Mundial 2022: Portugal-Sérvia, 1-2 (crónica) - TVI

Mundial 2022: Portugal-Sérvia, 1-2 (crónica)

Chocante e para refletir

«Da tensão danada nasce o medo», escreveu Luís Vaz de Camões n’Os Lusíadas.

Depois de entrar a ganhar, Portugal deixou o jogo com a Sérvia arrastar-se para o precipício e terminou-o a perder e com o sonho do Mundial pelo menos adiado para março do próximo ano.

E era «só» não perder. Mas talvez por isso a Seleção Nacional tenha feito tão pouco para vencer este jogo, um dos dois que até nem precisava de ganhar para chegar ao Qatar.

Nós, portugueses, não habituados a sofrer tão pouco.

E na noite deste domingo chegou a ter-se a sensação de que Portugal iria entregar a uma Luz apinhada uma exibição de luxo ao nível do que raras vezes se tem visto. E não foi só o golo de Renato aos 90 segundos. Foi a capacidade de forçar o erro, de provocar o caos no bloco defensivo contrário a cada aceleração.

Mas nós, portugueses, não estamos habituados a sofrer tão pouco.

Depois de dez minutos de autoridade lusitana, a Luz assistiu a um jogo diferente. Mas após uma entrada desastrosa – o pobre Gudelj que o diga – a Sérvia começou a empurrar Portugal na direção da baliza de Patrício. Danilo e João Moutinho, os pilares do meio-campo luso, foram engolidos pela pressão asfixiante dos sérvios.

A força de Vlahovic, a inteligência de Tadic e as investidas de Kostic e de Zivkovic pelas alas. Demasiado para futebol tão pobre de Portugal, incapaz de ter bola no meio-campo ofensivo e de fazer os sérvios correr atrás dela. Bernardo e Renato (ainda que inconstante) foram o melhor da equipa das quinas nos 45 minutos iniciais.

Portugal regressou para a etapa complementar com os mesmos 11, mas uma alteração tática. Renato foi deslocado para a direita e Bernardo Silva passou para o corredor central, o que permitiu uma melhor gestão com bola.

Mas, verdade seja dita, a Sérvia foi sempre mais ambiciosa. Mostrou-o na primeira parte e logo no regresso dos balneários, quando abdicou de Gudelj e trouxe Mitrovic para dar mais corpo ao ataque.

Portugal não terá sido tão mau durante tanto tempos nos segundos 45 minutos como o foi nos primeiros, mas foi demasiado curto para o talento em campo.

Que desperdício, perdoem-nos o desabafo!

Depois de uma ameaça de Renato, Portugal permitiu que o jogo seguisse para um precipício vertiginoso. E isso tornou-se notório no momento em que Fernando Santos remodelou a defesa, fazendo baixar Danilo para o meio dos centrais para a derradeira meia-hora. Aí já não estavam em campo Moutinho (Palhinha) e Bernardo, rendido por Bruno Fernandes quando estava a ser o elemento mais lúcido da equipa das quinas.

A partir daí, Portugal baixou o bloco e limitou-se a tentar segurar o ponto que o levava até ao Qatar. «Não está no nosso ADN defender», terão sido estas as palavras de Santos na antevisão ao jogo.

E não está, senhor engenheiro.

Mas lá está: «Da tensão danada nasceu o medo.»

Tanto que o final desta história só poderia ser este. Aos 89 minutos, Mitrovic, esquecido ao segundo poste, despejou um balde de águia fria e deu à Sérvia uma vitória cristalina no Estádio da Luz.

Afinal de contas, foi quem mostrou que queria realmente ganhar. E não precisou de «atacar à maluca» para isso.

Vinte e quatro anos depois, Portugal corre o risco de voltar a falhar a presença numa grande competição. Com jogadores como Ronaldo, Bruno Fernandes, Bernardo Silva, Cancelo, Jota e Félix.

Chocante e para refletir.

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