Portugal-Ucrânia, 0-0 (crónica) - TVI

Portugal-Ucrânia, 0-0 (crónica)

Há coisas que nem Paris consegue mudar

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Portugal entrou na fase de apuramento para o Euro 2020 a perder pontos em casa, o que só deve surpreender os mais distraídos. Há décadas que ser português é isto.

Por alguma razão, aliás, inventámos o fado: provavelmente porque gostamos de sofrer.

Gostamos de fechar os olhos e lamentar a nossa sorte. Ou antes, a falta dela. Gostamos de viver em angústia, com um travo de amargura nos lábios e um assomo de ansiedade no coração.

Faz parte de nós e da nossa individualidade. Mesmo que as novas gerações tentem ultrapassar esta imagem, há aldeias que permanecem habitadas por irredutíveis velhos do Restelo.

A Seleção Nacional, por exemplo.

Faz parte da identidade da Seleção Nacional viver em permanente inquietude, em constante desassossego, em inalterável agonia. Por isso este empate só pode, de facto, surpreender os mais distraídos. O mais certo é, daqui a uns meses, estarmos obrigados a ir ganhar à Sérvia ou à Ucrânia.

É o nosso destino.

Veja a ficha de jogo e o relato ao minuto

Mais surpreendente, de facto, foi a falta de inspiração da equipa nacional: uma equipa que abusou dos lançamentos longos para a área e dos cruzamentos: fez aliás 42 (sim, quarenta e dois) cruzamentos. Só João Cancelo, de resto, fez onze deles: e só um foi finalizado dentro da área.

A verdade é que não houve uma ideia clara, que não passasse pela bola área para a área. Onde só estavam André Silva e Cristiano Ronaldo. Sabia-se que era assim desde o início, aliás. Bernardo Silva não entra na área, João Moutinho não entra, William Carvalho não entra na área.

O que sobra, então? Ronaldo e André Silva, pois claro.

Não deixou de surpreender, sim, que Fernando Santos tenha apresentado um onze com três médios de tração à retaguarda: Ruben Neves, William e Moutinho não têm chegada à área e não têm golo.

Com Pizzi no banco, um jogador que está a fazer uma temporada fantástica, com golos, muitos, e assistências, custa a compreender a opção por estes três. Até porque a Seleção Nacional ia precisar de mais gente que ameaçasse a baliza: mais gente que ousasse arriscar ser feliz.

A Ucrânia é uma equipa italiana, como já muita gente tinha avisado, que defende muito e com muitos jogadores. À frente do guarda-redes tem uma linha de quatro homens e à frente da defesa tem uma linha de cinco homens. São, no fundo, nove jogador ali logo à saída da grande área.

Apesar disso, e sobretudo na primeira parte, as duas linhas tiveram momentos de pouca proximidade, o que ofereceu a Portugal espaços para explorar. Mas nem isso a Seleção soube fazer.

Pyatov e Ruben Dias em boa hora: os destaques da partida

Ora voltando atrás, a Ucrânia defendeu com muita gente, cedeu a posse de bola (o jogo acabou com 59 por cento do nosso lado) e convidou a Seleção a arriscar, para depois responder em rápidos contra-ataques. Portugal mandou por isso no jogo, rematou muito (dezoito vezes), fartou-se de atacar, de insistir, insistir e insistir, ninguém pode aliás acusar os jogadores nacionais de não terem vertido suor, mas no fundo, e depois quando se espreme tudo isto, fica-se com muito pouco na mão.

A primeira parte acabou com dois remates de Ronaldo perigosos – muito perigosos, aliás –, mais um tiro de ressa ca de Pepe também ele a assustar Pyatov. Na segunda parte houve apenas um remate de André Silva, para mais uma grande defesa do guarda-redes ucraniano.

É certo que Pyatov fez uma grande exibição, foi aliás o melhor em campo, mas também é certo que quatro remates verdadeiramente perigosos, em noventa minutos de jogo, é muito pouco.

No fim, de resto, valeu Ruben Dias a tirar o golo dos pés de Júnior Moraes, naquela que foi até a melhor ocasião de golo em todo o jogo: e pertenceu à Ucrânia, sim.

Por isso o empate não deve verdadeiramente espantar ninguém. Como o facto do campeão europeu em título começar a fase de apuramento a perder pontos também não deve espantar.

É a nossa sina: e nem Paris conseguiu mudar isso.

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