Colégio de Lisboa distribui documentos negacionistas a pais de alunos. Inspeção-Geral vai investigar - TVI

Colégio de Lisboa distribui documentos negacionistas a pais de alunos. Inspeção-Geral vai investigar

Escola

Pai de criança de três anos fez uma queixa. Escola confirma que distribuiu três documentos que chegaram de movimentos ligados ao negacionismo

O Colégio "O Pelicano", em Lisboa, que é gerido pela Fundação "A Caridade", distribuiu, esta sexta-feira de manhã, documentos com alegações de conhecidos negacionistas contra a vacina da covid-19. A Inspeção-Geral da Educação e Ciência vai analisar o caso, confirmou o ministério da Educação à TVI24.

Segundo esta escola privada referiu à TVI24, três documentos foram distribuídos durante a manhã aos pais dos alunos, em páginas que continham conteúdo negacionista.

"Existem substâncias tóxicas nesta "vacina" que estão a causar reações muito adversas, em diversos pacientes, já tendo muitas terminado em morte", alega um dos documentos entregues aos pais, a que a TVI24 teve acesso.

Um dos pais, Hugo Mouro, cuja queixa chegou à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, contou à TVI24 que estranhou a situação quando ia deixar o filho de três anos à escola. Ao chegar ao local, viu uma funcionária "investida em que os pais recebessem" os documentos. No local, conta este pai, estava também a diretora, que terá visto a situação.

Contactada pela TVI24, a direção da escola confirma toda a situação, incluindo a intenção de distribuir os papéis, que terão chegado pela mão de pessoas ligadas a movimentos negacionistas às mais variadas escolas do país, segundo a informação dada pelo Colégio "O Pelicano".

Entendeu a Direção do Colégio 'O Pelicano' distribuir aos funcionários e aos pais esta informação que chegou para eles", refere a nota enviada pela instituição.

Questionada sobre se esta escola se associa ao que os movimentos negacionistas alegam nos documentos, a diretora do colégio e vice-presidente da Fundação "A Caridade", Marina Pereira, referiu que o Colégio "O Pelicano" "não subscreve nem deixa de subscrever" os documentos.

Cada funcionário, cada membro das famílias dos alunos atua, decide, com a sua liberdade e responsabilidade", acrescenta.

O que dizem os documentos que vão levar a Inspeção-Geral a analisar o caso

Um dos documentos, intitulado "Carta Aberta à População Portuguesa", está datado de 24 de julho de 2021 e tem mais de 190 subscritores, sendo que o nome de Rui da Fonseca e Castro salta à vista. Não só é um dos assinantes, como é o juiz conhecido por posições negacionistas, que está até suspenso pelo Conselho Superior da Magistratura depois de recusar a utilização de máscara em tribunal, além de ter partilhado várias opiniões contra a vacinação.

As pessoas têm de saber que estão a ser injetadas com uma substância altamente tóxica e que acabará sempre por provocar a morte do paciente. Todos os injetados com as substâncias que são veiculadas como vacinas contra a covid-19 são cobaias de uma experiência", refere o documento.

A juntar a este documento, a escola em causa distribuiu mais dois: um intitulado "Crianças e jovens não devem ser vacinados para a covid-19" e uma lista com vários médicos e documentários que explicam a sua visão da situação, estando assinada por um grupo denominado "Portugueses pela Saúde".

Os documentos chegaram ao Colégio "O Pelicano" no dia 30 de setembro. Foram depois distribuídos pelos 19 funcionários, que se encarregaram de os dar aos pais no dia 1 de outubro.

Quanto ao pai com quem a TVI24 falou, é taxativo: o seu filho já não volta mais àquela escola, estando já a procurar com a mulher uma outra solução. A acompanhar a queixa de Hugo Mouro foram os documentos recebidos por este pai, bem como uma exposição da situação.

O Colégio "O Pelicano" tem ensino pré-escolar e primeiro ciclo e também Centro de Atividade de Tempos Livres (ATL). Neste caso, os documentos terão sido distribuídos apenas aos pais das crianças que frequentam o pré-escolar. Ao todo, e segundo os relatórios da Fundação "A Caridade", em 2020, aquela instituição tinha 150 alunos de pré-escolar, 45 no primeiro ciclo e 43 em ATL. Naquele estabelecimento existem alunos de 29 nacionalidades, desde o Egito ao Irão, como refere a diretora.

TVI24 contactou o Ministério da Educação, que afirma que, sendo uma instituição privada, o colégio tem autonomia, confirmando depois que a queixa recebida vai ser analisada pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência.

O Ministério da Educação não tem conhecimento de outros casos semelhantes, não sabendo também de outras instituições que possam ter recebido os documentos que o Colégio "O Pelicano" diz terem sido recebidos por várias escolas.

Rui Martins, da Confederação Nacional Independente dos Pais e Encarregados de Educação (CNIPE), avançou à Lusa "não ter tido qualquer tipo de queixa até ao momento" sobre este documento poder estar a ser distribuído em outras escolas do país.

Os números oficiais das reações adversas à vacina

Um dos documentos distribuído neste colégio cita a Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla original) e o sistema EudraVigilance, responsável pelo processamento de dados relativos a reações adversas a medicamentos. A hiperligação fornecida vai de facto para o website da EMA, mas não para os resultados das reações adversas.

Com efeito, este documento cita o relatório de 17 de julho, que é referido num outro documento semelhante. Acontece que, nesse segundo documento, que também refere a EMA, a hiperligação associada não é oficial e não vincula a EMA. De resto, o website oficial da EudraVigilance é este, sendo que o verdadeiro relatório oficial de reações adversas está neste link.

O especialista em saúde pública André Peralta Santos confirma à TVI24 que o website referido no segundo documento não é da EMA, ao contrário do que vem referido na página.

De resto, e comparando os dados presentes no website disponibilizado com os dados oficiais, há uma grande diferença. Se o documento distribuído no colégio em causa diz que foram 1.823.219 os casos de reações adversas, os dados da EudraVigilance oficial informam que foram na realidade 572.287 os casos de reações adversas em todos os países abrangidos pela Agência Europeia do Medicamento. Deve ser ainda tido em conta que os dados oficiais datam de setembro, enquanto os do documento são de julho.

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