Tribunal de Contas volta a chumbar Empresa de Cultura do Porto - TVI

Tribunal de Contas volta a chumbar Empresa de Cultura do Porto

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  • 4 jun 2018, 14:10
Rui Moreira

Juízes recusam visto pela segunda vez à criação da empresa por não ser “tendencialmente autossustentável”, devido à “insuficiência do estudo de viabilidade económica” e a “violações do regime jurídico de atividade empresarial”

O Tribunal de Contas (TdC) chumbou pela segunda vez a Empresa Municipal de Cultura do Porto (EMCP) por não ser “tendencialmente autossustentável”, devido à “insuficiência do estudo de viabilidade económica” e a “violações do regime jurídico de atividade empresarial”.

O acórdão de 29 de maio, publicado hoje na página da Internet do TdC, justifica a nova “recusa de visto à minuta de deliberação de criação da EMCP”, com base na “nulidade da minuta, quer por força de insuficiência do estudo sobre viabilidade económico-financeira, em violação das disposições conjugadas […] do Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local e das Participações Sociais (RJAEL), quer porque a empresa que se pretende criar não é ‘tendencialmente autossustentável’, conforme exigido […] no RJAEL”.

No documento a que a Lusa teve acesso, os juízes acordaram “em negar provimento ao recurso” apresentado em março pela Câmara do Porto, alertando que “não tem razão” a autarquia “quando alega que o estudo evidencia que a empresarialização da gestão de cultura da cidade é inequivocamente melhor do que a situação atual”.

O estudo de viabilidade económico-financeira (EVEF) não apresenta quaisquer demonstrações quanto à eventual mais-valia de desenvolvimento da atividade cultural do Porto através de empresa local, em vez da gestão direta municipal”, diz o TdC.

Segundo o tribunal, o EVEF “parte de um preconceito no sentido de que a criação da EMCP é a única solução possível”, acabando “por influenciar negativamente todo o seu conteúdo”.

O acórdão dá “provimento parcial ao recurso” do município “quanto à intervenção do presidente da câmara [o independente Rui Moreira] no procedimento de criação da EMCP”, porque o “impedimento verificado não constitui, no caso em apreço, motivo de recusa de visto”.

O visto é recusado com base noutros fundamentos, com o TdC a destacar que “não assiste razão” à câmara “quando alega que ‘não compete ao tribunal avaliar a qualidade ou bondade do estudo [económico-financeiro]’, pois ‘essa é uma questão de mérito e não de legalidade’”.

O TdC acrescenta que, “na análise de verificação dos requisitos legais” para a criação da EMCP, “não pode limitar-se a confirmar a existência formal, no processo, de um documento intitulado ‘Estudo de Viabilidade – EMCP’”.

O tribunal está, “antes, obrigado a analisar a confirmação substancial do seu conteúdo”.

Para o TdC, não tem “qualquer sentido a conclusão” da autarquia de que “a atuação” daquele órgão “representa uma ‘inconstitucionalidade por violação do princípio da exclusividade constitucional da competência dos órgãos de soberania’”.

“A recorrente parece não entender o alcance do artigo 23.º, n.º 2, do RJAEL que, ao atribuir ao TdC a competência para fiscalizar previamente a criação de empresas municipais, prevê expressamente que essa fiscalização abrange a análise dos estudos previstos”, descreve.

Os juízes conselheiros alertam que têm “obviamente que avaliar o conteúdo” dos estudos “à luz dos requisitos legalmente fixados” e que “concretizam os parâmetros a que os estudos devem dar resposta, para que possam ser legalmente satisfatórios”.

Para o TdC, o Estudo de Viabilidade Económico-Financeira (EVEF) apresentado pela câmara apresenta “inúmeras deficiências significativas”.

Estas, “nos termos do n.º 1 do artigo 32.º do RJAEL, constituem motivo de nulidade da minuta de deliberação da criação da EMCP”.

Aprovada em julho de 2017 em reunião camarária, a EMCP foi contestada pelo PS, PSD e CDU, designadamente por ter sido apresentada a dois meses das eleições autárquicas. A câmara pretende, entre outros aspetos, que a empresa assegure a gestão e programação do Cinema Batalha, Galeria Municipal do Porto e respetivo auditório, Teatro do Campo Alegre, Teatro do Rivoli e Teatro Sá da Bandeira.

Rui Moreira vai recorrer ao Tribunal Constitucional

O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, já anunciou que vai recorrer ao Tribunal Constitucional (TC).

O autarca revelou também que já colocou à consideração do Primeiro Ministro, António Costa, “uma nova iniciativa legislativa urgente que, sem margens para dúvidas, torne ainda mais claro o alcance da norma que exceciona as empresas municipais de cultura”, considerando ainda que a interpretação do TdC é “inconstitucional por ser discriminatória”.

“Cumprindo o mandato que possuo e as deliberações municipais que a seu tempo foram tomadas, cabe-me representar o município em juízo e fora dele. Vou, por isso, remeter a decisão para recurso ao Tribunal Constitucional”, revelou Rui Moreira.

Partido Socialista culpa Câmara 

O PS considerou que o chumbo do Tribunal de Contas à Empresa Municipal de Cultura do Porto (EMCP) resultou de um processo conduzido “à pressa” e de “forma leviana” pela maioria de Rui Moreira na Câmara do Porto.

Em comunicado, os vereadores socialistas na Câmara do Porto mostram-se “disponíveis para trabalhar numa alternativa” à EMCP, que a Lusa hoje divulgou ter sido chumbada pela segunda vez pelo TdC, por não ser “tendencialmente autossustentável”, devido à “insuficiência do estudo de viabilidade económica” e a “violações do regime jurídico de atividade empresarial”.

Para os socialistas, “a deliberação hoje conhecida é o corolário lógico de um processo conduzido de forma leviana pelo executivo municipal”.

“A pressa de aprovar a criação da empresa a poucas semanas do fim do [anterior] mandato, levou a que não fosse acautelado o respeito pelas normas legais a que obedece a criação de uma empresa municipal”, observam.

A vereação socialista assinala também que “o próprio estudo económico” que serve de base à EMCP “sofre de sérias insuficiências.

“O PS chamou a atenção para estes problemas ao longo de todo o processo, mas o executivo municipal, de forma autossuficiente, recusou-se a ouvir os alertas e as propostas apresentadas”, lamentam.

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