Desconfinamento: "As pessoas estão a ser pessoas. O risco faz parte da vida" - TVI

Desconfinamento: "As pessoas estão a ser pessoas. O risco faz parte da vida"

Tiago Correia considera que a afluência em massa às esplanadas espelha o desejo da população em "retomar aquilo que era um passado"

Portugal acordou esta segunda-feira, numa nova etapa do combate à pandemia de covid-19. Um "novo normal" mais semelhante ao "passado normal". Esplanadas, ginásios e pequenas lojas reabriram, os alunos do 2.º e 3.º regressaram às escolas e as restrições à circulação voltaram a ser relaxadas.

Muitos foram os que se apressaram para as esplanadas e principais zonas de comércio, um pouco por todo o país. Algo que Tiago Correia, professor de Saúde Internacional do IHMT da Universidade Nova de Lisboa, considera absolutamente normal depois de um período de confinamento tão alargado.

O especialista lembra que “as pessoas estavam sedentas e ansiosas por retomar esta normalidade e é normal que assim". No entanto, o especialista alerta que, nas esplanadas, "vimos pessoas que não faziam parte do mesmo agregado familiar e estavam sem máscara a conviver, a menos de dois metros e à mesa".

Tiago Correia reitera que "tirar a máscara apenas com as pessoas que fazem parte do nosso agregado familiar” é a principal regra para a gestão dos contágios.

Este risco é inerente a tudo isto. Assumiu-se a certa altura que as pessoas iam deixar as suas vidas em suspenso para controlar o vírus e isto, que eu tenha memória, não acontece com mais nenhuma doença das nossas vidas. Sabemos como o HIV se transmite e continua a haver HIV. Sabemos quais são as principais causas do cancro do pulmão e continua a haver cancro do pulmão. Sabemos que não podemos andar em excesso de velocidade e continua a haver excesso de velocidade. O risco faz parte da vida em certo sentido. Aquilo que nós estamos a ver fazer é as pessoas a serem pessoas”, realça Tiago Correia.

O professor salienta que “é preciso continuar a insistir na mensagem”, mas estar ciente de que "vão haver algumas prevaricações".

Tiago Correia teoriza que é provável que se venha a registar um aumento do número de novos casos de covid-19, durante as próximas semanas. Ainda assim, reitera que "neste momento, o desconfinamento terá de prosseguir como está a prosseguir”, lembrando que “a positividade dos testes continua muito baixa”.

Estão a ser pessoas. Estão a conviver. Estão a reviver momentos. Estão a ser pessoas e, portanto, acredito que vá haver um aumento de casos. (...) Portugal não está a seguir e não tem capacidades de seguir uma política de casos zero, tem de seguir uma política de capacidade de ir monitorizando as cadeias de transmissão e fazer com que as cadeias de transmissão se descontrolem. (...) Estou à espera que os casos aumentem nas próximas semanas, mas não estou à espera que o aumento seja muito grande”, explica o especialista.

O professor criticou o "Mapa de Risco", que pode custar medidas extraordinárias aos concelhos que registem mais de 120 casos por 100 mil habitantes. Tiago Correia explica que “são necessárias duas avaliações negativas para que haja uma suspensão do processo de desconfinamento", o que equivale a um período superior a um mês. O especialista sugere que "quando chegamos aos 120 casos por 100 mil habitantes devíamos estar a trabalhar com indicadores a sete dias e não esperar tanto tempo caso seja necessário tomar medidas”.

O catedrático considera que não devem existir "linhas vermelhas" que assentem apenas num único indicador, como o R(t).

O especialista acredita que “não podem ser aplicadas medidas abstratas para realidades concretas", evidenciando que "os autarcas são peças fundamentais para controlar o aumento do R(t)”.

Não há linhas vermelhas, é algo que tenho dito. Fiquei preocupado quando vi no debate público esta ideia de que havia indicadores vermelhos, porque a consequência é aquela a que estamos a assistir: todos os dias andamos a olhar para o R(t). (...) Não é isso que as pessoas precisam. Têm de entender que há conjunto de indicadores, entre os quais está o R(t), e que só podemos tomar decisões através de uma interpretação global”, aponta Tiago Correia.

Em relação às deslocações registadas durante o período da Páscoa, Tiago Correia diz que este é "um enorme ponto de interrogação”. De acordo com as autoridades, cerca de um milhão de pessoas terão passado o período pascal a mais de 100 quilómetros da sua residência.

O especialista salienta ainda a importância de manter algumas medidas como o uso da máscara na rua ou o controlo de fronteiras, sobretudo, tendo em conta a posição geográfica de Portugal que é o ponto de encontro entre três continentes.

Israel está a retomar alguma normalidade, mas não está a abdicar da utilização de máscara na rua e está muito preocupado com as fronteiras. A vacina não é a bala de prata, porque ainda permanecem algumas dúvidas do ponto de vista científico, nomeadamente, na eficácia frente às variantes. (...) Portugal é a porta de entrada para a América, África e Europa. Está no meio de três continentes. Portugal tem de ter uma gestão muito cuidadosa das suas fronteiras”, culmina Tiago Correia.

 

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