Ex-autarca condenado a dois anos e meio de pena suspensa por prevaricação - TVI

Ex-autarca condenado a dois anos e meio de pena suspensa por prevaricação

  • AM - Notícia atualizada às 20:49
  • 1 mar 2017, 16:35
Justiça (iStockphoto)

Ex-presidente da Câmara do Entroncamento já informou que vai recorrer do acórdão do Tribunal de Santarém

O Tribunal de Santarém condenou, esta quarta-feira, o ex-presidente da Câmara do Entroncamento, Jaime Ramos, a uma pena de prisão, suspensa, de dois anos e seis meses por prevaricação no exercício de cargo público.

A juíza considerou “grave” que alguém que deve garantir o tratamento igual de todos os cidadãos tenha deixado prescrever uma contraordenação, levantada em 2008 a uma empresa por ocupação ilegal do espaço público, alegando o uso de “bom senso”.

A aplicação de uma pena próximo do mínimo previsto no âmbito deste crime (dois a oito anos de prisão) e a decisão de suspensão deveram-se ao facto de “não haver mais nada a apontar” ao ex-autarca, que não tem antecedentes criminais, e de ter sido descrito pelas testemunhas como uma pessoa “leal”.

Os dois outros arguidos no processo, o antigo diretor do departamento de Urbanismo e Obras Públicas da Câmara do Entroncamento e o sócio-gerente de um gabinete de projetos acusado de cumplicidade no crime de abuso de poder praticado pelo funcionário do município, foram absolvidos por não terem sido provados perante o tribunal os factos de que vinham acusados.

O ex-presidente considerou que a decisão "é injusta" e vai recorrer da mesma para a Relação.

Aquilo que fiz foi da forma que considerava ser a mais correta, no sentido da equidade para com o cidadão, nunca lesando o interesse público”, declara Jaime Ramos num comunicado enviado hoje à agência Lusa.

Perante esta decisão do tribunal, que considero inadequada e incompreensível, começa amanhã o prazo para recorrer para o Tribunal da Relação. Vou claramente recorrer e sei que, analisados os factos e o processo, de forma cabal perceber-se-á que o cidadão, enquanto Presidente de Câmara, fez tudo pela honra e pelo bom nome do Município, nunca manchando o nome desta terra nem a sua vida pessoal”, escreve Jaime Ramos, reafirmando que nunca beneficiou “quem quer que seja”.

Sublinhando que, em 65 anos de vida, foi a primeira vez que foi a Tribunal como réu num processo, Jaime Ramos afirma que a empresa de construção que o acórdão lido hoje afirma ter beneficiado foi antes obrigada a diminuir o número de fogos e de espaço para comércio inicialmente previsto.

Refere ainda que, quando assumiu a presidência do município, em janeiro de 2002, já a autarquia devia àquela empresa “mais de 70.000 euros” por obras feitas e não pagas e que a vedação que esteve na origem do processo foi feita para salvaguardar a zona de obra dos assaltos de que vinha sendo alvo e que foi o próprio município a pedir que o material usado fosse de qualidade.

Quando me chegou às mãos o auto de notícia dos serviços sobre tal ocupação ilegal, percebendo ‘a priori’ que as áreas descritas eram manifestamente superiores à realidade e sabendo da enorme dívida que o Município tinha à empresa, dei despacho à informação dos serviços e solicitei ainda que fosse realizada uma reunião com o responsável da referida empresa para resolver a contenda”, explica.

Jaime Ramos reafirma que desconhecia que deveria ter nomeado um instrutor para o processo, facto determinante para a sua condenação.

Não me condenam por mais nada, nem me acusam do que quer que seja para além disto. Aliás, referem mesmo que esta pena, próxima do mínimo que se pode aplicar, surge por ‘não haver mais nada a apontar’ à minha conduta. Recorro de uma condenação injusta porque a minha honra e a dos colaboradores do Município foram postas em causa e a honra estará sempre acima de tudo”, escreve ainda.

Jaime Ramos vinha acusado de, ao deixar prescrever a coima, ter beneficiado uma empresa de construção civil que foi alvo de uma contraordenação por parte dos serviços do município a que presidia, por ocupação indevida de espaço público ao erigir uma vedação sem o respetivo licenciamento.

Jaime Ramos disse durante o julgamento que a coima a aplicar à empresa, que poderia variar entre os 200 e os 3.500 euros, prescreveu porque desconhecia a existência de prazos para nomear um instrutor do processo, sublinhando que procedeu como em todos os outros processos, remetendo para os serviços, que nunca o alertaram para o risco de prescrição.

O tribunal entendeu que o ex-autarca não podia invocar desconhecimento, tanto mais que “era presidente da Câmara há seis anos”.

Segundo a acusação, ao invés de dar seguimento ao processo contraordenacional, Jaime Ramos, por duas vezes, com um intervalo de dois anos, despachou o agendamento de uma reunião com os responsáveis dos serviços de obras.

Jaime Ramos afirmou durante o julgamento que havia divergências no seio dos próprios serviços quanto à dimensão da área pública ocupada e que a vedação construída pelo empreiteiro resultara de um pedido verbal do próprio município, tendo em conta os problemas de segurança que afetavam a urbanização, além de existirem dívidas da autarquia à empresa (da ordem dos 70.000 euros) que remontavam a anteriores mandatos, pelo que tentou agir com “bom senso”.

Sublinhando o “percurso de vida imaculado”, tanto quando exerceu funções como bancário, como nos 20 anos em que ocupou funções no município, primeiro como vereador na oposição e depois como presidente (de 2001 a 2013), como atualmente, enquanto presidente do Museu Nacional Ferroviário, Jaime Ramos afirmou então que lhe “doía” ouvir o Ministério Público dizer que procurou beneficiar alguém.

O tribunal entendeu que a sua obrigação era de agir com isenção, imparcialidade e igualdade de tratamento para com todos os cidadãos.

O crime de prevaricação no exercício de cargo público

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