Ricardo Salgado condenado a pagar 3,7 milhões de euros - TVI

Ricardo Salgado condenado a pagar 3,7 milhões de euros

  • 30 abr 2018, 15:46

Morais Pires terá de pagar 350 mil euros e fica inibido de exercer durante um ano

Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires foram condenados pelo Tribunal da Supervisão ao pagamento de 3,7 milhões e 350 mil euros, respetivamente, vendo assim a pena reduzida.

Os dois tinham sido condenados pelo Banco de Portugal ao pagamento de 4 milhões e de 600 mil euros, respetivamente, mas em dezembro, o Ministério Público pediu a redução das coimas aplicadas a Ricardo Salgado, de 4 para 3,5 milhões de euros, e ao ex-administrador Amílcar Pires, de 600.000 para 300.000 euros, por entender não ter ficado provado que este atuou com dolo, mas sim de forma negligente, e considerar alguns atenuantes em relação ao antigo presidente do BES.

Agora, os dois viram a coima reduzir, mas não para o valor pedido pelo Ministério Público: Salgado terá de pagar 3,7 milhões e Amílcar Morais Pires 350 mil euros.

Para além das coimas, o ex-presidente do BES fica proibido de exercer cargos de direção no setor financeiro e bancário durante 8 anos enquanto Amílcar Morais Pires, antigo administrador, fica proibido durante um ano.

Em causa no processo estão as contraordenações aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP), em agosto de 2016, nomeadamente por comercialização de títulos de dívida da Espírito Santo Internacional junto de clientes do Banco Espírito Santo (BES).

O julgamento iniciou-se a 06 de março de 2017 no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, e apreciou os pedidos de impugnação apresentados por Ricardo Salgado e Amílcar Pires no âmbito de um processo que começou por ter 18 arguidos (15 singulares e três coletivos), 13 dos quais alvo de coimas.

Ricardo Salgado foi condenado ao pagamento de 4 milhões de euros e ficou impedido de exercer cargos no setor por 10 anos como resultado da aplicação de cinco coimas por não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados, por não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, por atos dolosos de gestão ruinosa, praticados em detrimento dos depositantes, investidores e demais credores, por prestação de falsas informações ao BdP, por violação das regras sobre conflitos de interesses.

O TCRS considerou hoje ter ficado "globalmente demonstrada a matéria factual" contida na decisão do BdP, reduzindo a coima única aplicada a Ricardo Salgado para 3,7 milhões de euros e o período de inibição de cargos no setor para oito anos.

Amílcar Morais Pires foi alvo de duas contraordenações por não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados e não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros. O tribunal aplicou uma coima única de 350.000 euros e reduziu o período de inibição para um ano.

A juíza Anabela Campos concedeu um prazo de 40 dias para recurso, dada a complexidade do processo.

Salgado vai recorrer da decisão

A defesa de Ricardo Salgado vai recorrer da decisão proferida hoje pelo Tribunal da Supervisão, em Santarém. Para Francisco Proença de Carvalho, a decisão proferida pela juíza Anabela Campos, do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), “não reflete o que se passou no julgamento”.

O advogado declarou a sua “preocupação” por, “aparentemente”, o procedimento do Banco de Portugal, que “primeiro anunciou uma decisão condenatória e depois fez um processo”, não ser “um problema para a justiça portuguesa”.

Por outro lado, apontou “o procedimento que está a decorrer sobre eventual coação sobre testemunhas neste processo”, pedindo que seja apurada “toda a verdade para que se possa fazer um julgamento justo e seguindo todas as regras”.

Francisco Proença de Carvalho referia-se ao processo de inquérito que corre no Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, na sequência da extração de declarações de José Castella, antigo responsável financeiro do Grupo Espírito Santo, feita a pedido do Ministério Público, por ter afirmado, no seu depoimento como testemunha neste processo, ter sido alvo de coação durante a inquirição pelo Banco de Portugal, em setembro de 2014.

A audiência de hoje começou precisamente por um despacho da juíza indeferindo um requerimento da defesa de Ricardo Salgado, que pedia a suspensão do presente processo por um ano, dado estar a decorrer esse inquérito, por factos que considera “gravíssimos”.

Na decisão proferida hoje, de que a juíza leu apenas a parte dispositiva, pedindo dispensa da leitura das 1.150 páginas da sentença, Anabela Campos considerou “globalmente demonstrada" a matéria de facto enunciada na decisão do BdP.

No caso de Ricardo Salgado, confirmou a prática de cinco contraordenações, a título doloso direto, que culminou na coima única de 3,7 milhões de euros e inibição do exercício de cargos no setor financeiro por oito anos.

As coimas referem-se à não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados (400.000 euros), não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros (400.000 euros), a atos dolosos de gestão ruinosa, praticados em detrimento dos depositantes, investidores e demais credores (1,9 milhões de euros), a prestação de falsas informações ao BdP (1 milhão de euros) e violação das regras sobre conflitos de interesses (700.000 euros).

Nas alegações finais, a procuradora do Ministério Público entendeu não ter ficado provado que Amílcar Pires atuou com dolo, mas sim de forma negligente (confirmado hoje na sentença, que, ainda assim, aplicou uma multa superior à pedida pela procuradora), e considerou alguns atenuantes para uma redução da coima aplicada a Ricardo Salgado dos 4 milhões de euros da decisão administrativa para 3,5 milhões de euros, acompanhada do pedido de uma suspensão em um terço (a que a juíza não atendeu), mantendo o pedido de sanção acessória de inibição do exercício de cargos no setor durante 10 anos e de publicitação.

Francisco Proença de Carvalho afirmou confiar “que isto seja só uma fase” no processo, adiantando que, após conhecer os fundamentos da decisão, haverá recurso para a Relação.

“Espero sinceramente que a justiça saiba ser imune ao que tem sido todo este cenário à volta do dr. Ricardo Salgado. Ele merece uma justiça tão isenta como qualquer cidadão português, é a única coisa que pede”, declarou.

A reação de Morais Pires

Depois de conhecida a sentença de um ano sem exercer e obrigação de pagamento de 350 mil euros, Morais Pires criticou a decisão do Tribunal e mostrou-se disponível para voltar a trabalhar na banca.

"Hei-de voltar a trabalhar logo que estes recursos funcionem e se volte a repor a verdade nestes dossiês. Tem-se feito muita calúnia, muita mentira à volta dos processos, e nomeadamente sobre a minha conduta, e penso que gradualmente se vai repor essa verdade e então equacionarei o voltar a trabalhar na banca”, declarou.

Anabela Campos manteve a condenação pela prática, a título doloso eventual, de duas contraordenações por não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados (200.000 euros) e não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros (300.000 euros), que culminou na coima única de 350.000 euros.

Raul Soares da Veiga, mandatário de Morais Pires, apontou igualmente o “progresso” registado e o facto de a decisão ir “contra a posição defendida pelo próprio Ministério Público”, mas sublinhou o facto de não conhecer ainda os fundamentos da sentença (com 1.150 páginas e que a juíza pediu dispensa de ler).

Soares da Veiga explicitou que, após a decisão de hoje, Morais Pires “pode já trabalhar” em funções que não exijam a declaração de idoneidade por parte do supervisor, ou seja, que não impliquem o exercício de cargos nos órgãos sociais.

“É um homem da banca, é a vida dele, não ganha honestamente a vida doutra maneira”, afirmou, apontando o facto de Morais Pires ter dedicado "toda a sua vida à defesa dos interesses do Banco Espírito Santo" e não ter agido "intencionalmente contra ninguém, nem contra BES nem contra quem quer que seja".

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