Ana Macedo coordenou o programa Peso e Saúde que percorreu mais de 20 praias do país, incluindo os Açores, apelando à participação de voluntários que tinham a sua composição corporal avaliada, ao mesmo tempo que recebiam uma explicação sobre a caracterização do seu peso e respondiam a algumas questões.
Com base nestes dados, a coordenadora avançou à agência Lusa algumas conclusões do trabalho, que irá ter algum seguimento num estudo nacional a ter lugar a partir de setembro, com questionários à população.
Do total das cerca de mil pessoas que participaram no programa, "10,5% têm uma classificação como obesas, isto é, têm um índice de massa corporal superior a 30, que é o que estávamos à espera para o país", disse a médica responsável da 'Keypoint', entidade que desenvolveu o programa Peso da Saúde.
Os dados recolhidos "batem certo" com o conhecimento de Portugal nesta matéria e metade dos adultos têm excesso de peso ou obesidade, ou seja, têm mais que 25 de massa corporal, e entre 10 a 12% têm mais que 30.
"O que me espanta não é estes 10%, é que quando perguntamos à pessoa como classifica o seu peso, só 1% é que se classifica como tendo obesidade. As pessoas não têm consciência [desta situação], ou não sabem ou não assumem, para nós fica a dúvida, mas há um trabalho importante a fazer."
Uma das conclusões do projeto Peso da Saúde é que "apenas um em cada 10 participantes obesos sabe que é obeso".
Ao contrário, "as pessoas dizem que têm excesso de peso, isso as pessoas sabem, há 41% dos participantes que afirmam que tem excesso de peso e temos 39% com excesso de peso", acrescentou.
Esta situação, apontou a coordenadora do projeto, pode estar relacionada com o desconhecimento entre o que é ter excesso de peso e o que é ser obeso, além "da parte social e do estigma de ser uma pessoa obesa".
As pessoas sabem que o excesso de peso e obesidade aumentam o risco de outras doenças pois 70% dizem que contribui, ou seja, salientou a médica, "dois em cada três sabem que ter excesso de peso faz mal", mas "não têm consciência crítica em relação a si próprios".
Quando a questão é o efeito na imagem de cada um, as pessoas com excesso de peso desvalorizam o efeito no seu dia-a-dia, não havendo grande diferença entre as respostas de homens e mulheres, 24% dos participantes diz que é importante, ou seja, "uma em cada quatro pessoas com excesso de peso diz que isso interfere com a sua vida profissional", referiu Ana Macedo.
Se a pergunta é sobre a relação conjugal ou as relações íntimas, aquela percentagem sobe para 35%.
A especialista destacou a adesão das pessoas, apesar de estarem de férias e de não ser agradável o problema do excesso de peso, principalmente para os "afetados", o que considerou relevante dada a importância da sensibilização para o assunto e da motivação.
"Pensaram sobre o assunto certamente e até se motivaram o suficiente para dizer: eu vou fazer diferente, sabemos que muitas destas decisões são muito efémeras, mas algumas vão ficar e numa situação como a obesidade em que é tão difícil as pessoas mudarem alguma coisa porque é difícil mudar estilos de vida, esse é um dado extremamente importante."
Quem tem excesso de peso deve encarar doença e ter ajuda profissional
Ana Macedo sublinhou ainda que, em relação à motivação para alterar de estilo de vida, esta é baixa entre aqueles que têm excesso de peso.
"As pessoas têm de perceber que a obesidade e excesso de peso é uma doença", afirmou e exemplifica: "quando uma pessoa tem diabetes não tem dúvida de que tem de ir ao médico, vigiar a doença e tomar os medicamentos".
No entanto, quando a pessoa tem excesso de peso ou obesidade "acha que grande parte da culpa é sua", depois os médicos "valorizam isto pouco e, muitas vezes não sabem como abordar o assunto e as pessoas acham que isto se resolve sozinho", referiu.
Este assunto "não se resolve de outra maneira", por isso, a especialista transmitiu a sua preocupação e defendeu ser necessário começar por motivar os portugueses.
"Apesar de tudo, hoje temos fármacos eficazes para tratar doenças [como diabetes ou hipertensão] e não temos uma oferta muito específica e eficaz no que à obesidade diz respeito, temos muitas, mas todas elas carecem, antes de mais, de um compromisso da pessoa numa coisa que é muito difícil que é mudar hábitos."
Como reconheceu, "é difícil, mas "existe uma solução e tem de passar por uma maior grau de informação, primeiro do risco, e as pessoas têm de ter consciência de que o excesso de peso é um risco, fez-se isso com o tabaco, tem de fazer-se em relação ao excesso de peso".
Por outro lado, é necessário começar a consciencializar as pessoas de que "precisam de ser ajudadas por um profissional de saúde" para escolher a estratégia para emagrecer, afastando a ideia da "dieta milagrosa", que, segundo Ana Macedo, "continua a existir", nomeadamente na publicidade, que em três meses se resolve o assunto.
Ora, alertou a médica, a solução não é tão rápida e "há um trabalho individual, feito no consultório, seja pelo médico ou pelo nutricionista, há um trabalho social", ou seja, como é que enquanto sociedade é incorporado este problema.
E "um número reduzido de pessoas falou com o médico sobre este assunto", só cerca de 23% daqueles com excesso de peso ou obesidade diz já ter ido ao médico, o que "é muito pouco", e continuam a fazer a gestão da doença sozinhas, transmitiu Ana Macedo.
O programa Peso da Saúde, cujo balanço é apresentado na quinta-feira, é uma ação de educação e sensibilização para alertar os adultos para os danos do excesso de peso e para as doenças graves que pode causar. Vai ser apresentado numa sessão em Lisboa que conta com a presença do diretor geral da Saúde, Francisco George.