Bebé sem rosto: clínica onde foram feitas ecografias investigada - TVI

Bebé sem rosto: clínica onde foram feitas ecografias investigada

Ecografia (Reuters)

Investigação tem como âmbito detetar eventuais irregularidades na convenção estabelecida com o Estado

A clínica EcoSado, onde trabalhava o obstetra Artur Carvalho, está a ser investigada pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT).

Ao que a TVI apurou, a investigação tem como âmbito detetar eventuais irregularidades na convenção estabelecida com o Estado.

“Diversas entidades estão a desenvolver processos sobre esta matéria, sendo que a ARSLVT está a acompanhar esses esforços e a desenvolver as suas próprias diligências. Assim, e respeitando a confidencialidade inerente ao processo de inquérito que decorre no seio desta instituição, a ARSLVT não vai adiantar informações sobre este assunto até que todas as diligências se encontrem concluídas”, adiantou a ARSLTV à TVI.

O inquérito deste organismo decorre de forma independente ao instaurado pelo Hospital São Bernardo, mas em paralelo.

A clínica EcoSado, onde Artur Carvalho fez as ecografias à mãe de Rodrigo e não detetou às malformações do bebé que nasceu sem rosto, não foi fiscalizada no âmbito da “monitorização e de verificação da observância dos requisitos de qualidade e de funcionamento dos serviços prestados” pela Entidade Reguladora de Saúde (ERS).

Numo nota enviada à TVI, a ERS esclarece que a clínica apenas foi fiscalizada nos anos de 2007 e de 2011, que antecederam a atribuição da competência do licenciamento à ERS.

Fonte do organismo público explica à TVI, que a ERS não tem competência para a “avaliação de prática clínica”. Ou seja, mesmo que a clínica tivesse sido fiscalizada e tivesse sido detetado que “um dos clínicos não estava habilitado para realizar ecografias, a informação seria remetida para a Ordem dos Médicos”.

“De notar que as fiscalizações promovidas pela ERS nunca pressupõem a avaliação da atividade desenvolvida pelos profissionais de saúde, sujeita à regulação e disciplina das respetivas associações públicas profissionais”, sublinha o regulador.

O regulador adianta ainda que quando acontece uma fiscalização a unidades privadas, a ERS verifica a “existência de equipamento médico e geral identificado nas respetivas Portarias de atividade” e “os resultados dos programas de garantia da qualidade e segurança”.

A ERS esclarece também que já tinha recebido reclamações de negligência médica da Clínica do EcoSado e que foram remetidas para a Ordem dos Médicos.

A EcoSado possui licença de funcionamento para as tipologias de atividade de clínicas e consultórios médicos e radiologia, “as quais foram emitidas ao abrigo do procedimento simplificado por mera comunicação prévia”.

De acordo com a lei, cabe à empresa que explora a Ecosado responsabilizar-se pelo integral cumprimento dos requisitos mínimos de funcionamento, uma vez que não é necessária vistoria prévia da entidade reguladora.

O médico Artur Carvalho, foi suspenso preventivamente na terça-feira, pelo Conselho Disciplinar do Sul da Ordem dos Médicos.

O Ministério Público abriu, por sua vez, um inquérito, no seguimento de uma queixa apresentada pela mãe.

 

Averiguação da prática clínica compete à Ordem dos Médicos

A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) esclareceu que a averiguação da prática clínica é da “competência exclusiva” da Ordem dos Médicos e garantiu a sua “intervenção regulatória” na salvaguarda da qualidade e segurança dos cuidados de saúde prestados.

A averiguação da conformidade da prática clínica com os preceitos da arte é da competência exclusiva da respetiva ordem profissional”, refere a Entidade Reguladora da Saúde num comunicado para esclarecer as suas funções, sublinhando que não pode “exercer atividades ou usar dos seus poderes fora das suas atribuições”.

A ERS, cujo papel tem sido questionado a propósito do caso do bebé que nasceu com malformações, explica que é a entidade a quem deve ser dado conhecimento de todas as reclamações e queixas que visem a atividade de estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, assistindo-lhe ”o poder-dever de apreciar as queixas e reclamações e monitorizar o seguimento dado às mesmas".

A nota, publicada na página da internet da instituição, refere que caso se verifique, durante a monitorização de uma reclamação, indícios de infração, disciplinar e até criminal, a ERS “tem o dever de dar conhecimento às entidades competentes”.

Esta obrigação de encaminhamento a entidades terceiras acontece porque a ERS não pode exercer ou usar os seus poderes fora do âmbito das suas intervenções, nem afetar os seus recursos a finalidades diversas das que lhes são cometidas, mas não constrange ou anula a necessária intervenção regulatória da ERS, de salvaguarda da qualidade e segurança dos cuidados de saúde prestados”, sustenta.

No âmbito dos poderes de regulação, verifica o cumprimento das normas relativas ao registo de prestadores de cuidados de saúde, licencia as unidades de saúde e estabelece "um patamar mínimo de qualidade dos prestadores em exercício de atividade”.

Revela-se primordial garantir requisitos mínimos de qualidade e segurança ao nível da prestação de cuidados de saúde, dos recursos humanos, do equipamento disponível e das instalações, para que os serviços sejam prestados em condições que não lesem os direitos, nem os interesses legítimos dos utentes”, realça, dando também conta dos seus poderes de supervisão e sancionatórios.

A ERS indica igualmente que realiza ações de fiscalização pontualmente, “de acordo com planos de fiscalização previamente determinados e sempre que se verifiquem perturbações no respetivo setor de atividade".

Segundo esta entidade, as ações de fiscalização servem para verificar o cumprimento dos requisitos de abertura e de funcionamento dos estabelecimentos do setor público, privado ou social.

Quando ocorre uma avaliação ou monitorização periódica a unidades privadas de saúde com atividade regulamentada no âmbito do regime de licenciamento, a verificação, pela ERS, do cumprimento dos requisitos técnicos mínimos de funcionamento pressupõe a verificação da existência do equipamento médico e geral identificado, dos equipamentos mecânicos, das instalações elétricas e gases medicinais, da disponibilização de informação obrigatória ao utente, da conservação em arquivo de documentação mínima obrigatória e, bem assim, concretamente no caso de unidades de radiologia, dos resultados dos programas de garantia da qualidade e segurança”, frisa.

A ERS refere ainda que verifica as habilitações legais para o exercício da atividade dos profissionais de saúde afetos ao funcionamento de cada estabelecimento, concretamente da titulação de cédula ou carteira profissional e, no caso de usurpações de funções, comunica à Procuradoria Geral da República.

O papel da Entidade Reguladora da Saúde tem sido questionado a propósito da polémica que envolve o obstetra Artur Carvalho, entretanto suspenso preventivamente pela Ordem dos Médicos, após a divulgação do caso de um bebé de Setúbal que nasceu com malformações graves que não foram detetadas em nenhuma das várias ecografias realizadas por aquele médico.

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