Pedrógão Grande: assistentes no processo do incêndio rejeitam vingança - TVI

Pedrógão Grande: assistentes no processo do incêndio rejeitam vingança

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  • 24 mai 2021, 13:41

Procuradora enalteceu o significado jurídico, social e mediático que o processo assume

Os advogados dos assistentes no processo dos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017, nos quais o Ministério Público contabilizou 63 mortos e 44 feridos, garantiram hoje que não pretendem vingança com este julgamento.

“Não estamos aqui por vingança, mas pela salvaguarda da justiça material, para que catástrofes desta natureza não se voltem a repetir e para que os responsáveis sejam condenados”, adiantou Patrícia Oliveira, nas exposições introdutórias, no início do julgamento, que hoje arrancou no Tribunal Judicial de Leiria.

Neste julgamento estão 11 arguidos a quem são imputados crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves.

A posição desta advogada de alguns familiares das vítimas do incêndio de Pedrógão Grande foi reafirmada por, pelo menos, mais três advogados, que sublinharam que pretendem a “verdade”.

Filomena Girão, defensora do arguido Augusto Arnaut, comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, destacou a importância de “não se fazer mais vítimas”.

“O comandante Arnaut ouviu as declarações e tudo o que se passou aqui hoje com muita consternação e com muito respeito pela dor das vítimas deste incêndio. Não precisamos de mais vítimas. Este incêndio já fez vítimas suficientes, percebemo-lo todos. Uma condenação ao comandante Arnaut seria apenas isso, seria apenas juntar mais uma vítima ao extenso rol de que temos”, adiantou Filomena Girão aos jornalistas, à saída do tribunal, após a interrupção para almoço.

Na sala de audiências, a advogada adiantou que a acusação a Augusto Arnaut é torná-lo um “bode expiatório”.

Ministério Público diz que processo é “primeiro do género”

A procuradora da República Ana Mexia afirmou hoje, no Tribunal Judicial de Leiria, onde começou o julgamento dos incêndios de Pedrógão Grande, que este é um processo “único e o primeiro do género, pelo significado jurídico, social e mediático”.

Dúvidas não temos que este processo é - infelizmente pelo desfecho que culminou na morte de pessoas – único e o primeiro do género, pelo significado jurídico, social e mediático que assume”, afirmou a procuradora, nas exposições introdutórias a que a Lusa teve acesso.

O julgamento de 11 arguidos para determinar responsabilidades nos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017, nos quais o Ministério Público (MP) contabilizou 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal, começou hoje.

Aos arguidos são imputados crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves.

Segundo a magistrada do Ministério Público, no julgamento “importa apurar se a questão respeitante aos prazos de vigência” dos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios “implicava e explicava a inação de alguns dos arguidos”, pois ainda que estes planos “tivessem caducado, as fontes de risco para as vítimas não haviam caducado – esse risco, permanecia lá, tal como o perigo silencioso que a falta de gestão das faixas comportou”.

No entender da procuradora da República, “devido ao desfecho e consequências dos fenómenos relacionados com os fogos e que põem em causa a vida, integridade física e direitos patrimoniais das populações, às proporções que os incêndios podem assumir, à duração, ao trajeto do fogo, aos meios necessários empregar para o combater eficazmente, à dificuldade que a contenção assume” o “legislador sentiu necessidade de criar normas de proteção para conter e mitigar” as consequências estes eventos.

Ana Mexia, que no julgamento está acompanhada pela procuradora coordenadora da Comarca de Leiria, Ana Simões, que foi responsável pelo despacho de acusação, “quanto mais intensos forem esses fenómenos, maior a necessidade de se adotarem as medidas previstas pelo legislador para se protegerem as infraestruturas”, mas, acima de tudo, as pessoas.

“Por outro lado, quaisquer regras ou procedimentos empresariais internos (…) não podem pôr em causa a legitimidade democrática das leis da República, que definem os deveres de cuidado para com a vida e integridade física de terceiros”, adiantou.

Ainda nas exposições introdutórias, a magistrada do Ministério Público perguntou: “As omissões defraudaram, ou não, as legítimas expectativas penais da comunidade quanto ao cumprimento das normas de segurança? As hipóteses de sobrevivência e salvamento das vítimas foram, ou não, completamente erradicadas com as omissões dos arguidos?”.

“Pode, ou não, o tribunal admitir que, nas circunstâncias descritas na pronúncia e nas acusações, as vidas das pessoas que pereceram já não eram merecedoras de qualquer tutela jurídico-penal e que a ordem jurídica as tinha abandonado à sua sorte?”, continuou, concluindo: “Tudo isto (…) terá que ser apreciado e sopesado pelo tribunal, o que, convenhamos, não é tarefa fácil, mas constitui um desafio ímpar para que se possa fazer justiça”.

Os arguidos são o comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut, então responsável pelas operações de socorro, dois funcionários da então EDP Distribuição (atual E-REDES) e três da Ascendi, e o ex-presidente da Câmara de Castanheira de Pera Fernando Lopes.

Os presidentes das Câmaras de Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande, Jorge Abreu e Valdemar Alves, respetivamente, também foram acusados.

O antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande José Graça e a então responsável pelo Gabinete Florestal deste município, Margarida Gonçalves, estão igualmente entre os arguidos.

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