Ideias fixas e objetivos claros, mesmo sem Dzagoev - TVI

Ideias fixas e objetivos claros, mesmo sem Dzagoev

Rússia (LUSA)

O perfil da Rússia que integra o grupo B ao lado de Inglaterra, Gales e Eslováquia. Seleção tem tendência a facilitar em grupos acessíveis

A ‘Euro 2016 Network' reúne órgãos de comunicação social de vários pontos da Europa para lhe apresentar a melhor informação sobre as 24 seleções que vão disputar o Europeu de França. O Maisfutebol representa Portugal nesta iniciativa do prestigiado jornal Guardian. Leia os perfis completos das seleções que participarão no torneio:

Autor dos textos: Gosha Chernov

Parceiro oficial na Rússia: Sport Express

Revisão: João Tiago Figueiredo

Leonond Slutsky assumiu o cargo de selecionador da Rússia no último verão, depois de, finalmente, ter-se esgotado a paciência com Fabio Capello. Contudo, ele continuou ligado ao CSKA Moscovo e não teve, verdadeiramente, tempo para aplicar uma nova estratégia para a seleção. No fundo, Slutsky parece ter usado o que de melhor tinha o seu clube e tentou aplica-lo na seleção.

Em primeiro lugar, Slutsky definiu um onze. Capello tinha a tendência de usar vários sistemas, enquanto o novo treinador fixou-se no 4-2-3-1 que já usava no CSKA. Baseava-se em dois médios centro, sendo que um deles deveria ser Alan Dzagoev se não tivesse fraturado um pé antes do torneio. Provavelmente será substituído por Denis Glushakov, do Spartak Moscovo, que ficará com o trabalho de ser box-to-box.

A lesão de Dzagoev é uma perda significativa, mas ele não é o único intocável da seleção russa. Igor Akinfeev, Sergey Ignashevich e Vasili Berezutski estiveram no onze na maior parte dos jogos da última década e os últimos dois, que serão os centrais titulares, são até a principal fraqueza da equipa. Ignashevich tem 36 anos e Berezutski vai fazer 34 no dia do último jogo da fase de grupos, contra Gales, a 20 de junho; outros chegaram e partiram, mas nenhum conseguiu substituí-los adequadamente.

As opções para as laterais são muito maiores. Slutsky quer jogadores ofensivos nestes lugares por isso Igor Smolnikov e Yuri Zhirkov, do Zenit, encaixam bem, mesmo que este último já tenha 32 anos e, provavelmente, já tenha passado a sua melhor fase. Dmitri Kombarov e Oleg Kuzmin são as alternativas e vão lutar por um lugar no onze no jogo de estreia, com Inglaterra, a 11 de junho.

Slutsky não é adepto de pressão alto e por isso, frequentemente, usa apenas um médio box-to-box – normalmente Igor Denisov, Glushakov ou Dmitry Tarasov. O capitão, Roman Shirokov, também pode jogar aí.

Também há extremos em abundância. Oleg Shatov, do Zenit, é a primeira escolha para o flanco esquerdo e Aleksandr Kororin jogará, provavelmente, na direita, ou talvez no centro, atrás do ponta de lança. O número 10 é um dos maiores problemas da equipa, porque Shirokov, que jogou aqui na maior parte dos jogos da qualificação, dificilmente estará num bom momento de forma em França. Se não recuperar rapidamente, então o seu lugar deve ir para Oleg Ivanov, do Terek Grozny ou Pavel Mamaev, do Krasnodar.

No CSKA, Slutsky gostava de jogar com um avançado solitário e rápido, como Seydou Doumbia ou Ahmed Musa. A seleção tem um jogador parecido, caso do veterano Aleksandr Kerzhakov, cuja carreira renasceu durante o empréstimo ao FC Zurique. Contudo, parece que Slutsky irá escolher entre dois jovens para jogar na frente: Artyom Dzyuba, do Zenit e Fyodor Smolov, do Krasnodar, que tiveram, ambos, excelentes performances esta época.

Onze provável da Rússia: Akinfeev; Smolnikov, V Berezutski, Ignashevich, Zhirkov; Denisov, Glushakov; Kokorin, Mamaev, Shatov; Dzyuba.

A Rússia sabe bem ao que vai no Euro 2016

Que jogador da Rússia vai surpreender no Euro 2016?

Pavel Mamaev ou Fyodor Smolov. A dupla do FC Krasnodar impressionou toda a gente ao longo da última época. Smolov marcou mais de 20 golos na Liga russa e Mamaev esteve muitas vezes nas assistências. E com a baixa de forma de Shirokov, abre-se uma excelente oportunidade para Mamaev ser titular. Quanto a Smolov, vai competir com Dzyuba pelo papel de ponta de lança; se Smolov ganhar esta batalha, tem potencial para ser letal.

Que jogador pode ser uma desilusão?

Aleksandr Kokorin. É um ponta de lança, mas Slutsky costuma usá-lo como extremo direito, o que claramente limita o seu potencial. Contudo, não é por isso que pode ser uma desilusão: Kokorin teve uma época terrível fazendo apenas oito jogos pelo Dínamo Moscovo, antes de mudar-se para o Zenit onde teve as mesmas dificuldades para ser titular. Ele vai jogar em França, de certeza, mas as coisas podem não correr bem.

Até onde pode chegar a Rússia e porquê?

As coisas costumam ser difíceis para a Rússia sempre que tem um grupo fácil. Foi o que aconteceu no Euro 2012 e no Mundial 2014, quando foram eliminados na primeira fase mesmo tendo enfrentado rivais acessíveis. Desta vez, a Rússia tem boas hipóteses de chegar aos oitavos de final e depois vai depender do adversário. Realisticamente é pouco provável que sejam candidatos à vitória; na Rússia as pessoas acham que chegar aos quartos de final é o máximo que esta equipa pode conseguir.

Os segredos dos jogadores

Yuri Zhirkov

Zhirkov continua a ser uma das figuras da seleção russa

O antigo médio do Chelsea tem um passatempo invulgar: colecionar artigos da II Guerra Mundial. Por exemplo, uniformes militares, munições ou até equipamento de combate. Brevemente, vai abrir uma exposição com o seu próprio material.

Igor Denisov

O único jogador incontactável do plantel. Denisov tem sempre um ar taciturno e muito raramente dá uma entrevista. Em 2013 ele saiu do seu clube de sempre, o Zenit por causa de um escândalo. Pouco depois da chegada do Hulk, ele exigiu um aumento salarial, mas foi recusado. Os fãs começaram a chamar-lhe «Moneysov».

Alexander Samedov

É apaixonado pela NBA e, apesar de ter jogado por quatro clubes diferentes de Moscovo, nunca foi campeão russo. O pai de Samedov é azeri e, no início da sua carreira, teve de escolher entre os dois países para jogar na seleção. Fez a escolha certa, naturalmente…

Oleg Shatov

Na última primavera, este antigo jogador de futsal disse que a profissão de futebolista era uma das mais duras do mundo. Depois dessa entrevista, os fãs ridicularizaram-no e ele acabou por fazer um voto de silêncio. Recentemente, Oleg disse que só voltaria a falar se a Rússia fosse campeã da Europa.

Fyodor Smolov

Há uns anos, Smolov era um alvo perfeito para piadas: tinha um caso com a famosa modelo russa Victoria Lopyryova e marcava apenas um ou dois golos por ano. Depois da separação, começou a jogar muito melhor – mais de 30 golos nas últimas duas temporadas.

Artyom Dzyuba

A língua mais afiada da equipa. Uma vez, Dzyuba chamou a Unai Emery, na altura treinador do Spartak Moscovo, ‘Trenerishka’ que se pode traduzir por ‘Deixou de ser treinador’. Além disso, disse que a grande estrela do Zenit, Hulk, era ‘o seu gordo preferido’.

A figura: Oleg Shatov

Shatov em ação frente à Suécia

O jogador de futebol comum costuma ter uma forma de aparecer no futebol muito padronizada: jogar na rua em criança, depois jogar em campos normais, com relva natural. Qualquer outra forma de aparecer no futebol normalmente costuma gerar curiosidade e a história de Oleg Shatov não tem nada de natural. Ele começou a jogar futsal na cidade de Nizhny Tagil e percorreu um longo caminho até jogar em estádios cheios no Euro 2016.

«Tinha 16 anos quando tive de escolher entre o futsal e o futebol», afirma Shatov. «No inverno não se jogava futebol em Nizhny Tagil, porque não havia condições. Muita neve e muito frio. Por isso jogava futsal, achava que tinha mais futuro lá.»

«Assinei o meu primeiro contrato profissional com uma equipa de futsal chamada Viz-Sinara e depois fui emprestado ao FC Ural.»

Hoje, Shatov é um dos líderes da seleção russa e é uma das suas maiores esperanças para o Europeu. Ninguém discute que ele progrediu imenso nos últimos dois ou três anos; Shatov é o arquiteto por trás da maioria dos ataques russos e do seu clube, o Zenit. Está ao mesmo nível de Hulk, brilhando na Liga dos Campeões e beneficiando do conhecimento do treinador André Villas-Boas para melhorar.

O seu passado no futsal pode ser o segredo por trás do sucesso. Ensinou-o a jogar em espaços curtos, dando-lhe uma técnica ao estilo brasileiro o que se alia à sua boa velocidade e capacidade de cruzamento. Para provar que é um jogador completo, ainda tem um remate preciso e ajuda na defesa.

Shatov costumava ver vídeos de Zinedine Zidane em criança e tenta recriar um pouco o estilo do francês. Quando jogava no Ural, na segunda Divisão, conquistou os adeptos rapidamente e foi eleito o jogador do ano em 2010 mas não deixou de ser uma surpresa quando começou a ser associado aos grandes emblemas russos. O CSKA Mosvoco esteve interessado, mas ele acabou por escolher o Anzhi Makhachkala, onde jogava Samuel Etoo, em 2012.

Os anos de ouro do Anzhi foram curtos e Shatov esteve entre os que saíram no verão de 2013. O Zenit foi rápido a agir e o seu crescimento desde aí tem sido meteórico. A Rússia tem muitos jogadores talentosos, mas poucos tão dedicados como Shatov, um verdadeiro profissional, que treina adequadamente e tem cuidados fora do relvado.

Ainda assim, não significa que não tenha passado por polémicas. Shatov não gosta de dar entrevistas e a sua falta de experiência ficou à vista recentemente quando, numa delas, falou de mais.

«Todos acham que os futebolistas estão estragados pelo dinheiro. O trabalho de um futebolista é duro. Mais duro do que um jornalista e mais duro do que muitas outras profissões. Treinamos todos os dias por três ou quatro horas e não sei a que comparar isto – talvez só a operários numa fábrica. Talvez só aí se encontrem pessoas mais desgastadas pelo trabalho do que nós», afirmou.

Isto gerou polémica, mas, apesar de tudo, Shatov é bom rapaz. Soube-se recentemente que vai gastar 15 milhões de rublos num campo de futebol novo em Nizhny Tagil, onde quer abrir uma escola de futebol.

Um dos amigos de Shatov no Zenit é o defesa Igor Smolnikov. As suas esposas são próximas e, há seis meses, lançaram juntas um projeto solidário para ajudar crianças doentes. A 18 de outubro de 2015 realizaram o primeiro leilão de caridade, em S. Petersburgo, conseguindo mais de 15 mil rublos.

Está claro que, mais do que um sonhador, Shatov é um trabalhador. Um personagem com os pés assentes no chão que nunca irá negar as suas raízes. «Vamos deixar que os sonhos sejam apenas sonhos», disse, quando questionado se já se tinha imaginado a jogar o grande Clássico espanhol pela equipa que ele apoia, o Real Madrid, no futuro.

«Prefiro definir objetivos em vez de sonhar. Sei que, um dia, vou voltar a vestir a camisola do Ural, prometi isso a mim próprio. Ural é a minha segunda casa. Cresci lá, como pessoa e como futebolista.»

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