BES: Constitucional nega desproporcionalidade nas multas a Salgado e Morais Pires - TVI

BES: Constitucional nega desproporcionalidade nas multas a Salgado e Morais Pires

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  • 13 jan 2020, 18:49

Tribunal recusou o recurso do ex-presidente do BES Ricardo Salgado à contraordenação do Banco de Portugal, tendo o ex-banqueiro de pagar a coima de 3,7 milhões de euros

O Tribunal Constitucional (TC) tornou público o acórdão que manteve as multas aos ex-administradores do Banco Espírito Santo (BES) Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires, rejeitando recursos que pediam a desproporcionalidade das coimas aplicadas.

No acórdão hoje publicado no 'site' do TC, assinado pelo juiz Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro, o órgão decidiu "não julgar inconstitucionais as normas indicadas nas alíneas d) a m) e o) do requerimento de recurso interposto por B., bem como a norma constante da 5.ª questão indicada por A. no seu requerimento de recurso".

As normas indicadas nas alíneas d) a m) de um dos recursos pretendiam a declaração de inconstitucionalidade de várias normas do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), nomeadamente de várias alíneas dos artigos 210.º, 211.º, 213.º ou 215.º, "por violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP [Constituição da República Portuguesa], que consagra o principio da proporcionalidade".

Segundo o TC, num dos recursos, umas formulações "dizem respeito à hipótese de concurso de contraordenações, outras a contraordenações específicas; umas dizem respeito ao limite máximo de coima abstratamente aplicável, outras às coimas concretamente aplicadas e outras, ainda, a ambos".

"Nunca seria possível cogitar a inconstitucionalidade do limite máximo de uma coima em razão da mera circunstância de ele exceder o máximo de multa permitido para casos de responsabilidade penal – o (único) enunciado normativo que, neste ponto, o recorrente traz à consideração deste Tribunal no seu recurso", argumenta o TC no acórdão.

A instituição sediada no palácio Ratton considerou inclusivamente que "a falta de fundamento destas questões torna-se ainda mais manifesta quando se considera a circunstância de se estar aqui perante um domínio sancionatório que integra «ilícitos especialmente graves relacionados com a atividade de instituições de crédito e atividade financeira em que apenas pode estar em causa o perigo para os bens jurídicos ou já danos especialmente graves para a atividade financeira e para pessoas singulares»".

Para o TC, "o potencial «prejuízo para o equilíbrio financeiro» destas instituições é muito elevado e tem como inerência igualmente elevados riscos sistémicos e que, por conseguinte, existem «várias e importantes razões» para se concluir que se «justificam limites bastante elevados para as coimas nesta área»".

"Assim, não só não se afigura arbitrária […], como se afigura até absolutamente plausível a opção do legislador de lançar aí mão de elevadas coimas, sanções estas que – convém recordar, apesar de ser evidente –, ao contrário da pena de multa, são insuscetíveis de conversão em prisão subsidiária e em relação às quais, também por isto, aquela liberdade legislativa é significativamente mais ampla", pode ler-se no acórdão.

O TC recusou o recurso do ex-presidente do BES Ricardo Salgado à contraordenação do Banco de Portugal, tendo o ex-banqueiro de pagar a coima de 3,7 milhões de euros.

Contactado pela Lusa, o Banco de Portugal indicou que não faz comentários sobre processos judiciais. A assessoria de Ricardo Salgado também não comenta.

"Gestão ruinosa" no Banco Espírito Santo

O Tribunal Constitucional dispensou-se de analisar a constitucionalidade de um dos recursos interpostos por Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires relativo à "gestão ruinosa" no BES, por este assentar "numa premissa equívoca".

O recurso defendia que a contraordenação relativa à "gestão ruinosa" prevista no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), na decisão contra Ricardo Salgado e Morais Pires, "não exige um nexo causal entre a conduta de gestão dolosa e o efeito “ruinoso” em detrimento dos depositantes, investidores e demais credores da instituição financeira", pode ler-se no acórdão hoje divulgado pelo Tribunal Constitucional.

"O recurso assenta, neste aspeto, numa premissa equívoca", defende o TC, já que a abordava, "por um lado, uma conduta 'dolosa' e, por outro, um resultado 'ruinoso'".

"Tratar-se-ia, nesta visão das coisas, de uma infração de resultado, que em condições normais pressuporia a verificação de um nexo de causalidade entre a conduta e o resultado. É fundamentalmente outro, no entanto, o alcance do preceito em causa e, em consequência, o sentido do entendimento sobre ele acolhido na decisão recorrida", defende o TC.

De acordo com a redação da alínea em causa à data, a l) do artigo 211.º do RGICSF, o que se previa na legislação que rege o setor da banca eram "atos dolosos de gestão ruinosa", segundo o TC.

"Ou seja, o adjetivo 'ruinosa' qualifica a 'gestão'. Ele reporta-se, pois, à própria conduta; não a qualquer efeito supostamente previsto naquele tipo contraordenacional e cujo nexo com aquela gestão, compreendida como causa, fosse, portanto necessário estabelecer", esclareceu o Tribunal Constitucional no acórdão conhecido esta segunda-feira.

A instituição sediada no palácio Ratton recusou então abordar esse nexo de causalidade em termos de constitucionalidade, porque "logo à partida o tipo legal em questão ['atos dolosos de gestão ruinosa'] não pressupunha qualquer resultado", uma relação que o recurso tentou estabelecer.

Assim, o Tribunal Constitucional admitiu "não conhecer" o "objeto" do recurso apresentado relativo a este ponto, uma vez que apenas analisa questões de índole constitucional.

Este processo diz respeito à falsificação das contas da Espírito Santo Internacional (ESI), ‘holding’ de controlo do Grupo Espírito Santo (com dívida escondida e sobreavaliação de ativos) e a venda de títulos de dívida dessa empresa a clientes do BES quando as contas estavam viciadas.

Após a decisão do TC, segundo fonte contactada pela Lusa, o processo vai seguir para o tribunal de Santarém, onde caberá ao Ministério Público tomar medidas para que se cumpra a condenação, nomeadamente o pagamento dos 3,7 milhões de euros por Salgado.

Amílcar Morais Pires recorreu da coima, tendo no seu caso o tribunal de Santarém baixado a multa de 600 mil para 350 mil euros e o Tribunal da Relação julgou totalmente improcedente o recurso.

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