Ministro da Cultura demite diretora-geral das Artes por "perda de confiança política" - TVI

Ministro da Cultura demite diretora-geral das Artes por "perda de confiança política"

  • AM (atualizada às 17h15)
  • 4 mai 2018, 11:54
Luís Filipe Castro Mendes

Em comunicado, Luís Filipe Castro Mendes diz que o "Ministério tomou conhecimento de factos que tornam incompatível a manutenção de Paula Varanda no cargo"

O Ministério da Cultura anunciou, esta sexta-feira, ter cessado as funções da diretora-geral das Artes, Paula Varanda, por "perda de confiança política".

"O Ministério da Cultura tomou a decisão de determinar a cessação de funções da Diretora da Direção-Geral das Artes, Paula Varanda, por perda de confiança política. O Ministério da Cultura tomou conhecimento de factos que tornam incompatível a manutenção de Paula Varanda no cargo Diretora-Geral das Artes", pode ler-se no comunicado do ministério de Luís Filipe Castro Mendes, sem acrescentar mais detalhes.

Para além do comunicado, o responsável pela pasta da Cultura já falou aos jornalistas, em Évora, à margem da cerimónia de apresentação do trajeto entre esta cidade alentejana e Trancoso, no distrito da Guarda, dos Caminhos de Santiago – Via Portugal Nascente.

“Foi descoberto e nós não sabíamos, o ministro não sabia e o secretário de Estado não sabia que a diretora-geral tinha feito determinadas atividades com instituições que eram tuteladas pela sua direção-geral”, declarou o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes em Évora.

O governante sublinhou que, “independentemente do que se vier a apurar”, houve “uma quebra de confiança política”, por não ter sido dado “conhecimento prévio das atividades artísticas que a diretora-geral exercia”.

Realçando que “a decisão foi tomada imediatamente”, o ministro considerou que, “havendo uma presunção de uma incompatibilidade” que não tinha sido comunicada, “não havia confiança política”.

“Trata-se de uma questão política. Não há aqui nenhuma qualificação dos factos, há apenas um juízo político que o exercício dessas atividades por parte da diretora-geral deveria ter sido comunicado aos membros do Governo”, insistiu.

Castro Mendes acrescentou que “essa incompatibilidade deriva do facto de, ao assumir as funções de diretora-geral, [Paula Varanda] não ter quebrado os seus vínculos com a organização artística que dirigia”.

O Governo realça que "todos os trabalhos em curso sob responsabilidade da Direção-Geral das Artes deverão decorrer dentro da normalidade e dos prazos previstos". 

No mesmo comunicado, o Ministério da Cultura anunciou ainda que vai pedir à Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP) para que seja aberto concurso para o cargo.

Em resposta à Lusa, fonte da tutela indicou que “o Ministério da Cultura teve conhecimento [desta situação] recentemente”.

Em causa, segundo uma investigação do programa Sexta às Nove, da RTP, estará a ligação de Paula Varanda à Dansul – Dança para a Comunidade no Sudeste Alentejano, uma associação com sede em Mértola, no Alentejo, fundada em 2001, à qual a diretora-geral das Artes continua ligada, mesmo após a sua entrada em funções na DGArtes.

A Lusa contactou Paula Varanda, mas a responsável remeteu eventuais declarações para mais tarde.

Paula Varanda era diretora-geral das Artes desde 1 de junho de 2016, tendo sucedido a Carlos Moura Carvalho e sido nomeada já pela atual equipa governativa da Cultura. Doutorada em Estudos Artísticos e Humanidades pela Universidade de Middlesex, em Londres, publicou artigos e livros de “crítica e análise de espetáculos e projetos artísticos e culturais”, segundo a biografia disponível na página da Direção-Geral das Artes (DGArtes).

“Fez também direção artística e gestão de projetos nas artes performativas (1994-2016) e foi assessora do Instituto da Artes para o planeamento, execução e avaliação de mecanismos de apoio ao sector profissional (2004-2007)”, acrescenta a mesma biografia.

Na sequência da sua entrada em funções, Paula Varanda disse à Lusa que pretendia lançar uma reflexão sobre os critérios e a forma de distribuição dos apoios às artes, para apurar se são adequados às necessidades do setor.

A DGArtes esteve no centro da polémica recente sobre o novo modelo de apoio às Artes, que levou a uma forte contestação por parte do setor depois de serem conhecidos os resultados provisórios do programa de Apoio Sustentado.

Os concursos do programa de Apoio Sustentado, para os anos de 2018-2021, partiram com um montante global de 64,5 milhões de euros, em outubro, subiram aos 72,5 milhões perante protestos do setor e, dias mais tarde, o Governo anunciou novo reforço para um total de 81,5 milhões de euros.

Os reforços foram anunciados no contexto de ampla contestação, desde associações a estruturas isoladas, passando pelos sindicatos da área, que questionavam os critérios usados pelos júris, para os primeiros resultados provisórios, na base da exclusão de companhias com décadas de existência e com um passado de apoios públicos.

O Programa de Apoio Sustentado às Artes 2018-2021 envolve seis áreas artísticas - circo contemporâneo e artes de rua, dança, artes visuais, cruzamentos disciplinares, música e teatro – tendo sido admitidas a concurso, este ano, 242 das 250 candidaturas apresentadas.

De acordo com o calendário da DGArtes, os resultados definitivos para a área do teatro – a única que falta - deverão ser conhecidos em breve, uma vez que foi a disciplina com maior número de candidaturas (90).

PSD quer ouvir Paula Varanda no Parlamento

O PSD já pediu a audição parlamentar de Paula Varanda, com caráter de urgência, depois de o Ministério da Cultura ter anunciado a cessação das funções da diretora-geral das Artes por “perda de confiança política”.

Em requerimento dirigido à presidente da Comissão parlamentar de Cultura, a socialista Edite Estrela, o PSD considera que a decisão hoje anunciada “assume particular gravidade” por acontecer no momento “em que estão a ser noticiados os resultados finais do processo de candidaturas ao programa de Apoio Sustentado para o novo ciclo de dois e quatro anos”.

“Sem dúvida mais um episódio que, de forma inequívoca, torna clara a incapacidade e o fracasso da política cultural deste Governo”, refere o requerimento dos sociais-democratas.

Por considerarem que “importa clarificar as razões que levaram a esta demissão”, o grupo parlamentar do PSD “requer, com a maior brevidade possível” a audição da Diretora-Geral das Artes, Paula Varanda.

REDE diz que Paula Varanda é um "bode expiatório"

A REDE - Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea considera que a diretora-geral das Artes, Paula Varanda, pode ser "um bode expiatório" no processo de atribuição de apoios às artes, que motivou protestos dos artistas em março.

Contactada pela agência Lusa, a presidente da associação, Tânia Guerreiro, viu com surpresa a demissão da responsável por perda da confiança política, hoje anunciada, pelo Ministério da Cultura.

"Ainda não temos a informação toda, mas esta questão da acumulação de funções não nos parece ser significativo. Parece uma desculpa", comentou a responsável da REDE, acrescentando que "o mais importante é uma mudança da política cultural".

Sindicato espera rápida nomeação da direção da DGArtes para rever modelo de apoios

O Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA/STE) defendeu hoje que deve ser nomeada uma nova Direção-geral das Artes (DGArtes) para que seja prosseguido "o compromisso de rever o modelo de apoio às artes".

Contactado pela agência Lusa, André Albuquerque, da direção do CENA/STE, desvalorizou a demissão de Paula Varanda, de diretora-geral das Artes: "Não centramos as questões nas pessoas, mas nas políticas culturais".

"Esperamos que rapidamente surja uma nova direção para que, assim que terminem os atuais concursos, seja realizado um diálogo para rever o novo modelo de apoio às artes", que foi fortemente contestado nos últimos meses.

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