Família acusada de escravizar homem enfrenta Justiça - TVI

Família acusada de escravizar homem enfrenta Justiça

Alentejo [Reuters]

Durante 26 anos, um angolano trabalhou numa herdade perto de Évora, sem nunca ter conhecido a cidade. Não tinha dinheiro, nem identificação. A família que o mantinha consigo, começou a responder em tribunal

À porta fechada, pai, mãe e dois filhos começaram a ser ouvidos no Tribunal de Évora. São acusados pelo Ministério Público de escravizar um homem durante 26 anos, numa propriedade agrícola do concelho.

Durante a manhã desta quinta-feira, apenas um dos um dos arguidos, o pai, prestou declarações perante o coletivo de juízes, sendo que o advogado de defesa garante que "todos já disseram que querem falar sobre o assunto”.

Os meus clientes, tanto quanto sei, recusam a prática dos factos que lhes são imputados”, disse aos jornalistas, Sidónio Santos, advogado da família acusada pelo Ministério Público.

Os quatro arguidos estão acusados pelo MP, em coautoria e sob a forma consumada, da prática de um crime de escravidão e de um crime de tráfico de pessoas, enfrentando ainda os dois filhos a acusação, cada um, de um crime de detenção de arma proibida.

Fontes judiciais revelaram à Agência Lusa que existe ainda um pedido de indemnização cível no valor de 30.468 euros.

Escravidão, libertação e morte 

O caso remonta a 2013 e a investigação esteve a cargo da Unidade Nacional de Combate ao Terrorismo da Polícia Judiciária.

Na altura, o homem alegadamente escravizado, de 63 anos e de nacionalidade angolana, foi resgatado pela GNR, após uma denúncia, segundo fontes judiciais e policiais.

A alegada vítima, acrescentaram as mesmas fontes, foi encaminhada para uma instituição que acolhe vítimas de tráfico de pessoas. Morreu em novembro do ano passado, vítima de doença prolongada.

Na acusação, o MP refere que, durante os cerca de 26 anos” que trabalhou “por conta dos arguidos e sob a sua subordinação”, o homem “teve a sua vivência reduzida à herdade”.

Não conheceu Évora, não passeava uma vez que não tinha dinheiro, não convivia com ninguém, não mais tendo estabelecido qualquer contacto com a sua família”, refere o despacho de acusação.

Os arguidos nunca pagaram ao ofendido qualquer montante pecuniário ou outro pela sua prestação laboral, aproveitando-se da modesta situação social, económica, cultural e familiar daquele”, diz o Ministério Público.

O “poder dos arguidos”, pode ler-se na acusação, “advinha do facto de o ofendido se encontrar em território desconhecido, sem apoio da família”, e “de terem criado um clima de intimidação através da retirada dos documentos de identificação e de ameaças à sua liberdade”.

Agiram, em comunhão de esforços e de identidade de fins, com intenção de causarem receio ao ofendido”, sustenta a acusação, acrescentando que o homem foi constrangido "a trabalhar e a viver sem o mínimo de condições de habitabilidade, higiene alimentação, trabalho e convivência, apropriando-se das contraprestações financeiras do trabalho prestado” pela vítima, que reduziram “a ‘coisa’ sua”.

 

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