Imunidade de grupo com variante Delta só se deve atingir aos 85% de imunização - TVI

Imunidade de grupo com variante Delta só se deve atingir aos 85% de imunização

  • Agência Lusa
  • HCL
  • 29 jun 2021, 07:13

O grande determinante do aumento de doentes em medicina intensiva é o aumento da transmissibilidade do vírus

O médico intensivista José Artur Paiva admitiu que, com a variante delta, a imunidade de grupo só se deverá atingir perto dos 85% e disse que a redução da idade dos doentes internados prova a efetividade das vacinas.

Em declarações à agência Lusa, José Artur Paiva, que pertence à Comissão de Acompanhamento da Resposta Nacional em Medicina Intensiva para a COVID-19, sublinhou que o grande determinante do aumento de doentes em medicina intensiva é o aumento da transmissibilidade do vírus e que quanto mais transmissível for o vírus mais difícil é atingir a imunidade de grupo.

Com esta variante [delta] o atingimento da imunidade grupo não se fará nos tais 70%, mas sim com valores muito perto dos 85% de imunização”, disse, sublinhando a importância de conter o Rt (índice de transmissibilidade).

O especialista em medicina intensiva considera que o processo vacinal em curso "está a ser capaz de ter uma efetividade grande, que se mantém com esta variante [delta], nomeadamente de evitar formas de gravidade moderada ou intensa da doença".

José Artur Paiva recorda que a média de idade nos internamentos diminuiu “por ausência ou franca diminuição dos casos em pessoas mais idosas”, frisando: “A média de idade dos doentes em medicina intensiva é de cerca de 50 anos, francamente mais baixa do que foi nas ondas anteriores”.

Como temos uma maior cobertura vacinal para pessoas com mais de 60 anos e com mais de 50 com outras doenças, e como sabemos que há efetividade das vacinas, mesmo em relação a esta variante que se está a tornar predominante, de facto, temos uma diminuição marcada dos casos graves. É essa a grande proteção que a vacina dá”, afirmou, lembrando que a proteção é conferida com a vacinação completa.

No fundo, acrescentou, “temos uma diminuição marcada [dos internamentos em cuidados intensivos] nessas pessoas mais idosas e até não tão idosas, mas com comorbilidades, e a manutenção de casos com pessoas mais jovens, que sempre existiram”.

José Artur Paiva lembra que com variantes mais transmissíveis, “como um determinado percentual dos casos será sempre grave, o número de hospitalizações e de internados em medicina intensiva fatalmente aumenta”. Contudo, insistiu, “aumenta menos do que aumentaria se não tivéssemos um processo vacinal em curso relativamente avançado".

Sobre o tempo médio de internamento destes doentes, o especialista diz que “ainda é cedo” para tirar conclusões: “Vai ser muito heterogénea. (…) Há casos que respondem rapidamente a formas não invasivas de ventilação e, com poucos dias de estadia, saem. Mas também temos casos que precisam de suportes mais invasivos, até ECMO, e podem ficar muito tempo”.

Recorda que o vírus que provoca a covid-19, como qualquer vírus, “vai sempre adaptar-se e criar maneira de fazer mutações para se tornar mais transmissível”.

Eles precisam das células do hospedeiro e o interesse do vírus não é tornar-se mais agressivo e matar o hospedeiro, mas tornar-se mais transmissível”, acrescentou o especialista, que pertence à direção do colégio da especialidade de Medicina Intensiva da Ordem dos Médicos.

Além do controlo do fator de transmissibilidade e do avanço do processo de vacinação, concluindo-a nas pessoas mais idosas, vulneráveis e com comorbilidades, e avançando depois para os mais jovens, o responsável aponta a necessidade de manter os comportamentos que evitam a transmissão, como o uso de máscara, o distanciamento físico, a desinfeção das mãos e o evitar de agrupamentos de pessoas.

“Isto não quer dizer confinar novamente. Quer dizer saber viver, mas com estes cuidados”.

 

Portugal foi lento na resposta a novas variantes

O médico intensivista José Artur Paiva admite que, pela segunda vez, Portugal foi lento na resposta ao aparecimento de uma nova variante do vírus SARS-Cov2 e defende estudos de sequenciação numa quantidade mais significativa de amostras.

É preciso estar atento ao aparecimento de novas variantes. Pela segunda vez, talvez tenhamos respondido um pouco devagar demais em relação ao aparecimento de uma nova variante: em dezembro, com a variante alfa (a inglesa), e agora, com a delta”, afirmou o responsável, em declarações à agência Lusa.

José Artur Paiva, que faz parte da Comissão de Acompanhamento da Resposta Nacional em Medicina Intensiva para a COVID-19, defendeu a realização de “estudos de sequenciação numa quantidade de amostras mais significativa do que a que atualmente se faz, para perceber melhor o aparecimento e a evolução destas novas variantes”.

Fazendo-o numa amostra não selecionada, mas estando muito atento aos casos de doença que aparecem e que são mais prováveis estar associados a novas variantes, como os que aparecem em pessoas vacinadas, os que aparecem em pessoas que já tiveram covid-19 e estão a ter novamente e até os casos que aparecem com formas atípicas da doença”, acrescentou.

Para o especialista, “um enfoque grande no estudo sequencial deste tipo de casos é uma boa maneira de deteção precoce do aparecimento destas novas variantes”.

O também diretor de serviço de medicina intensiva do Hospital de São João, no Porto, defende a necessidade de pôr a funcionar metodologias “que façam controlo da aquisição de novas variantes”, designadamente os certificados digitais covid-19: “a retoma das viagens tem de estar associada a uma regulação e controlo das pessoas que passam fronteiras”.

Para reduzir o índice de transmissibilidade (Rt), o especialista sublinha ainda a importância de cumprir as regras de etiqueta como o uso da máscara, desinfeção de mãos, distanciamento físico e o evitar de aglomerações, assim como a necessidade de manter elevada a capacidade de testagem e de identificar contactos.

Sobre os doentes internados em cuidados intensivos, que segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde se situam nos 115, José Artur Paiva diz que “não há sobrecarga do sistema”, que a taxa de ocupação mais elevada ocorre na região de Lisboa e Vale do Tejo, que tem entre 75% a 80%, enquanto “as outras regiões do país estão abaixo dos 60%”.

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