"Vão morrer aqui dezenas de pessoas": insegurança e revolta nas prisões portuguesas - TVI

"Vão morrer aqui dezenas de pessoas": insegurança e revolta nas prisões portuguesas

  • Henrique Magalhães Claudino
  • António Vieira
  • 1 abr 2020, 13:59

A TVI falou com um recluso do Estabelecimento Prisional de Lisboa que descreve o ambiente vivido na cadeia, num momento em que a Covid-19 já infetou quatro pessoas no sistema prisional

 

Não há nada aqui, não estão a higienizar nada, nem os guardas prisionais andam com máscaras ou luvas ou desinfetante, ou algo do género”, é desta forma que um recluso do Estabelecimento Prisional de Lisboa, em Alcoentre, responde quando inquirido sobre as medidas que a cadeia está a tomar para prevenir um possível surto de Covid-19

Em entrevista por telefone à TVI, “Vasco” admite que há um sentimento generalizado de medo, insegurança e revolta. Esta terça-feira, os reclusos de Alcoentre recusaram o pequeno almoço por este motivo.

A Covid-19 já chegou às prisões portuguesas e já infetou quatro pessoas: uma mulher que foi detida quando tentava entrar em Portugal com um quilo de cocaína, dois guardas prisionais e uma auxiliar de ação médica.

A TVI obteve imagens do interior da prisão de Custóias, onde foi confirmada a infeção de um guarda prisional, que mostra precisamente o ambiente de insegurança e revolta descrito por “Vasco”. Naquele que é o maior estabelecimento prisional português, é possível ouvir “vamos embora” e “liberdade”.

 

O mau estar nas prisões portuguesas está a crescer e nas redes sociais multiplicam-se o vídeos de protesto. A TVI teve acesso a imagens em que dois reclusos do Estabelecimento Prisional de Coimbra protestam contra a falta de condições e pedem que sejam abertas as portas das cadeias antes que uma catástrofe possa acontecer.

O que nos estão a fazer é desumano, não há prevenção, nem cuidados, os guardas estão sem máscara. Se o Estado não tem condições para nos garantir a segurança, tem de nos abrir a porta. Nós errámos, estamos a pagar pelos nossos erros, mas estamos a falar de uma pandemia internacional. Se isto entra nas cadeias estamos condenados à morte”, afirma um dos reclusos. 

 

O alastramento da Covid-19 nas prisões conduziria a uma situação devastadora, por essa razão, a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, admitiu esta segunda-feira que uma das medidas pode passar pela libertação de alguns reclusos. A decisão será tomada esta semana quando o Governo fizer a avaliação da execução das medidas implementadas durante o estado de emergência.

Para evitar o contágio em larga escala dentro das prisões, as Nações Unidas pediram ao aos Estados-membros para libertarem os reclusos mais vulneráveis, ou seja, todos os que têm problemas de saúde, os mais velhos e os que estão em final de pena devem regressar a casa.

Sem o material de higienização normal nós sentimo-nos inseguros, claro. E essa insegurança é maior porque há pessoas que vêm do exterior para aqui trabalhar, qualquer uma dessas pessoas pode trazer consigo o vírus”, explica “Vasco”, sublinhando que existem vários reclusos dentro do Estabelecimento Prisional de Lisboa com graves problemas de saúde. 

 

Há muitas pessoas que já foram toxicodependentes e que têm o sistema imunitário em baixo. Se alguém apanha essa doença, vão morrer aqui dezenas de pessoas num instantinho”, afirma. 

Vítor Ilharco, representante da Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso, compreende as preocupações e protestos, mas apela à calma dentro das prisões portuguesas.

Penso que são situações de risco muito elevado e que deviam ter sido levados em conta há mais tempo. Isso não foi possível, mas agora temos de esperar que nos próximos dias isso esteja resolvido”, afirma Vítor Ilharco, pedindo serenidade aos reclusos. 

A Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais distribuiu na terça-feira vinte mil máscaras pelas prisões e hospital prisional, uma quantidade que parece insuficiente para uma população que está sentada sobre um barril de pólvora. 

Tranquiliza-nos finalmente que a ministra da Justiça entenda a necessidade do uso da máscara por parte do corpo da Guarda Prisional”, afirma Jorge Alves do Sindicato Nacional da Guarda Prisional, explicando que o Sindicato já tinha alertado no dia 6 de março para a necessidade da  utilização de luvas e máscaras e da medição da temperatura aos funcionários. “Algo que não está a acontecer, mas não é só isso, não há gel desinfetante”.

As denúncias do Sindicato surgem num momento em que a TVI apurou que 25 reclusas foram colocadas em quarentena depois do surgimento de um caso suspeito de Covid-19 - uma reclusa que trabalha na cozinha - , na cadeia de Santa Cruz do Bispo, em Matosinhos. Os resultados da análise ainda não são conhecidos.

Continue a ler esta notícia