Salvou-se do fogo, mas 39 dias depois ainda não tem a certeza do que aconteceu ao irmão - TVI

Salvou-se do fogo, mas 39 dias depois ainda não tem a certeza do que aconteceu ao irmão

Incêndios - Penacova

Dois irmãos da localidade de Vale do Laço, concelho da Sertã, subiram ao sobrado da casa onde viviam para a tentar salvar. Mal pisaram as tábuas, estas cederam. O mais velho caiu e até hoje não há certezas absolutas sobre o que lhe aconteceu

No último dia 15 de outubro, o pior dia do ano em termos de incêndios, o fogo tomou conta da região da Sertã, obrigou à evacuação de aldeias inteiras e levou a atitudes desesperadas.

Nesse dia, o fogo atacou a habitação de dois irmãos de 74 e 50 anos. Os dois carregaram baldes de água até ao sobrado da casa, onde já andava o lume. Mal subiram, de acordo com o  que o homem mais novo conseguiu contar, as tábuas do sótão cederam e o mais velho caiu.

O irmão mais novo assistiu a tudo. Ainda tentou agarrá-lo pela mão, mas não conseguiu segurá-lo”, conta António Simões, adjunto do presidente da Câmara da Sertã, em declarações à TVI.

Até hoje, não há certezas absolutas sobre o que aconteceu ao homem de 74 anos, que permanece dado como desaparecido.

Há uma grande probabilidade de ter ficado carbonizada e de a violência do fogo não ter deixado vestígios. A Polícia Judiciária, a GNR, acompanhadas de funcionários operacionais autárquicos, fizeram buscas nos destroços da casa. Encontraram a fivela do cinto que o homem usava na altura, mas não encontraram vestígios do cadáver.”

António Simões diz que o local foi na altura selado e as buscas foram dadas por encerradas. “Aqui não há casos de vítimas mortais, na sequência dos fogos. Mas há o caso deste homem, que está dado como desaparecido”, resume o autarca da Sertã.

O irmão mais novo, surdo-mudo, sobreviveu à tragédia, com queimaduras. Está alojado em casa de familiares. Mas o trauma de ter visto o irmão desaparecer e não ter conseguido salvá-lo, esse permanece.

O caso do homem de Vale do Laço é um dos dois dados como desaparecidos na sequência dos fogos de 15 de outubro. Em Folgosinho, distrito da Guarda, nada se sabe de Rui Costa, de 49 anos.

A família mantém a esperança de o encontrar com vida. Na última segunda-feira, a irmã, Célia Costa, divulgou um apelo desesperado no Facebook.

Na esperança de que tenha fugido, e eventualmente esteja em estado de choque, a família publica esta comunicação com o objetivo de fazer chegar o pedido de ajuda ao máximo de pessoas possível nas redes sociais.”

A TVI contactou a Proteção Civil, a GNR e a Polícia Judiciária, que não adiantaram, até ao momento, mais pormenores sobre nenhum dos dois casos.

Fonte dos bombeiros de Folgosinho confirma que, depois dos fogos, Rui Costa foi procurado pela GNR, que entretanto suspendeu as buscas. “A PJ também já cá andou, com a ajuda dos bombeiros, mas creio que não foi encontrada qualquer pista”, acrescentou a mesma fonte.

Impasses legais

Não estão na lista de feridos. Não estão na lista das vítimas mortais. Isso mantém acesa a réstia de esperança de familiares e amigos. Mas, além da dor de não saberem o que aconteceu realmente a estes dois homens, as famílias deparam-se agora com verdadeiros impasses legais. Desde logo questões ligadas a processos indemnizatórios.

O Governo já anunciou que vai indemnizar as famílias das vítimas mortais e também os feridos dos fogos. O processo de apresentação de requerimentos para se ter acesso a essas indemnizações inicia-se dentro de semanas, mas estas famílias estão à partida excluídas, já que estes homens, igualmente vítimas da tragédia, estão legalmente dados como “desaparecidos”.

O advogado Pedro Proença lembra que “não havendo provas de que a pessoa morreu, têm de decorrer prazos, que variam consoante a idade dos desaparecidos, mas são, por norma, prazos muito longos”.

A morte presumida é declarada após 10 anos, desde as últimas notícias obtidas, ou cinco se o desaparecido completar entretanto 80 anos.

Só quando terminar este prazo é que se pode fazer uma eventual habilitação de herdeiros e respetiva distribuição de uma eventual herança. E isto ainda com a condicionante que, se, depois disso, a pessoa entretanto aparecer, tem o direito a exigir a reposição dos bens, tal como estavam à data da presunção da morte”, explica.

O caso das indemnizações é ainda mais complexo: os prazos para se requerer uma indemnização do Estado é menor do que o prazo para se declarar a morte presumida. Ou seja, “terá de ser, à posteriori, o tribunal a decidir se o prazo que a família aguardou até à declaração de morte presumida anula ou não os prazos para uma indemnização do Estado.

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