Dez anos após a despenalização do aborto em Portugal, ainda há cerca de 500 portuguesas que vão anualmente a Espanha interromper a gravidez. Fazem-no em nome da privacidade e por já terem ultrapassado o prazo legal.
De acordo com Associação de Clínicas Acreditadas para a Interrupção da Gravidez (ACAIVE), de Espanha, a maioria das mulheres que opta por realizar um aborto no país vizinho fá-lo por estar grávida há mais de dez semanas, o prazo máximo previsto na lei portuguesa, que entrou em vigor há dez anos, a 15 de julho de 2017. Em Espanha, a interrupção da gravidez a pedido da mulher é permitida até às 14 semanas.
Outra das razões é a confidencialidade que acreditam conseguir noutro país.
A ACAIVE estima que, anualmente, 400 portuguesas abortem em clínicas situadas em Badajoz, 60 em estabelecimentos na Galiza, 26 em Huelva e entre duas a três em Valladolid.
Em relação a espanholas que viajam até Portugal para abortar, esses valores “não são relevantes”, segundo esta associação, aqui citada pela Lusa.
IVG baixou em oito anos
Os dados oficiais da Direção-Geral da Saúde (DGS) de 2016 ainda não estão disponíveis, mas as estatísticas dos oito anos completos de despenalização da interrupção da gravidez (2008 a 2015) mostram uma tendência de decréscimo, sobretudo a partir de 2012.
No último relatório com os registos de interrupção da gravidez vemos que o aborto por opção da mulher caiu 1,9% entre 2014 e 2015: foram feitas 15.873 interrupções por decisão da grávida nesse ano.
Foi, de resto, o número mais baixo desde 2008, primeiro ano completo desde que entrou em vigor a lei.
Entre 2008 e 2011 houve uma tendência de subida das interrupções. Começaram a descer depois, a partir de 2012, de forma mais acentuada (6,6% nesse ano). Isso também aconteceu de 2013 para 2014 (-8,7 por cento).
Metade das mulheres que abortam já são mães de outras crianças
Os últimos dados disponíveis são de 2015 e mostram que metade das mulheres que abortaram por opção já tinham um ou dois filhos. Por outro lado, 42,3% ainda não eram mãe. Estes dados são semelhantes aos verificados em anos anteriores.
- 70% das mulheres que decidiram abortar em 2015 nunca tinha realizado qualquer outro aborto
- 21% já tinham feito uma intervenção
- Quase 6% tinham feito duas
- 2,5% já tinham realizado três ou mais
Sete em cada dez abortos foram feitos em unidades oficiais do Serviço Nacional de Saúde, segundo a DGS.
Noutro relatório da autoridade de saúde é ainda possível perceber que entre 2001 e 2014 foram sendo reduzindo as complicações pelo aborto ilegal a partir de 2007/2008.
Houve uma “redução significativa tanto do número total de complicações como do número de complicações graves a partir de 2008”, uma diminuição ainda mais nítida a partir de 2013.
Hospitais adquiriram 134,5 mil pilulas abortivas
Também a propósito da efeméride, o instituto que regula o setor do medicamento (Infarmed) adiantou também hoje que os hospitais portugueses autorizados para a realização de abortos adquiriram, nos últimos dez anos 134.564, comprimidos de mifepristona, conhecida como “pílula abortiva”.
Atualmente, dois laboratórios têm autorização de introdução no mercado para a mifepristona.
Segundo o Infarmed, 28 hospitais do SNS com gestão pública consumiram mifepristona em 2016.
A comercialização de mifepristona - que bloqueia a hormona fundamental para a manutenção da gravidez (progesterona) – está autorizada em Portugal desde julho de 2007, o mesmo mês em que entrou em vigor a lei que despenalizou o aborto até às dez semanas, cujo aniversário se assinala sábado. Eis as vendas de pílula abortida destes últimos anos:
2007 | 4.427 |
2008 | 14.431 |
2009 | 16.339 |
2010 | 16.298 |
2011 | 15.259 |
2012 | 13.558 |
2013 | 13.234 |
2014 | 12.147 |
2015 | 11.614 |
2016 | 11.837 |
2017 (1º trimestre) | 5.420 |