América do Sul com 43 pontos na qualificação, chegou ao Mundial da Coreia do Sul/Japão.

Veio embora ao fim de três jogos…

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